quarta-feira, 6 de julho de 2011

Da ALBA à CELAC

Mídia Sem Máscara

Pedro Corzo | 05 Julho 2011
Notícias Faltantes - Foro de São Paulo

O projeto da CELAC permanecerá vigente enquanto exista despotismo no hemisfério. Os interesses de mandatários como Rafael Correa, Evo Morales e Daniel Ortega são contrários aos valores da democracia, ao escrutínio e à crítica.

Na América Latina nas últimas décadas, criaram-se inúmeras organizações que procuram consolidar os vínculos entre Estados e Governos, em particular, aqueles que estão relacionados com a atividade econômica.

Uma relação destas instituições seria muito extensa e suas conquistas, salvo contadas exceções, ficaram muito longe das expectativas de seus promotores. Algumas das organizações como o Acordo de Cartagena ou Pacto Andino, fundado em 1969 por cinco países sul-americanos, Bolívia, Colômbia, Chile, Equador e Peru, com a finalidade de conseguir uma maior integração e incrementar a cooperação econômica e social, ao qual se somou a Venezuela uns anos mais tarde, sofreu crises muito sérias e seus resultados distam muito dos propósitos iniciais.

Em 1975 constituiu-se o Sistema Econômico Latino-Americano e do Caribe, CELA, integrado por 26 países do hemisfério, com uma visão integradora mais ampla, porém sem colher os êxitos esperados.


Uma organização mais exitosa foi o MERCOSUL, uma união sub-regional integrada por Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai, com a Venezuela em processo de incorporação, e com Bolívia, Chile, Colômbia, Peru, Equador e México como países associados. Sua constituição data de 1991, e seus propósitos são mais amplos e integradores nos aspectos econômicos que o de qualquer outra organização do continente americano.

Outro projeto com fins orientados ao desenvolvimento econômico, mas com uma visão mais integradora, foi a Área de Livre Comércio das Américas, ALCA. Esta instituição propunha-se a reunir todos os países do hemisfério, promover o livre intercâmbio de bens e serviços, com a redução progressiva dos arancéis até levá-los a zero, e preservar e fortalecer a comunidade democrática das Américas.

Os presidentes norte-americanos Bill Clinton e George W. Bush, se esforçaram por impulsionar o projeto que se esperava amadurecesse em 2005, porém o plano se confrontou com três inimigos que tinham bem claro seus propósitos, embora em alguns não fossem coincidentes: Néstor Kirchner, presidente da Argentina, Luiz Inácio Lula da Silva, presidente do Brasil e Hugo Chávez, presidente da Venezuela.

Estas instituições e outras similares não mencionadas neste trabalho, diferem em seus fundamentos e objetivos da Aliança Bolivariana para as Américas (ALBA), que é um projeto que auspicia o presidente venezuelano Hugo Chávez, com a finalidade de gerar alianças políticas e ideológicas, que facilitem o estabelecimento e permanência do modelo político que denominam Socialismo do Século XXI.

A ALBA se constituiu em Havana, Cuba, em dezembro de 2004, como contraparte da ALCA, para se confrontar com os Estados Unidos e toda manifestação política e econômica que não se ajustasse às que promovem os governos de Cuba e Venezuela, seus Estados fundadores. Somaram-se ao plano a Bolívia em 2006, Nicarágua em 2007 e Honduras em 2008, durante o mandato do hoje deposto Manuel Zelaya. Posteriormente, em 2009, se integrou o presidente equatoriano, Rafael Correa. Também se incorporaram vários Estados caribenhos: Antigua y Barbuda, Dominica y San Vicente, e as Granadinas, todos países membros da Comunidade do Caribe, ou CARICOM.

Com o tempo, e graças aos vultosos recursos da renda petrole

ira venezuelana, a organização foi crescendo, embora seria muito temerário afirmar que se fortaleceu.

A ALBA foi um instrumento muito apropriado para que o despotismo e o autoritarismo eleitoral tenham ganhado espaços no continente. Por meio das urnas, seus dirigentes legitimaram um autoritarismo que lhes permitiu controlar os poderes públicos, submeter em grande medida os meios de comunicação e oferecer à comunidade internacional uma imagem de harmonia social que não corresponde com a realidade dos países em que governam.

A mais poderosa e abrangente de todas as instituições hemisféricas é a Organização dos Estados Americanos (OEA), que desde há muitos anos está submersa em uma profunda crise de credibilidade por seus desacertos em todos os campos da política, ao mesmo tempo em que tem gerado sobre si fortes críticas, ao extremo de que em mais de uma ocasião alienou seus membros porque, os que a defendem hoje podem atacá-la amanhã.

Por outra parte, há um fator externo que afeta seriamente a OEA, que é o profundo ressentimento que alguns governos do hemisfério professam contra os Estados Unidos. Esse sentimento é tão profundo e difundido, que desde há muitos anos grupos extremistas de diversas ideologias e distintos projetos políticos vêm programando criar um organismo hemisférico que a substitua e no qual não participem Estados Unidos e Canadá.

Esse projeto tem mais possibilidades de se concretizar do que em nenhum outro momento do passado, porque chanceleres e representantes de 30 países da América Latina e do Caribe se reuniram recentemente em Caracas com esse objetivo.

Rafael Correa, um dos principais artífices deste projeto, disse recentemente: "Propusemos que o Grupo do Rio se converta em uma Comunidade de Estados Latino-Americanos que substitua a OEA", e sustentou que "pela influência dos Estados Unidos, Cuba manteve-se durante quase meio século fora do bloco interamericano". O mandatário concluiu dizendo: "A OEA se desprestigiou muito, necessitamos algo novo, algo melhor, algo nosso e isso é a CELAC".

As possibilidade de que o projeto torne-se realidade são muito certas, não só pela concentração de esforços dos que o promovem, mas também pelas grandes riquezas do povo venezuelano que o presidente Hugo Chávez maneja a seu bel prazer.

É certo que a Comunidade dos Estados Latino-Americanos e Caribenhos que ia se constituir formalmente no dia 5 de julho, dia da Independência da Venezuela, em uma Cúpula Presidencial na ilha venezuelana de Margarita, foi adiada, e que a enfermidade do presidente Hugo Chávez, seu principal financista, pode afetar o projeto, mas nem por isso a idéia vai ser arquivada.

O projeto permanecerá vigente enquanto exista despotismo no hemisfério. Os interesses de mandatários como Rafael Correa, Evo Morales e Daniel Ortega são contrários aos valores da democracia, ao escrutínio e à crítica. Eles e seus aliados, embora não tenham os recursos do presidente da Venezuela, são os autocratas dos tempos de internet, eles vêem a liberdade e o direito dos demais desde o meridiano de seus interesses. Parafraseando os índios Caribes, "só eles são pessoas com direitos".

A CELAC, com Hugo Chávez ou sem ele, mesmo com outro nome, sempre será um instrumento de desestabilização e de concertação para aqueles que buscam o poder para impor sua vontade.

Jornalista e Diretor do Instituto da Memória Histórica Cubana contra o Totalitarismo

Nota da tradutora:

Vejam nota de evento a realizar-se em 11 de julho em Miami, referente ao tema da ALBA, promovido pelo Instituto da Memória Histórica Cubana contra o Totalitarismo aqui: http://observatoriobrasileno.blogspot.com/2011/07/de-la-tricontinental-al-alba.html


Tradução: Graça Salgueiro

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