terça-feira, 29 de novembro de 2011

Uribe e a questão venezuelana

Mídia Sem Máscara

Escrito por Eduardo Mackenzie | 29 Novembro 2011
Notícias Faltantes - Foro de São Paulo

Enquanto a Colômbia oficial continua congelada pelos feitiços de Caracas, o próprio Brasil, onde a esquerda governante teve uma atitude cúmplice frente a Chávez e às FARC, começa a se movimentar em outro sentido: Brasília acaba de criar uma “força de vigilância estratégica” destinada a reforçar sua presença na Amazônia.


O ex-presidente Álvaro Uribe faz um grande favor à Colômbia e à democracia do continente americano ao expressar suas inquietudes sobre o que ocorre nestes momentos na Venezuela. Seu diálogo em Bogotá, nesta semana, com líderes da oposição venezuelana reabre, em boa hora, o tema de qual deve ser a posição da Colômbia frente às calamidades que vive o país irmão e frente ao caos que se aproxima. Devemos ignorar esse desastre e deixar que chegue a extremos inauditos ou devemos ajudar os que lutam pela restauração das liberdades nesse país?

A incursão do ex-presidente Uribe nesse terreno era esperada, pois na Colômbia essa temática, desde que Juan Manuel Santos tomou as rédeas do poder, foi transformado em tabu, sobre o qual não se deve pensar, nem falar, nem escrever.

A nova linha é, com efeito, submeter-se em silêncio aos ditames de Caracas, reorientar o ponto de vista da Colômbia na esfera internacional seguindo os enfoques da UNASUL, inclusive até com a União Européia e os Estados Unidos (o único que escapou disso é o processo sobre a questão palestina) e fazer passar essa virada como exemplo de uma política “mais hábil”.

Esse enfoque facilita o trabalho a Hugo Chávez e a seus acólitos, e abre avenidas aos agentes colombianos dessa tirania. Isso explica o que está ocorrendo na frente interna colombiana e explica por quê as informações e as análises sobre a situação da Venezuela e sobre a crescente ação terrorista das FARC e do ELN contra a Colômbia nos territórios limítrofes com a Venezuela, praticamente desapareceram da imprensa colombiana. Ninguém informa, ninguém investiga sobre isso, como se esses temas não fossem importantes. É como se a estabilidade política e econômica da Colômbia não dependesse em grande parte do que ocorrerá na Venezuela nos próximos meses e anos.

Onde estão as reportagens, as entrevistas, os trabalhos das famosas “unidades investigativas” de nossos diários e revistas sobre o que ocorre na Venezuela, sobre o combate da oposição anti-chavista, sobre a agonia da democracia, sobre as manobras palacianas em curso ante a aceleração da enfermidade de Hugo Chávez e sobre o papel que Havana, as FARC e o ELN estão desempenhando em tudo isso?

Há muito pouco a respeito. Muito pouco há também (e isso é o mais grave) em matéria de explicações do presidente Santos aos cidadãos sobre sua nova política exterior, sobre os compromissos firmados durante as cúpulas e contatos com seu “novo melhor amigo”. Após cada reunião entre eles o que resta são minúsculas notas de imprensa, pouco verificadas, sobre os aspectos secundários desses eventos. De fato, ninguém sabe o que a Colômbia ganhou com sua docilidade ante Chávez, nem quais são as vantagens objetivas e a longo prazo da nova orientação da diplomacia colombiana.

Por isso o ato do ex-presidente Uribe, ao manifestar de maneira pública sua inconformidade com esse status quo e com o eventual aprofundamento desse curso errôneo durante o encontro Santos-Chávez do 28 de novembro próximo, é um chamado de atenção ao país sobre os perigos de continuar observando passivamente esse fenômeno.

O mais ridículo de tudo é que enquanto a Colômbia oficial continua congelada pelos feitiços de Caracas, o próprio Brasil, onde a esquerda governante teve uma atitude cúmplice frente a Chávez e às FARC, começa a se movimentar em outro sentido: Brasília acaba de criar uma “força de vigilância estratégica” destinada a reforçar sua presença na Amazônia, pois estima que nos próximos anos, ante a escassez mundial de petróleo, a “ameaça” virá “da linha do Equador para cima”.

De acordo com isso e em vista dos vandalismos que as FARC cometem no Brasil, sobretudo por suas alianças com o tráfico de drogas, um deputado social-democrata, Otávio Leite, impulsiona um projeto de lei para que as FARC sejam classificadas como “terroristas”. O temor de que essa organização possa cometer ações terroristas durante o Mundial de futebol de 2014 e durante os Jogos Olímpicos de 2016, é outro ponto que preocupa Brasília.

Enquanto isso, a Colômbia continua sem ter uma visão estratégica da evolução da conflitividade no continente, pois acreditamos que ao servir de curinga de Caracas compramos a segurança a longo prazo. Nem sequer o tema da atuação e desenvolvimento das redes operacionais das FARC em outros países, que tanto preocupa o Brasil agora, não está sendo ventilado. Acreditamos com grande ingenuidade que a morte de Alfonso Cano significou a derrota das FARC ou a sua derrubada. Essa miragem desmobilizadora deve ser rechaçada, pois nos leva a uma conclusão falsa: como as FARC já não são uma ameaça, só falta dar os passos para alcançar a paz definitiva: anistiá-los e abrir-lhes “espaços políticos” para que Timochenko e suas hordas sangrentas possam “tramitar suas diferenças” em tema como “o das terras”, como pede agora, com grande precisão, o ex-presidente Ernesto Samper.

A nova campanha desencadeada por Gustavo Petro, prefeito eleito de Bogotá, e Jaime Dussán, chefe do comunista Polo Democrático, pretende silenciar o ex-presidente Uribe. Eles vêem que há que manter a mordaça para que Caracas e Havana avancem em seus planos de enredar mais e mais o governo da Colômbia em seus tentáculos.

Eles não querem que se veja como as FARC, apesar dos golpes recebidos, conservam suas estruturas urbanas e rurais e estão conseguindo não só infiltrar, senão inclusive dirigir certos movimentos sociais, para explorá-los, como nos anos 80 e 90, como força de choque e massa de manobra.

Por isso estão tratando de montar o falso escândalo dos “áudios” onde Álvaro Uribe “instrui” a oposição venezuelana [1]. O simples fato de falar sobre a Venezuela é mostrado como um ato de “diplomacia paralela”, como uma “sabotagem das relações” entre os dois países, como uma “ruptura do consenso”. Qual consenso? Nunca houve um “consenso” na Colômbia a favor de submeter-nos aos caprichos e brutalidades de Hugo Chávez. Não desencadeou-se no país um movimento de hilaridade geral, quando o presidente Santos anunciou que Chávez era seu “mais novo melhor amigo”? Essas acusações carecem de sentido e são puro farisaísmo.

Quem são os que fazem essa campanha? Os mesmo de sempre: a minoria vende-pátria que encontrou em Caracas um sustento para suas miseráveis aventuras. É a mesma fração fanaticamente hostil à democracia. São os que elogiam a ditadura castrista, os que financiam suas campanhas com dinheiro saqueado do povo venezuelano, os mesmos que felicitaram Chávez quando ele declarou as FARC como força “beligerante”. São os mesmos que, ante o espetáculo do veloz armamentismo da Venezuela chavista, pressionaram para que a Colômbia renunciasse ao reforço de sete de suas bases militares com ajuda dos Estados Unidos.

Que autoridade moral podem ter esses senhores para censurar o ex-presidente Uribe? Nenhuma. O ex-presidente Uribe abriu em boa hora a porta da discussão sobre os erros da política exterior colombiana. É tempo de abordar essa temática com critério saudável, e de impedir que esse debate seja fechado de novo.


Nota da tradutora:

[1] Para conhecer o que disse exatamente o ex-presidente Uribe e em que contexto se passou a sua declaração, confiram no seguinte vídeo:
http://www.ntn24.com/videos/en-primicia-alvaro-uribe-explica-la-propuesta-que-hace-la-oposicion-ve-029737

Tradução: Graça Salgueiro

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