Mídia Sem Máscara
| 18 Setembro 2011
Artigos - Movimento Revolucionário
Em Cabo Verde, Casimiro de Pina refuta um articulista da esquerda local em questões como a natureza totalitária do atual governo da ilha, e o pragmatismo enquanto ideologia política.
Antes de mais, prezado Alte Pinho, agradeço-lhe as amáveis palavras e os elogios quanto à minha escrita.
Mas vamos ao essencial. Daqui a pouco a Electra vai cortar-me a luz (é uma certeza absoluta!) e, por isso, vale a pena meter tudo no papel, e rapidinho, antes que a doce e irresponsável empresa faça das suas!
Também acho, para começar, que o “maniqueísmo” traz muitos males ao mundo e que devemos, sempre, analisar os assuntos com frieza e racionalidade.
Devemos, acrescento, analisar factos e argumentos e não berrar “slogans”, que aliás só mascaram a realidade.
Eu não disse que você procurou “omitir” a natureza totalitária de José Maria Neves (N. do E.: atual primeiro-pinistro de Cabo Verde) ou do PAICV. Simplesmente, e isto está claríssimo no meu artigo, que faltou encaixar essa (aparente) “loucura” do Chefe na estratégia mais global dos partidos dessa específica matriz ideológica.
Isto, como vê, é coisa bem diferente. Ao longo de uma década, em vários artigos e análises, tenho mostrado este ponto, com exemplos concretos que não vou aqui repetir, naturalmente.
Aliás, há um traço típico e constante nos meus escritos. Parto sempre dos dados do cotidiano político para depois, com recurso a certas ferramentas teóricas, enquadrar (rectius: explicar) a coisa.
Continuo a achar que você, prezado AP, está a cometer um erro de palmatória, ao insistir na ideia errada, sem fundamento, de que o “pragmatismo” não é… ideologia. Não faz qualquer sentido. É, no fundo, a retórica do “Bloco de Esquerda” (BE) em Portugal, para quem o PS de José Sócrates não é verdadeiramente um partido de “esquerda”, só porque abriu um bocadinho nas questões económicas, etc..
Quer dizer, esquerda, na sua pureza imaginária, só mesmo o BE, Chomsky e companhia limitada!
A ideologia pode ser definida, de forma simples, como o conjunto de ideias e valores que orientam a acção política. Neste sentido, não pode existir política sem ideologia. A ideologia é o “elixir” da política.
Até os “pragmáticos”, no sentido mais comum do termo, têm, como é óbvio, uma ideologia – o pragmatismo.
Orientam-se pelo consenso, pela transacção, pelos arranjos de circunstância, por uma certa “navegação à vista”, pelo sentido prático-casuístico, pelo cálculo interesseiro, se for preciso. É esta a sua norma de acção, a sua ideologia. Dizer, como você chega a afirmar, que há uma política “despida de ideologia” é portanto, diriam os ingleses, um perfeito “nonsense”.
Aliás, é um erro grave, e quase imperdoável num colunista (que se quer culto e sabedor das coisas da “pólis” e da ciência), ignorar o estatuto epistemológico do pragmatismo, que tanta influência exerceu no mundo anglo-saxónico, onde, sob a alçada de Charles Peirce (que influenciou Habermas), William James ou John Dewey (um pedagogo de nomeada, além do mais), adquiriu o prestígio de uma filosofia política consistente e bem articulada.
Dizer, como diz teimosamente AP, que “o ‘pragmatismo’ não é uma ideologia coisa nenhuma, é apenas um pretexto, um truque…” é, pois, de (e aqui não encontro, sinceramente, uma palavra mais suave!) uma ignorância histórica e filosófica estarrecedora.
O PAICV é sim, um partido SOCIALISTA. Faz parte da “Internacional Socialista” e tem todos os tiques do socialismo e do “centralismo democrático”. Já demonstrei isso várias vezes.
Nas últimas presidenciais, isso foi mais uma vez evidente, para qualquer observador atento.
Aristides Lima foi combatido pelos seus camaradas de partido com base, precisamente, na lógica férrea do “centralismo” da velha cepa.
A maneira como o sr. Neves explora as emoções e a irracionalidade, intoxicando as massas, é uma prova inequívoca e constante que nos remete, inquestionavelmente, ao centro da política totalitária. É um facto.
Falei no “socialismo light” para caracterizar o PAICV de José Neves e o amigo não gostou, percebe-se, da caracterização. OK, mas parece que está a tomar a nuvem por Juno...
Repare. No essencial, você diz o seguinte, e passo a citar:
“… por comparação, enquanto os antecessores de Neves tinham como centro da sua acção uma visão do mundo – discutível, é certo – e um objectivo ideológico preciso – questionável, também -, o grupo de José Maria Neves faz lembrar-me uma quadrilha de assaltantes que viram no partido e no Estado a possibilidade de enriquecerem rapidamente e em força. E, por isso, é que considerei importante ressalvar a natureza ‘desideológica’ da facção e do seu chefe”.
Ora, meu caro Alte Pinho, em toda a parte do mundo, da União Soviética à Coreia do Norte, passando por Cuba, Venezuela e tuttti quanti, a história do socialismo sempre foi a história do engodo e da corrupção, em que uma “quadrilha de assaltantes”, utilizando a sua expressão, se apodera do partido e do Estado em benefício próprio. É o império (“dolce vita”) da Nomenklatura e dos seus privilégios sem fim.
Trata-se, efectivamente, de uma ideologia de saque.
É isso que define o socialismo, e nada mais.
O socialismo, na névoa burlesca de um humanitarismo amigo dos povos, é o roubo institucionalizado, deixando sempre, onde quer que se instale, um rasto de miséria, exploração das paixões, dívida pública, violação em massa dos direitos fundamentais, insegurança, atraso tecnológico e, claro, desemprego galopante.
É o sistema, com mil e um rostos e disfarces, do partido-Estado, a ideologia do subdesenvolvimento sustentável.
Publicado no jornal O Liberal Online.
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