Mídia Sem Máscara
Nivaldo Cordeiro | 01 Fevereiro 2011
Artigos - Movimento Revolucionário
Para além das questões políticas ficou o desespero diante das imagens do homem em chamas, um patético protesto de um indivíduo isolado, que não cometeu crime algum, diante do ogro estatal.
Ontem, como sempre, fui assistir ao programa Manhattan Connection e lá foram exibidas as imagens do jovem tunisino Mohamed Bouazizi, que se imolou pelo fogo diante do palácio do governador. Fiquei comovido, as imagens são chocantes. Ali não se tratou de um gesto político. Foi um ato de desespero de alguém que chegou ao limite da opressão pela pobreza e pelo poder de Estado, que caiu sobre ele impiedosamente. Tomaram-lhe as poucas mercadorias que comerciava, bateram-lhe, cuspiram-lhe. O limite da opressão.
Se na origem o protesto foi existencial, uma revolta contra o próprio destino, o resultado foi político. As forças latentes que queriam a mudança do governo não perderam a chance de usar uma história tão espetacular e tão comovente. O ditador Zine El Abidine foi apeado do poder. Vale a velha frase de sempre: muda-se tudo para nada mudar. Não creio que as instituições ocidentais possam ser copiadas pelos países com maioria islâmica. Nisso o coro dos analistas políticos está errado. Mesmo a secretária de Estado Hillary Clinton está errada por partir do suposto de que a democracia, como a conhecemos no Ocidente, é o remédio a ser implantado em toda parte.
O risco que corre a Tunísia, assim como agora o Egito, é de ver o poder de Estado tomado por um partido revolucionário que deseja a teocracia islâmica, como aconteceu no Irã. O sacrifício do jovem tunisino terá sido em vão se isso vier a acontecer. Sem trocadilho, é sair da frigideira para cair no fogo. Aqueles que viram Khomeini tomar o poder puderam assistir a um dos maiores tormentos que pode acontecer a um povo em regime de implantação de uma revolução. É ilusão pensar que pudéssemos ter as instituições da sociedade aberta ocidental clonadas por passe de mágica onde a religião e Estado estão praticamente fundidos. É assim a natureza do Islã. Mesmo onde o poder é laico nos países islâmicos a presença religiosa é total.
O máximo que se pode esperar de países assim é o surgimento de déspotas esclarecidos, como foi o caso da Turquia no início do século XX com Kemal Atartük. Este praticamente diferenciou a Turquia dos demais países islâmicos, inclusive por adotar os caracteres ocidentais para a grafia da língua, até então feita em arábicos. Não ao acaso a Turquia é o que o mundo muçulmano produziu de mais parecido com o Ocidente.
Para além das questões políticas ficou o desespero diante das imagens do homem em chamas, um patético protesto de um indivíduo isolado, que não cometeu crime algum, diante do ogro estatal. Como não se comover? Como não se perguntar sobre o sentido das coisas? Nada há de novo sob o sol.
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