Mídia Sem Máscara
Escrito por Revista Atenea | 08 Agosto 2011
Notícias Faltantes - Comunismo
Nota da tradutora:
No dia 19 de julho passado a Justiça outorgou uma medida cautelar permitindo a liberdade condicional de Alejandro Peña Esclusa, embora ele estivesse preso ilegalmente há um ano sem ainda ter sido julgado. No dia 25 de julho ele concedeu essa entrevista, pois as únicas exigências feitas pelo Tribunal na ocasião da soltura, foram que ele teria que se apresentar mensalmente diante do juiz, apresentar boletins médicos sobre seu estado de saúde, que não se ausentasse do país sem autorização da justiça e, ainda assim, só se fosse para tratamento de saúde no exterior, e que não comentasse sobre seu processo. Esta entrevista, entretanto, só agora foi publicada.
É importante esclarecer este fato para que não pareça que ele infringiu a lei, porque no dia 02 de agosto o mesmo tribunal que outorgou sua liberdade para tratar da saúde, emitiu novas ordens proibindo-o de manifestar-se publicamente por escrito em qualquer meio de comunicação, ou dar entrevistas de qualquer natureza. Neste artigo pode-se conhecer melhor a respeito, embora os motivos para tal censura não tenham sido revelados. A meu ver, a “mordaça” imposta a Peña Esclusa apenas confirma o caráter autoritário e impiedoso de Chávez (e não uma solidariedade a seu estado de saúde), após declarações de Alejandro chamando-o a uma “reconciliação nacional”. Chávez não admite dividir nem partilhar nada com a oposição, daí mostrar sua verdadeira face diante desta proposta.
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Recém-libertado pelo regime venezuelano, por razões “humanitárias”, Alejandro Peña Esclusa foi um dos emblemas na luta contra a ditadura que Hugo Chávez, o máximo líder bolivariano, encarna. Escritor, organizador do grupo político Fuerza Solidaria e ex-candidato presidencial, Peña Esclusa aborda nesta entrevista a grave situação que seu país padece, e advoga por um grande acordo nacional para sair da mesma.
Revista Atenea: Qual o balanço que você faz deste ano de reclusão forçada, após ser detido pelo regime de Hugo Chávez?
Alejandro Penã Esclusa: Estou orgulhoso de que podendo sair do país, evitando meu encarceramento porque tive muitas ofertas para sair da Venezuela através de amigos muito valiosos, fiquei na Venezuela e enfrentei a prisão. Há muitas formas de resistência, de luta, inclusive o exílio, mas eu considerei que minha obrigação era ir para a prisão e demonstrei meu compromisso com a Venezuela, como ativista político. Me sacrifiquei pela Venezuela e creio que valeu a pena este sacrifício. Depois, considero que foi uma experiência muito enriquecedora que me serviu para crescer, amadurecer, estudar e meditar. Creio que para um dirigente político esta é uma parte de sua carreira. Cada um deve saber quais são suas obrigações. E um político, se for necessário, deve enfrentar o cárcere para defender suas idéias. Sempre disse isso e me sinto muito satisfeito de ter podido fazer, de ter podido cumprir com esse compromisso com meu povo, com a Venezuela.
Você está satisfeito com a reação internacional ante seu caso?
A reação internacional foi sensacional, quase sem precedentes. O Congresso do Paraguai, por exemplo, pronunciou-se a favor do meu caso sem nenhum voto contra. Também no Chile, o Congresso se manifestou a favor do meu caso e de minha libertação por 51 votos contra 6, inclusive até gente da bancada socialista vinculada a Chávez votou a favor da minha liberdade. Na Bolívia se observou uma reação parecida e 37 deputados, todos da oposição, se manifestaram a meu favor. Da mesma forma, houve uma reação parecida no Parlamento Europeu e 23 euro-deputados se manifestaram a favor da minha liberdade e condenaram meu encarceramento. Escritores, acadêmicos, instituições de direitos humanos, pessoas independentes, enfim, um público numeroso se manifestou e tomou partido em favor do meu caso. Na Espanha, por exemplo, o partido Convergencia i Unión se manifestou a favor da minha causa. A hierarquia da Igreja venezuelana e a Mesa da Unidade da Venezuela, também se manifestaram a favor. Quase que poderia dizer que todos os dias algum representante ou instituição se manifestava a favor do meu caso, se interessava pelo mesmo.
Hoje se encontra uma Venezuela muito distinta da que deixou antes de ser preso?
A oposição ganhou inclusive as últimas eleições legislativas mas as mudanças na norma eleitoral feitas pelo regime, permitiram-lhe manter a maioria no parlamento. Ganharam por maioria, porém a oposição só conseguiu arranhar um terço das cadeiras, graças às trapaças perpetradas pelo executivo chavista. Porém, o que constato agora é que a crise do país é muito grave, em todos os sentidos e setores da vida, muito profunda, e desde que saí da prisão o que tenho defendido é um grande pacto nacional que favoreça a governabilidade. E defendo esta idéia porque neste momento não acredito que a crise tão grave que o país atravessa possa ser resolvida por um só candidato ou partido, senão que necessita do consenso de amplos setores sociais e da ajuda de todos. A situação é tão grave que requer um grande acordo de governo que vá além dos partidos e englobe também a sociedade. É uma das mais graves crises da nossa história e tenho a impressão de quem nem todos os setores estão atentos para a gravidade da mesma.
Entretanto, quando se observa os canais e mídias oficiais parece que não está acontecendo nada no país. Você não percebe assim?
Isso eles dizem da boca para fora com fins propagandísticos, mas eu tenho a impressão de que nas altas esferas do governo há sim uma preocupação com relação à situação que vivemos. Eles estão preocupados e nervosos porque sabem que os problemas que têm diante de si ultrapassam suas próprias capacidades. Temos os indicadores de inflação mais altos da América Latina, Caracas é uma das cidades mais perigosas do mundo, a insegurança disparou de uma forma alarmante, a produção na agricultura e na criação de gado reduziram-se drasticamente, um presidente enfermo que vai se tratar em Cuba, uma crise na liderança do partido governante, a divisão interna do chavismo. Tudo isso em meio de uma grave crise econômica internacional que nos golpeia a todos. A situação é muito crítica e não se pode esconder.
O que você acha que pode acontecer daqui até as eleições de 2012, se agravarão os problemas?
Sim, claro, vai-se agravar e a crise vai se tornar mais evidente. E por isso não acredito que as eleições sejam suficientes para superar a crise; estamos em um barco frágil que navega em águas turbulentas e necessitamos do consenso de todos para não naufragar e salvar a nave. As eleições não resolverão os graves problemas da Venezuela, como tampouco acredito que uma lista única da oposição seja a solução para a crise. Acredito que temos que ir além, em uma aliança de todos os setores políticos e sociais que sejam capazes de trabalhar por um projeto de nação a longo prazo, talvez de até quarenta anos. Precisa-se procurar um acordo geral amplo, em que todos participem, capaz de satisfazer as demandas e os problemas de todos os venezuelanos, com respostas aos muitos desafios que temos agora sobre a mesa. E que o presidente eleito para liderar esse projeto seja um mero gerente do projeto aceito por todos os partidos e setores sociais, alguém que concite o consenso e seja capaz de conduzir a nave.
Não parece que o chavismo esteja nessa linha, senão que pretendem seguir governando o país até 2031, como o próprio Chávez disse?
Isso é em teoria, mas a realidade, muitas vezes, faz com que as teorias se derrubem. Todo mundo tem muitos projetos e idéias, porém, a realidade acaba se impondo e é quem acaba condicionando a agenda finalmente, por mais que alguns se empenhem em defender suas teorias. Acredito que este governo vai se chocar com a realidade e eles vão ter que resolver, de uma vez por todas, os problemas dos cidadãos. Há um colapso total no país, inclusive das infra-estruturas, nada funciona e os serviços são um caos. Essa é a realidade e alguém terá que assumi-la.
Você acredita que Chávez acabará assumindo o que diz, esse estado caótico da situação e o colapso total de um país?
Isso não depende de sua vontade, a realidade supera as vontade dos homens. Ele terá desejos de fazer outras coisas, mas a realidade se impõe. Depois, ninguém o questiona, o que é pior, porque deveria haver gente dentro do governo que dissesse a Chávez o que realmente está acontecendo. Que lhe contem a verdade e que digam também ao país. Tratar de impor o “socialismo do século XXI” nas atuais circunstâncias é pura fantasia, está totalmente fora da realidade. Uma voz sensata dentro do governo deve dizer a Chávez o que está ocorrendo e procurar uma ponte, uma aproximação com outros setores sociais. Eles necessitam de ajuda porque os problemas são muito graves e muito profundos, e não creio que eles sejam capazes de resolvê-los por si sós.
Você acredita que Chávez não está a par do caos que o país padece?
Realmente não sei, pois não falei com ele, mas me parece que ele teria que dizer as coisas para a sociedade e não continuar mentindo acerca dos problemas reais que este país padece neste momento fatídico. Chávez não pode viver fora da realidade; isso é um erro.
Que movimentos políticos você prevê, quais são suas prioridades?
Eu tenho três prioridades: a primeira é enfrentar minha situação pessoal relativa à minha saúde, pois tenho um câncer, e me aproximar de minha família após esse ano de prisão. Sem saúde não há trabalho político que se possa desenvolver. A segunda prioridade é gerar um movimento político pela libertação de todos os presos políticos que há nos cárceres venezuelanos e que permita também a volta dos exilados. Creio que este assunto é vital para conseguir a reconciliação e um diálogo entre o governo e a oposição. E, em terceiro lugar, vou promover um grande acordo nacional de reconciliação e reunificação que possa guiar o país neste momento em que vivemos uma grave crise em todos os níveis e o que se avizinha, que pode ser mais ainda mais profundo. Porém, bem, eu já disse que o primeiro é minha saúde; sem ela não há política.
Você vai continuar com seu projeto de UnoAmérica?
Creio que meu encarceramento obrigou a UnoAmérica a trabalhar sem a minha presença e a trabalhar com outras organizações muito ativas e interessantes do continente. Creio que essa é a parte positiva deste ano. UnoAmérica não é só uma organização, mas uma idéia e um projeto a favor das liberdades, da democracia e dos direitos humanos. Acredito que UnoAmérica, como conceito, cresceu muito no último ano e é a organização pioneira na defesa desse conceito da defesa da liberdade e da democracia.
Se não conseguir levar adiante seu projeto de um grande acordo nacional, o que faria?
O importante, penso, é o diagnóstico da realidade venezuelana e a profunda crise que o país vive. E quando nos encontramos com esta situação tão crítica, a única saída - continuo pensando - é um grande acordo nacional e um consenso amplo para seguir adiante. As eleições, inclusive embora tenha as primárias dentro da oposição, não vão resolver os graves problemas que este país tem. Os problemas se agravarão e estourarão de uma forma mais virulenta em um curto tempo. Acredito que os venezuelanos temos que assumir a gravidade da crise que vivemos. Sem assumir esta proposição, não se caminhará na resolução dos desafios que temos como país. A crise de governabilidade que a Venezuela tem passa por um grande acordo nacional, e também por um presidente com um papel de gerência aceito mediante consenso e que concite o apoio majoritário de todo o país.
Publicado na Revista Atenea
Tradução: Graça Salgueiro
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