segunda-feira, 1 de março de 2010

Só o conservadorismo não basta

Mídia Sem Máscara

De tal magnitude é a influência da CNBB e da teologia da libertação na Igreja Católica no Brasil, que nem sequer é possível mais dizer que eles compõem um grupo rebelde dentro da Igreja. Hoje os dissidentes são os próprios padres e fiéis conservadores.

Com o devido respeito à opinião dos amigos conservadores, peço vênia para demonstrar, nas linhas seguintes, que o pensamento conservador não é bastante para fazer uma frente ampla ao avanço do socialismo.

Os conservadores têm sustentado que somente o conservadorismo, por ser munido de um conhecimento transcendental inspirado na tradição judaico-cristã, pode fornecer ao indivíduo a "vacina" eficaz que o impedirá de se deixar levar pelos anseios revolucionários, e in casu, pela revolução socialista. Mais do que simplesmente aos indivíduos, os conservadores depositam tal esperança especialmente nos governantes. Isto ainda merecerá comentários futuros.

Proponho, pois, um estudo de caso, utilizando como objeto a instituição que, tanto por natureza quanto por puro dever de ofício, deveria ser a guardiã infalível dos valores mais caros da civilização: a Igreja Católica. Faço isto por alegar ter sido ela, justamente ela, a maior patrocinadora da revolução socialista no Brasil.

Foi a Igreja Católica que criou e cevou o MST, o Movimento dos Atingidos por Barragens e outros congêneres, tais como as comunidades eclesiais de base e o movimento indigenista missionário, este com claríssimo projeto de secessão; foi ela que tem propagado o desprezo ao livre-mercado, ao lucro, ao dinheiro, ao capitalismo e à propriedade-privada; e foi ela que tem exaltado as virtudes de uma sociedade comunal erigida à base de uma economia autárquica. Neste exato momento, a Igreja Católica é a maior instituição - maior mesmo que o PT - a proclamar ostensivamente o modelo de uma sociedade comunista.

Vou pedir a especial compreensão por parte dos católicos tradicionalistas, pois estou a apresentar os fatos como eles são. Peço, pois, que o assumam dentro do contexto da realidade vigente. Não estou a fazer um juízo de valor sobre os dogmas desta ou daquela crença, nem desejo diminuir a fé de ninguém, e tampouco menosprezar a contribuição da tradição judaico-cristã na formação de nossa sociedade. Estou, sim, apresentando um problema real, que precisa ser enfrentado com honestidade e coragem.

O fato é que, independentemente que se atribuam tais responsabilidades à teologia da libertação, ou à CNBB, ou até mesmo a uma infiltração de agentes comunistas no seio da Igreja, nada disto justifica a leniência desta instituição, a ponto de ter deixado que as coisas chegassem ao ponto em que chegaram, pois um corpo clerical firme e consciente não teria permitido tal façanha. Nenhuma infiltração seria tão massiva a ponto de substituir todos os sacerdotes. O que houve? Os infiltrados convenceram e aliciaram os então existentes!

A começar, a hierarquia não haveria de permitir a prosperidade da teologia da libertação. No entanto, ela cresceu na base, por cooptação dos padres, e cresceu em autoridade, pela promoção ao bispado dos agentes infiltrados e dos seus novos adeptos. Hoje, o que há, em termos de Igreja Católica, é que simplesmente todos os bispos são defensores ou simpatizantes da teologia da libertação. São eles que constituem a CNBB.

Pode-se argüir, em termos formais, que a CNBB não representa a Igreja Católica e nem a sua doutrina social. Contudo, no plano da realidade, isto é altamente discutível. A CNBB lança as suas campanhas em nível nacional, e cada um de seus bispos a referenda em sua área de atuação; suas campanhas são executadas em todas as igrejas, por todos os padres, e se estendem para todas as escolas, hospitais e demais obras. A CNBB tem a sua própria Bíblia comunista e suas cartilhas compõem os ritos nos templos e nos lares.

De tal magnitude é a influência da CNBB e da teologia da libertação na Igreja Católica no Brasil, que nem sequer é possível mais dizer que eles compõem um grupo rebelde dentro da Igreja. Hoje os dissidentes são os próprios padres e fiéis conservadores.

Os conservadores têm alegado que os liberais têm fracassado fragorosamente no plano da discussão das idéias e da conquista das almas e corações humanos. Que dizer, então, da Igreja Católica? Vejam, não estou aqui falando de pessoas comuns, leigas, e natural e intuitivamente conservadoras. Estou falando de padres e bispos, indivíduos que têm as chaves da tradição nas mãos; que vivem para a reflexão e para a leitura dos textos sagrados e dos textos dos filósofos; estou falando dos integrantes de uma organização internacional que tem acesso às leituras do mundo todo. Mesmo no Brasil, a Igreja Católica teve acesso à produção filosófica nacional de alto nível, como poderia testemunhar Mário Ferreira dos Santos.

Por quê nunca houve um decreto papal que expulsasse e excomungasse os teólogos comunistas? Esta pergunta deve ser feita e contraposta à rapidez com que uma menininha de nove anos de idade foi recentemente excomungada: ora, a excomunhão para o cristão que defenda o comunismo também é automática, e para um padre, então, deveria constituir uma sanção ainda mais grave e solene. Entretanto, mesmo do papa considerado o mais conservador dos últimos tempos, temos visto dele pronunciamentos em prol de propostas coletivistas e da formação de um governo mundial. Parece, pois, que o relé deste mecanismo automático está queimado...

Como se vê, toda a tradição guardada pela instituição sacerdotal mais antiga e centralizada do Cristianismo não foi capaz de defender sequer a si própria da expansão das idéias socialistas. No Brasil, a maior parte dos mais representativos pensadores conservadores são católicos fervorosos. Se não têm sido eficientes em resguardar seus valores nem entre os de sua própria crença, como podem reivindicar o monopólio do triunfo e a infalibilidade de suas convicções para toda a nação, esta composta de cidadãos espiritualmente bem mais heterogêneos?

No Brasil, o que se tem defendido por conservadorismo é, mormente, o proveniente da tradição norte-americana. Esta linha de pensamento tem sido identificada por alguns, entre os quais Friedrich Hayek, com a própria história de liberalismo daquele país. Lógico, passados cerca de 334 anos, o liberalismo tornou-se algo não mais a ser implementado, mas justamente, "conservado", tendo com isto aglutinado elementos de nacionalismo e de valores cristãos. Na Europa, o que se pode entender por conservadorismo guarda menos relação com direitos individuais, direito de propriedade, liberdade de expressão e de crença, e direito de portar armas do que com a preservação de privilégios de monarcas e aristocratas, bem como de práticas protecionistas e regulatórias. Nada de exemplar. Nada de surpreendente que tenham se aliado aos socialistas para combater o que restava de um pensamento genuinamente liberal.

Se por um lado o conservadorismo é bastante diligente na defesa dos valores morais de uma nação, por outro é serenamente distraído quando se trata de proteger as liberdades individuais e o direito de propriedade. Um conservador geralmente admite o direito de propriedade, mas apenas em termos generalistas, pronto a preteri-lo perante algum argumento qualquer que lhe pareça moralmente mais enlevado.

Creio que um exemplo razoavelmente acertado disto foi a promulgação do "estatuto da terra" pelo então presidente Castelo Branco, e com ele, a estipulação de um índice de produtividade como condição da manutenção da propriedade rural. Considero este ilustre brasileiro como um dos maiores nomes de nossa história. Todavia, talvez por desconhecer os fundamentos mais caros à doutrina liberal, ele tascou a sua caneta naquele documento, e bem, dali por diante, a Via Campesina e o MST só têm tido o que agradecer.

Quando o conservador sustenta que no campo econômico ambas as correntes políticas têm a mesma fonte, ele pronuncia uma afirmação incompleta. Na verdade o que há é que o conservadorismo emprega a fórmula liberal para a economia, assim como também a aplica para a consagração da liberdade individual, para a liberdade de expressão, de crença e política. Até a educação do conservador é uma liberal education.

Ora, o termo liberal precisa ser reconhecido por seus próprios créditos: foi a filosofia política que provocou a independência norte-americana e das demais nações americanas; que protagonizou a abolição da escravidão mundo afora; que efetivamente separou os poderes do estado e o patrimônio dos homens públicos do patrimônio do estado; que conferiu o voto ao cidadão comum e à mulher; que proporcionou ao homem comum a propriedade privada em um grau jamais conhecido pela história, cujo resultado foi o maior estouro de tecnologia e de produção até então registrados; e que instituiu constitucionalmente o due process of law, entre outras coisas.

Agora, o que é preciso dizer é que nem sempre estas liberdades floresceram graciosamente como heranças da tradição. Muitas vezes elas se concretizaram à guisa de dissidência, de questionamento, e até mesmo de confronto. Os evangélicos, que no passado eram mais conhecidos pelo termo "protestantes", podem hoje se auto-denominar como conservadores, mas tiveram um dia de se afirmar no seu direito de credo para se distanciar dos dogmas católicos, e tiveram de encarar mais uma vez a liberdade de credo para que fosse possível a união das treze colônias inglesas para a formação do novo país.

Por isto que tenho defendido uma frente ampla contra o socialismo que se instaura em nosso país. Uma frente liberal-conservadora, que defenda os direitos individuais, o direito de propriedade e os marcos de um estado mínimo de direito sob a luz dos fundamentos da doutrina liberal, bem como a solidificação da sociedade com os valores morais e espirituais trazidos da Tradição.

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