Mídia Sem Máscara
Yamid Amat | 11 Outubro 2010
Notícias Faltantes - Foro de São Paulo
A fiscal Ángela María Buitrago começa dizendo em sua sentença que os senhores do M-19 estavam no Palácio da Justiça. Não! Assaltaram o Palácio, o que é muito diferente. Diz que o M-19 reteve alguns magistrados. Não! Os seqüestrou. Diz que os guerrilheiros tiraram a vida de algumas pessoas. Não! Massacraram-nas.
O coronel Plazas Vega pede que a Interpol identifique os cadáveres pelo DNA. O coronel (R) Alfonso Plazas Vega, que participou da recuperação do Palácio da Justiça tomado por guerrilheiros do M-19 em novembro de 85, faz uma surpreendente afirmação nesta reportagem: "O comandante da tomada, Luis Otero, um dos fundadores desse grupo, conseguiu escapar com vida". E o oficial da reserva acredita que ainda está (vivo). "É preciso procurá-lo".
Plazas arremete contra a fiscal e a juíza do seu caso, e assegura que "os chamados desaparecidos" estão no necrotério do CTI (Corpo Técnico de Investigação) da Fiscalização e que eram os empregados da cafeteria que foram conduzidos ao 4º andar, "pistola na mão", pela que ele acredita que "era a guerrilheira Cristina Guarín, irmã do guerrilheiro René Guarín, que está livre". Não quis se referir à proibição de dar aulas ou conferências."O tema me parece intranscendente". Plazas apelou à condenação que lhe impuseram: 30 anos de prisão.
O senhor insiste em que seu caso deve ser conhecido pela Justiça Militar?
O Artigo 221 da Constituição diz que "dos delitos cometidos pelos militares em serviço ativo e em relação com o mesmo serviço, conhecerão as cortes militares ou tribunais castrenses em acordo com o Código Penal Militar". Aqui decidiram desconhecer a Constituição. Os militares saímos, em cumprimento da ordem constitucional do presidente Betancur, a defender o Estado de Direito. Ele mesmo reconheceu isso.
O assunto é se o desaparecimento de pessoas constitui um ato de serviço?
Sua pergunta é mal intencionada. Estão me pré-julgando: antes de determinar se eu desapareci com alguém, me mandaram para a justiça ordinária. Julgaram-me com base na imaginação de que eu ordenei desaparições. A fiscal Ángela María Buitrago começa dizendo em sua sentença que os senhores do M-19 estavam no Palácio da Justiça. Não! Assaltaram o Palácio, o que é muito diferente. Diz que o M-19 reteve alguns magistrados. Não! Os seqüestrou. Diz que os guerrilheiros tiraram a vida de algumas pessoas. Não! Massacraram-nas. De modo que, desde o começo de sua sentença, observa-se nela um posição ideológica. Ela está utilizando a mesma terminologia da guerrilha.
O senhor acredita que se a Justiça Militar julgá-lo, o absolverá?
E se a ordinária me julgar, com juízes justos, também. O que acontece é que a militar não cometeria os erros da ordinária, que me acusa de ter manipulado reféns resgatados que passaram para a Casa del Florero. Isso é falso! Lá havia uma organização de inteligência separada das operações. Eu não podia estar combatendo e ao mesmo tempo pedindo documentos.
Mas Édgar Villamizar, que saiu do Palácio, disse que o senhor ordenou: "Façam esses f.d.p falar", referindo-se a suspeitos do Palácio...
Está comprovado que esse senhor nunca saiu de Granada (Meta) e não esteve nos atos do Palácio. Ninguém no processo o viu. Meu advogado desafiou a juíza Jara, que está validando seu depoimento, para que apresente esse fantasma que ninguém conhece e nunca compareceu à audiência. Porém, claro, a fiscal Buitrago não o investigou e a juíza Jara o aceita como testemunha acima do Ministério Público. Isso do Villamizar não é um depoimento, mas um libreto assinado por alguns funcionários. E com isso me condenaram.
Quais guerrilheiros saíram do Palácio e foram para a Casa del Florero?
Não sei.
Irma Franco saiu viva do Palácio?
Sem dúvida. Entre os 12 e 15 depoimentos as pessoas a viram. Os da cafeteria, que dizem que desapareci, ninguém nunca os viu.
E onde morreram os 11 empregados da cafeteria?
Os magistrados Jaime Serrano e Carlos Upegui, após uma investigação de mais de seis meses, disseram que dois grupos bem definidos podem "ser abrigados sob a denominação de desaparecidos": o primeiro é integrado pelos da cafeteria, uma visitante habitual do Palácio, a doutora Gloria Anzola e Lucy Amparo Oviedo, conhecida do doutor Reyes Echandía. O segundo grupo são os guerrilheiros que saíram vivos do Palácio e referem-se a Irma Franco Pineda e Clara Enciso. Para mim, só estas duas pessoas são as chamadas desaparecidas. Todos os demais morreram. Os magistrados dizem que os cadáveres não identificados,"inquestionavelmente não correspondem a guerrilheiros". Ou seja, aí estão os chamados "desaparecidos" que não estão desaparecidos: foram levados por seus captores ao quarto andar e morreram ali. Sobre isto dizem os magistrados que "há prova suficiente". Por que a fiscal Buitrago e a juíza Jara desconhecem a investigação dos magistrados? Os cadáveres destas pessoas estão no necrotério de Madicina Legal do CTI.
Sua tese é que não há senão dois desaparecidos?
Não, uma: Irma Franco. Clara Enciso apareceu no México. E está viva. Ninguém a procura.
Como e quem obrigou os empregados da cafeteria a ir para o quarto andar, onde, segundo o senhor, morreram?
Há testemunhos de que uma mulher com revólver na mão, na cafeteria, obrigou os empregados a subir para o quarto andar. E tenho uma suspeita sobre quem era essa infiltrada na cafeteria: Cristina Guarín, a irmã de René Guarín, membro do M-19, que anda livre. Cristina morreu, foi reconhecida pelo coveiro que a enterrou no cemitério do sul. Não estava carbonizada, mas figura como desaparecida. Isso também está no processo. E acredito que Luis Otero, que comandou a tomada, o chefe de semelhante barbárie, está vivo! E ninguém o procura. Saiu com identidade de outro e fugiu.
Quem disse isso?
O chefe de inteligência da Brigada, coronel Edilberto Sánchez, disse em uma comunicação radial no dia da tomada. E para isso ninguém dá bola.
O cadáver de Otero não apareceu?
Não senhor, não apareceu.
E, segundo o senhor, onde estão os cadáveres das pessoas desaparecidas?
No CTI. Até outubro passado estavam no laboratório de antropologia da Universidade Nacional. Veja: a fiscal Buitrago diz coisas tão interessantes na resolução da acusação como esta: "Como as pessoas da cafeteria estavam vivas quando começou o assalto ao Palácio da Justiça e agora não aparecem, é porque o Exército as desapareceu e o coronel Plazas é o responsável". Essa é a forma pueril como me condenam.
A sua teoria é que os empregados da cafeteria, cujo desaparecimento o responsabilizam, morreram na operação militar?
Sim, senhor.
Quem era Otero?
Um fundador e membro do comando superior do M-19. Planejou a tomada da embaixada dominicana e participou de muitos seqüestros e crimes. Era antropólogo da Universidade Nacional, onde estudaram Vera Grave e o jornalista Germán Castro Caicedo, que escreveu um livro contra mim, "El Palacio sin máscara". Nessa faculdade também estudou 'Alfonso Cano', chefe das FARC.
Não parecem irresponsáveis suas sugestões contra Vera e Germán?
Irresponsável é o que ele disse de mim, tratando-me como "criminoso". Embora eu não tenha interposto ações judiciais contra ele, poderei fazê-lo.
Por acaso Castro Caicedo não se baseou nas denúncias da fiscal Buitrago?
Não sei. Seguramente. Porém, ele devia ter-se inteirado de que a tenho denunciada por prevaricato, fraude processual e falsidade ideológica em documento público. É que o mesmo procurador do meu caso, Jesús Villabona, desbaratou em seu alegato de conclusão das acusações da fiscal, pediu sentença absolutória em meu favor e, depois da condenação, apresentou apelação à sentença da juíza contra mim. O mesmo Villabona qualifica em seu informe como "inconsistentes" as afirmações de Villamizar. Isso não pareceu importante a Castro Caicedo.
O senhor não está tratando de se vingar dos que o têm acusado?
Estou rechaçando a campanha infame contra mim. Não sou um criminoso. Vou entregar a meu advogado as necrópsias dos cadáveres que não estão identificados. São 36 cadáveres no total que foram sepultados na cova do cemitério do sul de Bogotá.
Porém, no processo consta que fizeram provas de DNA em 24 cadáveres e o senhor disse que foram sepultados 36. O que aconteceu com os outros 12 cadáveres?
Eu perguntei isso a José Vicente Rodríguez Cuenca, atual coordenador do laboratório de antropologia e diretor na época. Ele me respondeu que não se havia feito pelo avançado estado de carbonização. Essa era uma resposta adequada em 2001, não em 2010. Há dez anos não era possível porque um corpo com alto estado de carbonização se desintegra e há degradação do DNA. Com as técnicas modernas de hoje já não ocorre isso. Peço que a Medicina Legal da Fiscalização faça as provas de DNA nesses 22 cadáveres. E que a Interpol intervenha. Aí vão conseguir identificar os dez cadáveres. Entre eles não vai estar o de Irma Franco. E lhe asseguro que não vai aparece Otero. Esse sim que é um vivo que está desaparecido e que não sei por quê não o procuram.
'A ninguém desejo um mal assim'.
O coronel Plazas Vega diz que violaram seu foro militar.
Qual é sua situação atualmente?
Não há direito a que neste país alguém tenha que viver uma circunstância como a que estou padecendo. Até em La Picota me mantiveram, sem estar condenado e violando meu foro militar, o qual não tem nome. A enfermidade de que padeço, produzida por minha angústia, ainda não desapareceu.
É enfermidade física ou moral?
Ambas. É muito difícil estar preso por um delito que não cometi. Não desejo a ninguém um mal assim, agravado pela sevícia e a sanha com que dois operadores judiciais estão atuando contra mim, violando meus direitos. É uma ignomínia.
Especial para o jornal "El Tiempo", de Bogotá.
Tradução: Graça Salgueiro
Visite o site www.freeplazasvega.org e assine o manifesto que pede a libertação do Cel. Plazas Vega
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