sábado, 30 de agosto de 2008

Equador: plebiscito constitucional, totalitarismo e investida anti-religiosa

por Destaque Internacional em 29 de agosto de 2008

Resumo: É sintomático o reconhecimento do presidente do Equador de que socialistas espanhóis tenham contribuído para a redação do projeto constitucional.

© 2008 MidiaSemMascara.org


O Tribunal Supremo Eleitoral (TSE) do Equador acaba de convocar um referendo, no próximo dia 28 de setembro, para a aprovação ou rechaço do projeto de nova Constituição elaborado por uma Assembléia Constituinte.

O TSE declarou abertos os debates sobre o projeto constitucional e as primeiras objeções se levantaram de meios católicos, em defesa dos direitos de Deus e dos homens, que se vêem gravemente vulnerabilizados no projeo constitucional. Representantes eclesiásticos e civis desses setores, que conformam uma ampla maioria dentro dos 9 milhões de eleitores, alertaram para o pergio que representa o projeto constitucional que deixa as portas abertas para o aborto, para a união homossexual e para a intervenção do Estado na educação dos filhos. Além disso, existem no projeto outras disposições constitucionais menos comentadas, porém igualmente graves, que diluem o direito de propriedade e aumentam perigosamente o poder discrecional do Estado sobre a vida social, política e econômica, o que poderá levar o Equador a um caos jurídico e a um potencial totalitarismo de Estado com com vistas de legalidade.

O artigo 66, inciso 1º, reconhece a “inviolabilidade da vida”, porém em nenhum momento menciona que esta “inviolabilidade” há de ser desde o momento da concepção e não somente a partir do nascimento. Deste modo, ficam abertas, de par em par, as portas para legislações que favoreçam o aborto.

Nesse sentido, veja-se o inciso 10º do mesmo artigo 66, que assegura um pretendido “direito” das pessoas a tomar decisões “livres” sobre a “vida reprodutiva”, passando por cima da vida dos seres que estão no ventre materno.

Para efeitos de comparação, os textos constitucionais e leis de outros países que proíbem o aborto se encarregam de esclarecer, com espírito previsor, que a vida começa desde o momento mesmo da concepção, para garantir dessa maneira a vida do ser que ainda está se gestando no ventre da mãe.

O artigo 67 reconhece que a família é o “núcleo fundamental da sociedade”, e que o matrimônio somente pode-se realizar “entre homem e mulher”. Não obstante, no mesmo artigo abre-se uma porta genérica, porém sumamente ampla, à possibilidade de outros “diversos tipos de família”. O texto proposto tem o cuidado de não definir esses “tipos de família”, com o qual, de uma maneira consciente ou não, deixa um resquício que poderá servir de fundamento para leis aberrantemente anti-cristãs.

O artigo 68 seguinte concede generosamente a esses indefinidos “tipos de família” os “mesmos direitos” familiares que os que possuem “a união estável e monogâmica entre duas pessoas”. E note-se que quando se refere a “duas pessoas”, o texto constitucional não esclarece o sexo das mesmas e, portanto, abre a possibilidade de uniões homossexuais equiparáveis legalmente às famílias “constituídas mediante matrimônio”.

Muito se poderia comentar sobre os possíveis e preocupantes desdobramentos jurídicos do artigo 26, quando diz que a educação é “um dever ineludível e indesculpável do Estado”, relegando a um segundo plano não somente o dever senão também o direito dos próprios pais sobre a educação de seus filhos.

A reação do presidente Correa às objeções dos católicos equatorianos foi de uma enorme violência verbal e pareceu reviver os tempos do tristemente célebre presidente Eloy Alfaro, seu tio bisavô, que em começos dos século XX desatou no Equador uma violenta perseguição religiosa. Correa chamou seus objetantes de “mentirosos”, como se os artigos citados do projeto constitucional em que se fundamentam as críticas da hierarquia católica e dos fiéis em particular, assim como tantos equatorianos em geral, não teriam sido publicados oficialmente. O presidente acrescentou que não toleraria “sermões nem instruções de ninguém” e fez um chamado a “dizer sim ao futuro sem os medos ancestrais à batina ou à vingança final de Lúcifer”. Particularmente grave foi a ameaça presidencial de que o projeto constitucional “é a última oportunidade de uma mudança pacífica no Equador”.

Tudo o que foi dito acima causa preocupação, porque mostra um país que, a julgar pelas disposições constitucionais citadas, poderá caminhar para um abismo jurídico, político, social e moral.

O vasto projeto constitucional, com 444 artigos e 30 disposições transitórias, em 182 páginas assinadas e rubricadas pelo presidente e o secretário da Assembléia Constituinte, não se limita ao anterior e na realidade contém outro aluvião de aberrações jurídicas que abarcam praticamente todas as áreas da vida social, política e econômica. Tudo isso, através de uma redação que, como se fosse um método dos constituintes, está repleta de ambigüidades.

Dentro desse contexto de linguagem ambígua, o artigo 37, inciso 26, garante “o direito à propriedade em todas as suas formas”, com o qual todo tipo de “propriedade” coletivista poderá ser imposto ou aceito constitucionalmente, e não se sabe em que pé ficará o direito de propriedade privada que não é mencionado uma só vez, sequer para guardar mínimas aparências.

No mesmo inciso 26, se introduz a singular expressão “direito ao acesso à propriedade”, que “se efetivará com a adoção de políticas públicas”, entre outras possíveis medidas que não se definem. Abre-se dessa maneira a porta para um intervencionismo estatal praticamente ilimitado que assegure, segundo os parâmetros socializantes do legislador, esse “direito ao acesso” a tipos de propriedade que tampouco se definem.

No mesmo sentido, preocupa também a introdução do conceito de “controle popular” do próprio Estado e da sociedade, consagrado no artigo 95, assim como o “direito à resistência” e a “demandar o reconhecimento de novos direitos”, incluídos no artigo 98, o qual pode constituir fundamento para agitações sociais sem fim, amparadas pela Constituição, que levem ao desmembramento político, social e econômico do Equador.

Capítulo à parte mereceria o tema do indigenismo, que impregna o projeto constitucional de uma maneira demagógica e potencialmente explosiva.

Por fim, é sintomático o reconhecimento do presidente Correa de que socialistas espanhóis da esquerdista Fundação CEPS, de Valencia, tenham contribuído para a redação do projeto constitucional. A Fundação CEPS é uma ONG ligada ao partido governante PSOE, e a organizações feministas e de esquerda radical simpatizantes das FARC e do ELN na Colômbia, segundo acaba de denunciar a agência católica ACI.

A menos de um mês do plebiscito constitucional, é de desejar que os equatorianos amantes da liberdade coloquem todo seu empenho, dentro do estrito respeito da lei, em um plano publicitário e doutrinal, para que esse projeto de Constituição não seja aprovado.

Publicado por Destaque Internacional – Informes de Conjuntura – Ano XI – nº 254 – São José – 21 de agosto de 2008. Responsável: Javier González.

Tradução:
Graça Salgueiro

Nenhum comentário: