sexta-feira, 1 de agosto de 2008

Pode um americano comentar sobre Israel? Ou não é permitido criticar aliados?

por Daniel Pipes em 01 de agosto de 2008

Resumo: É um erro rejeitar informações, idéias ou análises com base em credenciais. Conceitos corretos e importantes podem ser de qualquer procedência – mesmo aqueles vindos de milhares de milhas de distância. Deste modo, as recentes ações do governo de Olmert, foram longe, longe demais.

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Posso eu, um cidadão americano, vivendo nos Estados Unidos, comentar publicamente sobre as tomadas de decisão israelenses?

Recentemente, eu critiquei o governo israelense por sua “troca de corpos israelenses por prisioneiros palestinos com o Hezbollah em meu artigo Samir Kuntar and the Last Laugh [Kuntar e quem ri por último] (The Jerusalem Post, 21/7); a isto, o eminente especialista em contraterrorismo em Tel Aviv, Yoram Schweitzer, questionou a conveniência de minha oferta de opiniões sobre este assunto. Em seu artigo Not That Bad a Deal [Um acordo não de todo mau], (24/7) ele explicou aos leitores do Jerusalem Post como o “conteúdo e o tom” de minha análise “condescendente, insultuosa, displicente quanto ao fato de governo e público terem o direito de decidir por si mesmos... e de arcar com o preço dessas decisões”.

Ele também me critica por apresentar uma opinião sobre questões israelenses a partir de meu “abrigo seguro, a milhares de milhas de distância”.

Schweitzer não explicita a lógica por detrás de seu ressentimento, mas ela soa familiar. O argumento é mais ou menos este: a não ser que uma pessoa viva em Israel, pague lá os seus impostos, coloque-se em risco nas ruas e tenha filhos nas forças armadas, não deveria duvidar das decisões israelenses. Esta abordagem, em sentido amplo, está por trás das posições tomadas pelo Comitê Americano de Assuntos Públicos de Israel e de outras proeminentes instituições judaicas.

Eu respeito essa posição, sem, contudo, aceitar a sua disciplina. Reagir a aquilo que governos estrangeiros fazem é o feijão com arroz para um analista da política externa dos Estados Unidos, que passou algum tempo nos Departamentos de Estado e da Defesa e como membro do o conselho do Instituto da Paz dos Estados Unidos; e que, na qualidade de colunista, despejou opiniões por quase uma década. Uma rápida inspeção bibliográfica encontra-me julgando muitos governos, incluindo o britânico, o canadense, o dinamarquês, o francês, o alemão, o iraniano, o nepalês, o saudita, o sul-coreano, o sírio e o turco.

Obviamente eu não tenho filhos servindo nas forças armadas de todos esses países, mas eu avalio os desdobramentos de suas ações a fim de ajudar no raciocínio de meus leitores. Ninguém jamais me solicitou que me abstivesse de qualquer comentário acerca de seus assuntos internos. E o próprio Schweitzer profere conselhos aos outros; em julho de 2005, por exemplo, ele instruiu os líderes muçulmanos na Europa a serem “mais firmes em sua rejeição do elemento islâmico radical”. Todos os analistas independentes fazem isso.

Portanto, Schweitzer e eu podemos comentar sobre acontecimentos de todo o mundo. Mas, quando se trata de Israel, minha mente deveria esvaziar-se de pensamentos, minha língua deveria permanecer silente e meu teclado imóvel? Dificilmente.

Num nível mais profundo, eu protesto contra o conceito todo de informação privilegiada que diz que a localização, idade, origem étnica, graus acadêmicos, experiência ou alguma outra qualidade de alguém validam suas opiniões. Um livro recente de Christopher Cerf e Victor S. Navasky, intitulado I Wish I Hadn't Said That: The Experts Speak - and Get it Wrong! [Eu gostaria de não ter dito aquilo: os especialistas falam – e entendem tudo errado!] expõe humoristicamente essa presunção. Viver num determinado país não faz de ninguém mais sábio sobre o mesmo.

Durante a II Cúpula de Camp David em 2000, quando Ehud Barak chefiava o governo de Israel e eu discordei de suas diretrizes, mais de uma vez fui refutado com um indignado como-é-que-você-ousa: “Barak é o soldado mais condecorado da história de Israel – e quem é você?” E, contudo, hoje os analistas concordam que Camp David II trouxe resultados desastrosos para Israel, precipitando a violência palestina, que começou dois meses depois.

É um erro rejeitar informações, idéias ou análises com base em credenciais. Conceitos corretos e importantes podem ser de qualquer procedência – mesmo aqueles vindos de milhares de milhas de distância.

Nesse espírito, aqui vão duas respostas referentes à posição de Schweitzer quanto ao incidente de Samir-al-Kuntar. Schweitzer argumenta que “falhar em fazer o máximo para resgatar qualquer cidadão ou soldado que caia em mãos inimigas abalaria um dos preceitos básicos da sociedade israelense”. Eu concordo que resgatar soldados ou seus restos mortais é uma prioridade operacionalmente útil e moralmente nobre, mas omáximo” tem seus limites. Por exemplo, um governo não deveria entregar cidadãos vivos aos terroristas em troca de corpos de soldados. Deste modo, as ações do governo de Olmert, na semana passada, foram longe, longe demais.

Outro ponto específico: Schweitzer afirma que: “Falando em termos relativos, a recente troca com o Hezbollah teve um preço baixo. É discutível se a libertação de Kuntar deu alguma vitória moral ao Hezbollah”. Se a o acordo foi barato, eu tenho horror em pensar como pareceria um acordo caro. E, com a chegada de Kuntar no Líbano, paralisando o governo em vertiginosa celebração nacional, negar uma vitória ao Hezbollah equivale à cegueira voluntária.



Publicado originalmente no Jerusalem Post em 28/07/08.

Também disponível em danielpipes.org

Tradução: MSM

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