quinta-feira, 21 de outubro de 2010

Eleições, mentiras e videotape

Mídia Sem Máscara

Blog do Mr. X | 21 Outubro 2010
Artigos - Eleições 2010

Do ponto de vista dos princípios, seria melhor que ambos candidatos, em vez de tentar se acomodar ao desejo do público, tentassem convencer o eleitorado da validade de suas próprias idéias, que são as que colocarão em prática no final.

Ia parar de blogar por um tempo, mas um post do ressuscitado Fábio Marton no Not Tupy me inspirou. É sobre a necessidade da mentira na democracia. Será que democracia sempre implica em demagogia? Talvez seja um dos males deste sistema que é o pior com exceção de todos os outros. Como o político depende do voto do povo, precisa se disfarçar de Zé Povinho, mesmo que esteja muito distante físicamente, espiritualmente e financeiramente deste. Marton discute especialmente a questão do aborto, sobre a qual ambos candidatos precisam mentir para não desagradar 70% do eleitorado, mas esta é apenas a mentira mais óbvia. Um tema mais interessante é a questão do uso do dinheiro público.
Há eleições em breve nos EUA e no Brasil, e o contraste entre os dois países não poderia ser mais grotesco. Nos EUA, há eleições parlamentares nas quais os Republicanos perigam ganhar em uma lavada histórica. Há uma atmosfera muito grande de rejeição aos Democratas estatistas, à gastança excessiva e ao elitismo dos políticos em geral. Já no Brasil, o grande vencedor entre os deputados foi Tiririca, que prova que "o grande mérito no Brasil é subir na vida sem ter mérito algum", e a eleição no segundo turno é entre dois candidatos estatistas, que lutam para decidir qual é mais contrário às privatizações. (Um dos poucos políticos que defende as privatizações, curiosamente, é o ex-comunista Roberto Freire, presidente de um partido que se declara "Popular Socialista").

Dilma mente sobre o aborto: mente também Serra quando diz que não irá privatizar? (Mas temo que Serra não minta, que seja mesmo contrário à privatização). Se eu sou contrário ao aborto e a favor das privatizações, deveria considerar a primeira uma mentira danosa e a segunda uma mentirinha válida? Não. Do ponto de vista dos princípios, seria melhor que ambos candidatos, em vez de tentar se acomodar ao desejo do público, tentassem convencer o eleitorado da validade de suas próprias idéias, que são as que colocarão em prática no final.

Tanto nos EUA quanto no Brasil, é patente a busca de identificação do candidato com o povo: o que muda é que, nos EUA, o "povo" é a classe média revoltada com a falta de melhoria econômica que quer menos gastança do governo, e no Brasil o povo é a maioria da população que quer mais governo e mais benefícios para si.

Atire a primeira pedra quem nunca pecou ou recebeu dinheiro do Governo. Muitos criticam o bolsa-família como compra de votos, mas, de fato, não é um saco de farinha ou um auxílio no fim do mês um benefício econômico mais tangível do que vagas promessas de melhoria econômica através do liberalismo?

Todos gostam de receber dinheiro do "governo", isto é, dos impostos. O que incomoda é que outros recebam sem merecer. Mas quem é que define quem merece o quê?

Caiu em minhas mãos, por acaso, um texto de um cineasta e professor universitário declarando-se a favor da Dilma. Seu argumento é que o PT deu dinheiro ao cinema e às universidades. Que,
por mera coincidência, constituem o seu ganha-pão. O cineasta é autor de filmes experimentais de "vídeo-arte", tão chatos que só poderiam ser produzidos com dinheiro público mesmo. Mas o sujeito é tão cara-de pau (ou tão esperto) que chegou a realizar um vídeo com dinheiro público no qual mostrava justamente como gastava o dinheiro do prêmio viajando para a Europa e EUA e comendo nos melhores restaurantes. A obra-prima pode ser assistida aqui. A crítica, naturalmente, elogiou:

O que o espectador presencia então é praticamente um homem em sua missão: queimar R$13 mil e fazer um filme deste seu processo. No meio tempo ele cruza o oceano duas vezes, se hospeda em belos hotéis, passeia por Europa e EUA, come do bom e do melhor. Tudo, conforme o logotipo da patrocinadora no início e no final deixa bem claro, às nossas custas. No final da sessão em que eu estive presente, uma mulher levantou revoltada: "Vagabundo! É o meu dinheiro também!"

Desse grito (desejado e conseguido pelo filme) começam as inúmeras e necessárias perguntas que ele levanta: vagabundo por quê? O cineasta fez um filme com o dinheiro do prêmio, que era o que se exigia dele. Apresentou seu resultado final, com a duração pedida, dentro do orçamento proposto. Qual o problema, portanto? Que ele tenha se beneficiado pessoalmente deste dinheiro? Bom, pelo menos nós vimos como ele o fez. Quantos belos jantares e viagens foram pagas nos outros filmes produzidos com este prêmio e nós nem sabemos? Quantas contas de motel? Então, supomos que a revolta não pode ser no campo da ética, já que antiético seria fugir com o dinheiro sem fazer o filme ou escamotear prestações de conta escondendo tais gastos, coisas que Migliorin não fez.

É claro, o cineasta poderia ter sido ainda mais "ético" e devolvido o dinheiro, ou realizado um outro vídeo de protesto pagando do seu próprio bolso, mas isso talvez seria "provocativo" demais: também não devemos exagerar. No fundo, o videoartista não difere muito de tantos outros cineastas brasileiros, que adoram criticar o governo e a sociedade enquanto são financiados por este e esta.

Seria fácil dizer que o eleitor americano é mais politizado e consciente do que o brasileiro, mas não sei se é isso mesmo: eles estão, como todos, apenas defendendo o que é seu. Não querem dividir o dinheiro ganho com seu trabalho com as minorias parasitárias do
welfare e com imigrantes ilegais, especialmente em uma época de crise econômica que só foi piorada pelos Democratas. E têm razão. Talvez a diferença seja apenas que essa equação (dinheiro público = dinheiro do contribuinte) ainda não tenha sido compreendida pela maioria dos brasileiros, mesmo os de classe média e alta.



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