sábado, 27 de setembro de 2008

O FIM DO LIBERALISMO ECONÔMICO


HEITOR DE PAOLA

22/09/2008

Este artigo deveria ter como título Soros, Armínio, Gabeira & Cia Ilimitada, seguindo-se ao anterior para denunciar mais uma trama espúria que reúne um notório picareta internacional, seu empregado e ex-presidente do Banco do Central do Brazil e um ex-terrorista, seqüestrador e maconheiro, hoje candidato a Prefeito do Rio. O que unirá estes três personagens, aparentemente tão díspares? Ideologicamente a defesa da liberação das drogas e do aborto (dos três só não conheço a posição pessoal de Armínio Fraga, mas se o chefão manda, faz qualquer coisa) e quanto ao Gabeira....bem, diga o que disser eu não acredito, é móbile qual piúma al vento! Se existem interesses de favorecimento econômico não sei, mas alguns dados podem ajudar os eleitores a pensar: Soros é sócio de um dos maiores negócios imobiliários no Rio, a construtora CYRELLA Brazil Realty e na mais nova companhia aérea brasileira que estará sediada no Rio, a Azul através do Fundo Gávea, de Armínio. Soros é sócio do fundador da empresa, David Neeleman, CEO da americana Jet Blue.

Mas eis que a explicação óbvia veio dos States: a crise econômica das hipotecas de alto risco (sub-prime lendings). O próprio nome das hipotecas é um primor de hipocrisia: sub-prime poderia ser traduzido por ‘sub-garantidas’ ou ‘sub-boas’. Também chamadas papéis-B, ‘próximo de garantido’ (near-prime) ou empréstimos de segunda classe, são empréstimos dados a tomadores que não são qualificados por seu histórico de maus pagadores. Seu nome em linguagem comum, não em economês, é créditos podres!

São arriscados tanto para os credores como para os devedores, pois estão expostas a riscos dos dois lados: se há uma crise econômica ou desemprego o devedor fica sem condições de pagar e, como já tem uma história de calotes, o credor teoricamente ficaria a ver navios. Por que fazer operações tão arriscadas então? Para o credor pelas altíssimas taxas de juros que cobra do devedor, e este porque sem este crédito jamais adquiriria um bem daquele valor e, por esta razão, aceita pagar mais do que pagaria um bom devedor. Este é o liberalismo econômico em pleno funcionamento, o que Marx chamou de forma pejorativa ‘capitalismo’. Esta forma natural de agir dos seres humanos, cada um baseado nos seus interesses, inclui necessariamente riscos – e riscos incluem prejuízos calculados e a possibilidade de falência. O cálculo dos prováveis prejuízos é que determina a taxa de juros – aqui o Inglês é mais adequado: interests. Quanto mais alto o risco, maior a possibilidade de falência.

O financista é um comerciante como qualquer outro, só que sua mercadoria é o próprio dinheiro. Enquanto o lucro do comerciante é a diferença entre o preço de compra e o preço de venda, descontadas taxas, impostos, salários, etc., e o do industrial é a diferença do custo do investimento para produzir e o valor pelo qual o produto é vendido, descontos idem, - o que Marx safadamente chamou de ‘mais-valia’ – o lucro de quem tem o dinheiro como mercadoria é o juro.

E assim, a partir do século XVIII o mundo progrediu enormemente e o capital foi se acumulando para novos investimentos, mais empregos, maiores salários, etc. Simples assim, não?

Sim, até que outros fatores entraram em cena em função do próprio desenvolvimento econômico e da inevitável desigualdade da acumulação de capital nas mãos dos mais capazes ou mais inteligentes ou mais diligentes ou mais criativos, etc. Estes, desde que o mundo é mundo, são minoria e assim será para todo o sempre.

O primeiro daqueles fatores, o Estado – melhor seria dizer os Governos – sempre existiu para promover a defesa territorial ou conquistar novos territórios, assegurar a segurança interna, administrar a justiça e poucas coisas mais. Com o liberalismo econômico estas mesmas atribuições deveriam permanecer: o Estado mínimo. As descrições de Adam Smith sobre como se formam as ‘riquezas das nações’ tomou como premissa este Estado mínimo. Justamente apelidado de Pai do Liberalismo, sequer considerou o Estado interferindo diretamente na economia, a não ser na cobrança de impostos, taxas, e no estímulo ao desenvolvimento econômico individual. ‘Ao realizar sua própria grandeza particular, cada indivíduo contribuiu para construir a do seu País’ (A Riqueza das Nações).

É preciso deixar claro que o liberalismo econômico não é, como seus inimigos dizem, uma ideologia. O liberalismo econômico é uma descrição do estado natural, é como dizia Alberdi ‘a ordem da natureza e por isto é melhor e mais fecundo’. É da “natureza das coisas (que) cada homem tenha o encargo providencial de seu próprio bem estar e progresso, porque ninguém pode amar o engrandecimento do outro como ao seu próprio não existe meio mais poderoso e eficaz de contribuir para a grandeza do corpo social do que deixar a cada um dos seus membros individuais o cuidado e o poder pleno de produzir seu próprio engrandecimento”.

Um século antes dos gigantes austríacos, von Mises e Hayek, Juan Bautista Alberdi, ‘El Evangelista de la Libertad’ e pai da Constituição argentina de 1853 que encerrou a era dos velhos caudilhos provinciais e levou este país a ser uma das seis maiores economias do mundo até as interferências populistas dos novos caudilhos nacionais na década de 40 do século passado, defendia que ‘a riqueza é mais o produto do egoísmo que do patriotismo’ [[i]].

Nem Smith, nem Alberdi poderiam prever que a acumulação de capital levaria à formação dos dois outros fatores: os grandes banqueiros internacionais e os metacapitalistas (apud Olavo de Carvalho). James Madison Jr, no entanto, já previra que sendo “a mais comum e durável causa de divisões da sociedade (...) a distribuição variável e desigual da propriedade (...), os que possuem bens e os que não os possuem sempre tiveram interesses divergentes na sociedade”. Já que “... as causas das divisões não (podendo) ser removidas, para o alívio (das tensões) devem ser procurados os meios de controlar seus efeitos”. Portanto “É muito importante, numa república, não apenas defender a sociedade contra a opressão de seus legisladores, mas também proteger uma parte da sociedade contra a injustiça da outra parte”. (The Federalist Papers #10)

Madison falava da Constituição que ajudara a redigir e durante a discussão sobre as falhas que deveriam ser corrigidas através de Emendas. Foram de sua lavra as dez primeiras, reunidas no que veio a ser conhecido como ‘The Bill of Rights’. Nesta limita-se mais ainda o poder do Estado sobre a Federação e sobre os indivíduos. Mas eis que os metacapitalistas e os grandes banqueiros perceberam que precisavam exatamente do Estado para se proteger da concorrência, formaram grandes cartéis – que se chamaram trusts e começaram a pressionar o Estado para atingir aquilo que Fredederick C. Howe tão bem exprimiu em seu Confessions of a Monopolist:

Existem novas regras para o “big business” que substituíram os ensinamentos de nossos pais e podem ser resumidas numa única máxima: arranje um monopólio deixe a sociedade trabalhar para você e lembre que o melhor negócio de todos é a política, porque uma concessão legislativa, uma franquia, um subsídio ou uma isenção de impostos vale mais do que uma mina Kimberley ou Comstock, porque não exige nenhum trabalho, seja físico ou mental, para ser explorada.

Óbvio que para isto era necessário atribuir novas funções ao Estado e destas, duas foram retiradas do suposto inimigo do capitalismo, Karl Marx: no Manifesto do Partido Comunista, para a instalação de um futuro estado comunista, é dito que seria necessário criar um imposto de renda pesado e gradualmente progressivo e centralizar o crédito nos bancos estatais, através de um banco nacional com capital estatal e monopólio exclusivo.

Em 1909 o Congresso dos Estados Unidos aprovou a XVI Emenda que diz

O Congresso terá poderes para criar e recolher impostos sobre a renda, de qualquer fonte, sem distribuição proporcional entre os diversos Estados, e independentemente de qualquer recenseamento ou lista.

Também seguindo a máxima de Meyer Amschel Rothschild: “Dê-me o controle do dinheiro de uma Nação e pouco me importa quem faça suas leis”, no século XIX os banqueiros internacionais haviam conseguido criar Bancos Centrais na Inglaterra, França e Alemanha que nada tinham de estatais como o nome sugere eram monopólios privados conseguidos dos Chefes de Estado em troca de empréstimos aos governos – e possivelmente algum grau de corrupção. A primeira tentativa nos Estados Unidos falhara em transformar o Second Bank of the United States (1816-1836) num monopólio patrocinado pelo governo, um banco central sob controle privado. A pressão foi tanta que Jackson disse a Martin van Buren, que viria a ser o seu sucessor: “O banco está tentando me matar, mas eu vou matá-lo antes!”.

Com a crise de 1907 a pressão sobre o Congresso para a criação de um Banco Central foi de tal monta que finalmente foi criado o Federal Reserve Bank (FED), sendo que dois terços de seus diretores são indicados pelos bancos privados e seus Chairmen são escolhidos sempre entre membros da comunidade bancária de New York (Wall Street) [[ii]].

Estavam assim unidos o grande capital e o Estado para benefício mútuo e prejuízo da população. Ora, o fortalecimento do Estado leva necessariamente à criação de novas funções e de uma poderosa burocracia que será usada para o oposto do que sugeria Madison: proteger uma parte da sociedade contra a injustiça da outra parte, pois esta Aliança espúria destrói toda a base sobre a qual foi criado, de maneira natural, este sistema de trocas que chamamos liberalismo econômico.

Ainda é Alberdi quem diz: As sociedades que esperam sua felicidade pelas mãos de seus Governos esperam algo absolutamente contrário à natureza. Pois pela natureza das coisas cada homem tem o encargo providencial de seu próprio bem estar e progresso, porque ninguém pode amar o engrandecimento do outro como ao seu próprio esta é a ordem da natureza e por isto é melhor e mais fecundo. Disto é testemunho a história das sociedades saxônias do norte, nos dois mundos. Os Estados são ricos pelo trabalho de seus indivíduos e este trabalho é fecundo porque o homem é livre, dono e senhor de sua pessoa, de seus bens, de sua vida, de seu lar. Quando o povo destas sociedades necessita alguma obra ou melhoramento público os homens se reúnem, discutem, encontram acordos em vontades comuns a todos e põem mão à obra eles mesmos, executando todo o trabalho necessário’.

Pois é da lá mesmo que nos chegam as más notícias. A chantagem dos poderosos capitalistas levou a eliminar o risco – inerente ao sistema – sabendo que podem criar ‘bolhas de prosperidade falsas, sabendo de antemão que a falência será inevitável, pois o governo vai absorver os prejuízos em nome da ‘justiça social’ ou outras bobagens iguais como ‘evitar a crise sistêmica’. A cada ajuda, cria-se a possibilidade de uma nova ajuda, como bem o diz Hans Bader em seu ‘Um Trilhão de Dólares de ajuda conduzem a Bolhas Futuras’.

Mas quem realmente paga o pato? O Governo não produz nada! Então os bons pagadores pagam, através de seus impostos, os empréstimos cedidos a salafrários e caloteiros! Aí incluídos os banqueiros e metacapitalistas. Isto é: há um conluio entre salafrários exploradores&nbspe caloteiros!

É isto a 'justiça social'!

***

Estão explicados os conluios Gedau/PSol e Armínio/Gabeira?



[i] A ONIPOTÊNCIA DO ESTADO É A NEGAÇÃO DA LIBERDADE INDIVIDUAL, tradução minha que estará em breve disponível.

[ii] Esta história completa pode ser encontrada no meu livro O Eixo do Mal Latino-Americano e a Nova Ordem Mundial, Capítulo XVI. É Realizações, SP


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