Mídia Sem Máscara
Escrito por Klauber Cristofen Pires | 16 Setembro 2011
Artigos - Direito
Por que não temos, ao invés de uma entidade autárquica como a OAB, uma plêiade de OAB's privadas, cada qual acolhendo os seus bacharéis em direito conforme suas visões e qualidades? O tempo formará a reputação de cada uma, e a população estará convidada a julgá-las por meio do mercado.
Neste ano, apenas 4% dos bacharéis de Direito foram aprovados pela OAB, segundo matéria divulgada pela Agência Brasil. Convenhamos, temos aqui um percentual extremamente polarizado. Isto nos permite indagar seriamente se 96% dos bacharéis formados são realmente analfabetos ou se a OAB está sendo flagrada em ato de protecionismo de mercado em benefício dos atuais advogados.
Eis aí um assunto espinhoso, que chama ao debate não somente os bacharéis em Direito e advogados, mas também uma significativa parcela da população: O exame de ordem realizado pela OAB é necessário e legítimo?
Olhando pelo lado dos inscritos na Ordem, ou da legitimidade, não fica difícil adivinhar: não há nenhum motivo que os façam desejar o ingresso de mais concorrentes no mercado. Tentemos estabelecer um paralelo: imaginemos que o setor supermercadista ficasse a juízo dos atuais donos deste tipo de estabelecimento. A quem aproveitariam suas decisões? Ao público ou a si próprios? Logicamente, um veto frontal à entrada de novos participantes não é a imagem mais simpática que se pode oferecer à sociedade, mas que tal a ideia de propor uma série de exigências técnicas previamente escolhidas pelos próprios atuais empresários do ramo - digo - justamente aquelas em que sabem que somente eles próprios são capazes de cumprir? Não passaria a ideia de responsabilidade, de seriedade e de ordem?
Por outro lado, vejamos o caso da necessidade: se temos faculdades incapazes de produzir um número razoável de bacharéis aptos ao exercício da profissão, eis que 96% por cento dos seus egressos são considerados ineptos, então temos diante de nós um escândalo colossal, da magnitude de bilhões de reais, dignas de provocar o impeachment da presidente e do seu ministro da educação. Estranha-me, todavia, que no exercício da minha profissão como servidor público federal, eu seja afrontado amiúde com peças produzidas por advogados com sofrível qualidade, tanto no aspecto redacional quanto em relação à apresentação correta dos dispositivos legais e à elaboração de argumentações lógicas e coerentes.
Tertium non Datur? Talvez não: pode ser que estejamos diante dos dois fenômenos ocorrendo simultaneamente. Em minha modesta opinião, é o que de fato acontece. Digo mais até: há outros problemas muito mais graves do que este, sobre os quais tecerei algumas considerações...
Bis in Idem
Bis in Idem é um termo em latim que significa "de novo no mesmo" ou "duplamente, pelo mesmo motivo". A tradicional jurisprudência usualmente se utiliza desta expressão para repudiar vícios tais como o de aplicar ao réu uma segunda penalidade pelo mesmo delito, ou de cobrar um segundo imposto do cidadão pelo mesmo fato gerador. Vejam aqui se não se trata do caso:
Voltemos à questão da legitimidade. Suponha que você importe determinado produto do exterior. Você já passou pelos trâmites aduaneiros, pagou os seus impostos, foi liberado pelos fiscais da Alfândega, mas na hora de retirar o produto do porto, chegam os representantes da entidade sindical dos fiscais e retêm a sua mercadoria, exigindo-lhe o cumprimento dos mesmos trâmites ou de outros adicionais. Será isto natural e logicamente correto?
Ora, se o estado, personificado pelo Ministério da Educação - como parte da Administração Direta - já praticou o ato perfeito de considerar o bacharel como aprovado no curso, por delegação assistida às instituições de ensino particulares ou privadas, qual a razão lógica de ele próprio submeter-se à revisão por uma verruguenta entidade paraestatal da Administração Indireta?
Monopólio do Pensamento
Notem que o Direito não consiste em um conjunto de conhecimentos objetivos, tal como é o caso da Matemática. Neste ramo, uma hipotética prova como requisito ao ingresso no conselho de classe da categoria seria algo aferível por absolutamente qualquer cidadão capaz de avaliá-la. Com o Direito é diferente, pois este engloba uma série de conceitos ligados a diferentes teorias sociológicas, filosóficas, políticas, econômicas, técnicas e até mesmo alguma arte (alguns diriam que esta última dose é a mais importante...).
Portanto, uma única entidade - no caso, a OAB - que exerça do alto do Monte Olimpo a prerrogativa de elaborar uma prova de admissão está fadada inexoravelmente a aplicar as questões de acordo com a visão de mundo predominante entre os seus membros, quer isto ocorra de forma ostensiva, velada ou quem sabe, inclusive, não-intencional. O exame de ordem, portanto, se torna assim uma espécie de filtro ideológico, potencial ou de fato, e notem como coisas assim têm se mostrado perigosamente recorrentes nestes últimos tempos.
Mesmo no ramo da técnica existem variáveis. Por exemplo, quando falamos de solda elétrica, consagram-se os métodos norte-americano e alemão. Cada um possui vantagens e desvantagens, e no caso de entidades certificadoras privadas como são as Sociedades Classificadoras, um ou outro pode ser adotado como regra geral.
Sociedade Classificadoras são instituições privadas de regulamentação e certificação técnica. A mais antiga de todas é a LLoyd Register, fundado em 1760, na Inglaterra. Ninguém é obrigado a seguir as normas de uma sociedade classificadora, a não ser que decida contratá-la para aderir às suas normas. Ter uma embarcação, rede ferroviária ou uma planta industrial certificados, entretanto, é um excelente negócio, pois os prêmios de seguro são baratos, pelo baixo risco que representam, e o mercado consumidor acolhe seus produtos e serviços com mais facilidade e preços mais altos. Todo este sistema funciona assentado sobre princípios de confiança, reputação, espontaneidade e livre competição. Ninguém é formalmente excluído do mercado, mas cada qual abocanha a sua parte conforme a sua competência.
Assim sendo, porque não temos, ao invés de uma entidade autárquica como a OAB, uma plêiade de OAB's privadas, cada qual acolhendo os seus bacharéis em direito conforme suas visões e qualidades? O tempo formará a reputação de cada uma, e a população estará convidada a julgá-las por meio do mercado.
Monopólio de Mercado
Sustentam os austríacos que não existe algo como um monopólio de fato, uma vez que a liberdade de mercado pressupõe a faculdade de qualquer cidadão ingressar no ramo, mesmo que casualmente ele esteja sendo, em qualquer momento, explorado por um único agente. Geralmente, o regime de preços estabelece este equilíbrio.
O que existem, sim, são os monopólios de direito, que por isto mesmo, de fato se tornam. Em outras palavras, o monopólio tem como se sustentar quando funciona sob a proteção do estado, como por exemplo, são os próprios atuais advogados aqueles que decidem quantos e quais serão os novos concorrentes, sem que a população tenha como interferir de alguma maneira.
Como tenho afirmado persistentemente, os conselhos de classse - incluída aí a OAB, consistem em excêntricas instituições que legislam e tributam, assumem posições políticas, estipulam multas, cassam profissionais e fecham estabelecimentos, tudo sem controle externo e completamente livres de qualquer pingo de representatividade parlamentar. São estados paralelos, sem nenhum retoque.
O Conselho Federal de Medicina - CFM, assume esta posição de forma eloquente, conforme mantém em seu site: “ao defender os interesses corporativos dos médicos, a CFM empenha-se em defender a boa prática médica, o exercício profissional ético e uma boa formação técnica e humanista...”
Conclusão
Nenhum comentário:
Postar um comentário