quarta-feira, 5 de março de 2008

Revista da Folha e a vanguarda da retaguarda

por Gerson Faria em 05 de março de 2008

Resumo: A cultura política do politicamente correto tem como intuito fazer com que o indivíduo se imagine num inferno kafkiano e termine por aceitar a condição existencial e sociológica de não-representado, um sem-ONG, ser miserável vivendo na ignorância e no erro.

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Na cultura política do politicamente correto, só vale o respeito vocabular estrito fora do grupo. Isto quer dizer que negro pode chamar branco de racista, usando o xingamento como se fosse a espada da justiça. Ao mesmo tempo, negros podem criar e manter uma revista de nome Raça. Se um cidadão chamar outro de “bicha” ou “veado”, corre o risco de tomar um processo e desembolsar uns R$15.000, pois a lei diz que isso configura discriminação de opção sexual e, de acordo com o secretário da Justiça de São Paulo, Luiz Antonio Guimarães Marrey em outro artigo de temática gay: “É importante ponderar que o rigor dos antigos padrões morais deve ceder espaço às novas realidades sociais, aos novos costumes”. Há, em São Paulo, uma revista culturalmente ordinária: a Revista da Folha. É um encarte que circula aos domingos no jornal Folha de S.Paulo. Se ordinária culturalmente, o mesmo não se diria de sua visibilidade. No último domingo, 2 de março de 2008, escreve um tal Vitor Angelo, colunista gls. Chama seus congêneres de “bichas” e “viados” (sic) e lamenta amarguradamente um passado de vanguarda nos banheiros públicos, parques, saunas, bares sadomasoquistas, clubes de orgia e cinemas. Esses espaços, reafirma, são os verdadeiros bastiões da resistência à caretice dos heteros e do movimento gay, devendo ser agarrados com muito orgulho. Afirma que o movimento gay está muito carola e que eles, os gays, estão virando homens sem pênis, deixando aí o trabalho de entendimento ao leitor: trata-se de alta psicologia de banheiro público ou de mera questão mercadológica? O jornalista parece descrever uma decepção com o movimento gay que, na ânsia política, deixou para trás o espírito marginal originário da cultura homossexual. Trazendo ao jargão partidário, trataria-se de um trotskista ante o sucesso do PT. E, para sanar esse cinismo da vida dupla, nada como retomar orgulhosamente os espaços citados acima. Mas isso é problema dele, pouco me importa se leve vida dupla, tripla ou de maior número. Mas concordo plenamente com Vitor Angelo num ponto. A cultura gay é promíscua na essência. Conheci vários gays, perdi alguns colegas gays, uns por AIDS. Nenhum deles era assim ‘família’. Mas na hora do hospital, a família carola estava sempre lá. Os amigos gays, ora, que gay gosta de ver outro gay morrendo? Não me importo com as escolhas pessoais alheias. Me importo com a imposição pública de condutas que considero execráveis, mediante pressão política. Me importa é ser obrigado à força de lei a aceitar que escolham até o vocabulário que se deva utilizar, e mais ainda, sem que eles tenham que respeitá-lo também. Me importa que meu filho sente na carteira escolar e seja submetido por um professor sociopata a um conteúdo elaborado por sociopatas que ser gay é preferível a ser heterossexual, que o sexo anal impede que mais guerras sejam feitas, pois os gays são artistas, maravilhosos e super-sensíveis. Mas, como assevera o secretário Marrey, qual acácio progressista, devemos ceder espaço às novas realidades sociais e aos novos costumes, como se o secretário de justiça respondesse por assuntos morais e culturais. Ora, em última instância isso implica em um condicionamento da justiça à cultura do momento, algo como se observou nos regimes tirânicos de sempre. Na época de Pol Pot, os novos costumes eram trabalho forçado em colheita de arroz e morte aos citadinos. Mudaram os padrões morais e cederam espaço às novas realidades sociais, diria Marrey? Nesse caso, 25% da população do Camboja foi para o beleléu. O secretário precisa ter mais cautela com as generalizações pseudofilosóficas. Afinal, não é um idiota qualquer. A cultura política do politicamente correto tem como intuito fazer com que o indivíduo se imagine num inferno kafkiano, algo como “Deus, a Folha de S.Paulo irá me procurar, e agora, o doutor Calligaris vai me dissecar, terei pesadelos onde o Kinsey corre cientificamente atrás de meu filho de 3 anos, vou para a cadeia, o que fazer?” – e termine por aceitar a condição existencial e sociológica de não-representado, um sem-ONG, ser miserável vivendo na ignorância e no erro. Mas, OK: desembolse 40 salários mínimos que tudo bem, está parcialmente salvo. O Estado deixa passar. Os gays agradecem. A Folha vai se lembrar de você sempre que for preciso.

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