quinta-feira, 3 de janeiro de 2008

A retórica da tirania benevolente

por João Luiz Mauad em 03 de janeiro de 2008

Resumo: Um capítulo especial precisa ser dedicado a duas pérolas da retórica esquerdista. Tratam-se dos famigerados e indefectíveis “bem público” e “serviço público”.

© 2008 MidiaSemMascara.org


Um dos preceitos básicos do esquerdismo é o de que os indivíduos (ou pelo menos a maioria deles) são incapazes de se auto-dirigir. Já no terreno coletivo, as organizações humanas trariam em seu interior profundas imperfeições, geradoras de conflitos e desequilíbrios, cujos ajustes exigiriam a permanente interferência do Estado, seja em sua forma protetora ou provedora. O forçoso corolário dessa visão de mundo é que as soluções para os problemas sociais devem passar por uma boa dose de autoritarismo.

Para levar a cabo a proposta de tirania benevolente, os ideólogos da esquerda costumam dominar como ninguém o terreno cultural. Tal domínio se dá, basicamente, pela redefinição de certo vocabulário-chave. Termos caros à maioria dos homens de bem, como liberdade, propriedade, democracia, direito, justiça, igualdade, dentre outros, são usados amiúde com significados absolutamente diversos dos originais – exatamente como a “novilíngua”, descrita por George Orwell no romance “1984”. Não por acaso, quanto mais ameaçada pela arbitrariedade encontra-se uma sociedade, mais se convive com expressões do tipo: “justiça social”, “propriedade solidária” ou “democracia radical”.

Seu potencial bélico é infindável. A arma de embromação mais poderosa desses novos tiranos talvez seja o modo como manejam as estatísticas de forma a dar credibilidade às suas cantilenas favoritas. Na sua guerra anti-globalização, por exemplo, sustentam que, com o advento da globalização neoliberal, os pobres do mundo estão cada vez mais pobres e os ricos cada vez mais ricos. Pura balela, pois distorce dados, mistura universos distintos e confunde propositadamente pobreza com desigualdade, renda com riqueza.

O catedrático da Universidade de Colúmbia, Xavier Sala-i-Martin já realizou diversos trabalhos que desmascaram completamente tal falácia. Na verdade, desde o advento da globalização, a partir de 1970, os índices de pobreza mundo afora não param de cair. Provou também que o empobrecimento renitente de umas poucas nações terceiro-mundistas se deve unicamente ao modelo de economia socialista planificada que ainda impera por lá ou são sistematicamente sangradas por ditaduras para financiar guerras intermináveis.

Falemos um pouco de outra forma habitual de manipulação, que é a confusão entre correlação e causalidade. Quando dois eventos X e Y se descobrem correlatos, podem estar sucedendo quatro coisas: que X causa Y; que Y causa X; que X e Y sejam causados por Z ou ainda que esta correlação seja somente mera coincidência. Os “ungidos”, no entanto, sempre “demonstrarão” que um evento pernicioso X é causado por um Y, o qual, por sua vez, pode ser modificado ampliando-se os poderes do Estado e re-distribuindo-se renda. Um exemplo muito próximo a nós é a famigerada correlação entre delinqüência e pobreza. Assume-se que a pobreza causa a delinqüência e, ato contínuo, clama-se por políticas estatistas igualitárias e re-distributivas.

Não por acaso, os intelectuais da esquerda costumam usar e abusar de estratagemas retóricos muito bem estudados e articulados. O exemplo talvez mais notório seja o uso indiscriminado que fazem do dualismo entre “complexidade” e “simplificação”. Como o mundo será sempre mais complexo e menos simples do que qualquer descrição que se faça dele, estritamente tudo será, de alguma maneira, uma simplificação. Por isso, num debate qualquer, tão logo se esgotem seus argumentos, os esquerdistas passam a atacar os argumentos do adversário qualificando-os de “simplistas”, em lugar de provar, empírica ou racionalmente, como seria correto num debate honesto, a falsidade dos mesmos.

Outro truque bastante comum é o do “tudo ou nada”. Como sabemos, a ocorrência ou existência de qualquer fato, circunstância, sentimento ou atributo, no mundo real, podem ser graduados em níveis. Ninguém é totalmente bom ou mau, justo ou injusto, por exemplo. Tendo em vista essa premissa, tudo passa a ser relativo: o bem e o mal, a justiça e a injustiça, o certo e o errado, etc. Sua mais famosa expressão a esse respeito é a famigerada: “a virtude está no meio”.

Usando o mesmo raciocínio torto, porém invertido, os sofistas da sinistra alegam, em defesa de sua ideologia assassina, que nenhuma nação do mundo jamais experimentou até hoje o comunismo puro, nem tampouco o liberalismo puro. Usam tal indicação - sem dúvida correta - para rechaçar qualquer eventual comparação entre o mundo comunista e o mundo livre, já que, ao fim e ao cabo, dizem eles, aquele não era totalmente comunista, nem este totalmente livre.

Nossos adversários são também craques no uso das generalizações. Na defesa de um ponto de vista pessoal, costumam expandir a sua opinião para fazê-la parecer mais abrangente. Os exemplos típicos são expressões do tipo: “o povo quer”, a “sociedade deseja”, “existe um clamor popular” e por aí vai. Nesse ponto, devemos destacar ainda um certo vocabulário próprio, que os situa num plano superior. Eles apóiam “questões de princípios”, enquanto seus adversários (nós) defendem tão somente “interesses mesquinhos”.

Se há, porém, um campo onde eles são imbatíveis é o dos clichês e das sentimentalidades em geral. Se há um projeto que desejam que se realize, criam uma “crise”, uma “necessidade genuína”. Seu discurso está freqüentemente recheado de infalíveis chavões do tipo: “nossa ação visa às gentes vivendo abaixo dos níveis de subsistência” ou “algo precisa ser feito para matar a fome de milhões de brasileiros”. Suas ONG’s para o desarmamento são “movimentos pela paz”. Já os ambientalistas, “defendem o planeta da destruição capitalista”. Uma beleza. Eu quase chego às lágrimas quando ouço estas abobrinhas.

Um capítulo especial precisa ser dedicado a duas pérolas da retórica esquerdista. Tratam-se dos famigerados e indefectíveis “bem público” e “serviço público”. Em linguagem esquerdofrênica, “serviço público” é aquele que, mesmo não sendo desejado pelo distinto público, mas na medida em que os ungidos os desejam, deve ser imposto de qualquer maneira. Já “bem público” é normalmente utilizado para definir certos bens cuja utilidade, lucratividade e demais benefícios estão restritos a uma parcela muito pequena do dito público. As empresas estatais são o exemplo mais vivo dessa embromação.

Há ainda a utilização de certas palavras mágicas, como “ganância”. Todo dinheiro ganho no mercado, ainda que honestamente, é fruto da “ganância” dos capitalistas. Já os agentes públicos são todos benevolentes, honestos e ilibados, ainda que a experiência prática indique que eles podem ser infinitamente mais gananciosos - roubando ou extorquindo o próximo - do que qualquer empresário.

E assim, com pequenas diferenças de gênero, número ou grau, indivíduos os mais retrógrados são apresentados ao grande público como progressistas e solidários com os pobres. Os meios de comunicação não só parecem crer neles, como adotam a maioria dos seus discursos, clichês e teses politicamente corretas. Exemplo perfeito disso está na freqüência com que encontramos hoje em dia, na mídia em geral, palavras de ordem contrárias às “desigualdades sociais” - expressão que vem a ser o carro-chefe do jargão socialista -, quando o normal seria que mantivessem o foco na luta contra a pobreza, esta sim a batalha importante a ser vencida.

Tal inversão de valores, evidentemente, não se deu por acaso. É conseqüência do fato insofismável de que a maior parte da mídia ocidental (muitas vezes sem nem mesmo se dar conta disso), está ou esteve sob forte influência, acadêmica ou sindical, dos círculos intelectuais marxistas, contrários, desde sempre, aos ideais de liberdade, individualidade, propriedade e, acima de tudo, prosperidade.

Nenhum comentário: