quarta-feira, 18 de agosto de 2010

MÉDICOS CUBANOS: 'MISSIONÁRIOS DA REVOLUÇÃO'

Papéis Avulsos


O programa de Cuba de médicos por dinheiro

María C. Werlau

Durante décadas, Cuba “exportou” médicos, enfermeiras e técnicos de saúde para obter influência diplomática em países pobres e dinheiro para sua economia cambaleante. Segundo os meios oficiais cubanos, uns 38.544 profissionais da saúde cubanos trabalharam no estrangeiro em 2008, dos quais 17.697 eram médicos. (Cuba informa que conta com 70.000 doutores no total).

Estes “missionários da revolução” são bem recebidos nos países anfitriões, desde Argélia à África do Sul e Venezuela. Entretanto, os que elogiam a generosidade de Cuba passam por cima dos aspectos mais feios da diplomacia da saúde cubana.

O regime é acusado de violar vários acordos internacionais, como o Protocolo de Tráfico de Pessoas e a Convenção ILO sobre a Proteção de Salários, devido à forma em que são tratados estes provedores de saúde. Em fevereiro, por exemplo, sete médicos cubanos que trabalharam na Venezuela e depois desertaram, apresentaram uma demanda judicial na corte da Flórida, EE.UU., contra Cuba, Venezuela e a petroleira estatal venezuelana, por mantê-los em condições equivalentes às de uma “escravidão moderna”.

Afirmam que o regime cubano retinha os fundos que a Venezuela enviava por seus serviços e depois lhes pagava, um acordo que afirmam é uma forma de servidão de dívida. Também afirmam que os obrigavam a trabalhar em jornadas extremamente longas em zonas perigosas, inclusive em áreas urbanas com altos índices de criminalidade e na selva. (O governo venezuelano e sua petroleira questionam a jurisdição da corte para admitir o caso Cuba não se pronunciou a respeito).

Desde 2002, Hugo Chávez acordou em pagar em sua maior parte na forma de petróleo venezuelano subsidiado e barato, para que Cuba oferecesse serviços médicos a populações marginalizadas na Venezuela sem custo para os pacientes. Porém, nos últimos anos ele estendeu a iniciativa a outros países e ajudou a forjar apoio para sua agenda regional marxista, enquanto mantinha a salvo a economia cubana.

Cuba não torna públicos seus acordos com países anfitriões, porém se conheceu detalhes através de fontes abertas, inclusive do médicos oficiais cubanos. Estes mostram que, tipicamente, o país anfitrião paga a Cuba em moeda dura por cada trabalhador da saúde e oferece alojamento, alimentação e uma remuneração mensal que costuma oscilar entre US$ 150 e US$ 350. Cuba custeia as passagens aéreas e o apoio logístico, além de pagar os salários dos trabalhadores da saúde com os fundos que retém.

Os projetos de saúde global de Cuba também recebem apoio do mundo desenvolvido. Em 2005, pelo menos US$ 27 milhões foram doados à missão cubana no Haiti, inclusive recursos provenientes da França e Japão. A benevolência internacional também se traduz em assistência direta. Em 2008, Cuba recebeu US$ 127 milhões de países da OCDE. Estas transferências explicam o recente aumento na exportação de serviços de Cuba para US$ 8.600 milhões em 2008, frente aos US$ 2.800 milhões em 2003. A cifra representa 75% do PIB e os serviços geram muito mais ingressos que qualquer outra indústria.

Os médicos cubanos vão para o exterior porque em seu país ganham escassos US$ 22 a US$ 25 ao mês. Em outros países, costumam receber uma pequena remuneração em moeda local, enquanto suas famílias em seu país recebem seu salário habitual em moeda dura, entre US$ 50 e US$ 325 ao mês.

Porém, quando o Estado é o único empregador e os cidadãos são proibidos de deixar o país sem permissão, o sistema está feito para a exploração. Vários doutores cubanos que trabalharam no estrangeiro me dizem que, além de trabalhar muitas horas não podem dirigir um automóvel, sair de sua residência depois de um horário determinado ou falar com a mídia. Em alguns países só podem se associar com “revolucionários”. Milhares de profissionais da saúde cubanos têm desertado em todo o mundo. Quase 1.500 deles chegaram aos Estados Unidos só em 2006, segundo um informe do Departamento de Segurança Interior dos Estados Unidos divulgado em março.

O rentável negócio global de Cuba tem ramificações para seu próprio sistema de saúde. Jornalistas independentes cubanos denunciaram que, do mesmo modo que os ocidentais que acabam em um hospital para gente comum, os cubanos enfrentam uma escassez crônica de médicos e instalações médicas dilapidadas. Os pacientes ou suas famílias devem inclusive levar sua própria comida e lençóis ao hospital.

No entanto, a produção em massa de médicos cubanos de exportação tem levado associações médicas em países anfitriões como Bolívia, Paraguai, Uruguai, Brasil e Portugal, a questionar sua experiência e antecedentes. Alguns médicos venezuelanos queixaram-se de ser despedidos e substituídos por médicos missionários cubanos. E há alguns anos, a imprensa boliviana informou que a associação médica do país se queixava que milhares de profissionais da saúde sem emprego ganhavam muito menos que o que Chávez pagava aos cubanos.

O humanitarismo não pode ser seletivo. Os trabalhadores da saúde de Cuba merecem a proteção total das leis locais e internacionais, seus cidadãos merecem acesso a uma cobertura medica adequada e os pacientes em todas as partes merecem que seus provedores de saúde respondam ante as autoridades pertinentes.

Tradução: Graça Salgueiro


María Werlau é diretora executiva da organização de direitos humanos sem fins lucrativos, “Cuba Archive” - www.CubaArchive.org. Publicado em “The Wall Street Journal” em 15 de agosto de 2010.

http://www.heitordepaola.com/publicacoes_materia.asp?id_artigo=2091

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