Recrudesce a 'Batalha de Roraima'
5/ago/08 (Alerta em Rede) - A proximidade da decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a forma de demarcação da reserva indígena Raposa Serra do Sol, em Roraima, a qual é esperada para breve, está acirrando os ânimos das forças políticas que apóiam a demarcação em área contínua estabelecida na Portaria 534/05, homologada pela Presidência da República em março de 2005. Tais forças são constituídas por setores do Governo Federal comprometidos com a agenda do aparato indigenista internacional, para os quais o assunto virou uma “questão de honra”, e a rede de organizações não-governamentais (ONGs) que representa aquele aparato no Brasil. O temor desse conglomerado de interesses é que qualquer eventual alteração do caráter contínuo da demarcação da reserva determinada pelo STF possa implicar no questionamento judicial da política de criação de mega-reservas indígenas (que já ocupam uma fração do território nacional superior à Região Sudeste), o que, por sua vez, colocaria em xeque toda a agenda voltada para a concessão de “autonomia” às comunidades indígenas e a consolidação do conceito de Estado “pluriétnico” no Brasil.
De fato, o desfecho da “Batalha de Roraima” será um dos fatores determinantes para definir a atitude do País como um Estado nacional dotado de soberania plena sobre o seu território e políticas públicas ou como uma entidade política com soberania "compartilhada" com tutelas e interesses externos – ou variantes do conceito eufemisticamente batizadas de "soberania efetiva" e "soberania responsável".
Com o mesmo entendimento, encontram-se do outro lado forças nacionalistas, tanto institucionais como privadas, cujas ações recentes têm provocado reações verdadeiramente histéricas dos círculos "indigenistas", dentro e fora do Governo. Na linha de frente do embate, as Forças Armadas deram o seu "recado" institucional por intermédio do general Augusto Heleno Ribeiro, Comandante Militar da Amazônia, que, em abril último, afirmou sem meias palavras que a política indigenista em vigor "está na contramão da sociedade, conduzida à luz de pessoas e ONGs estrangeiras" (O Estado de S. Paulo, 10/04/2008). Anteriormente, a recusa dos militares em proporcionar o apoio logístico requerido pela Polícia Federal para desalojar os não-indígenas da área da reserva Raposa Serra do Sol implicou no adiamento da operação por mais de um ano.
As atenções militares com a Amazônia se refletem em ações como a "Operação Poraquê", uma grande manobra conjunta do Exército, Marinha e Aeronáutica, entre os dias 5 e 15 de agosto, a qual inclui ações de assistência às populações locais (chamadas ACISO no jargão militar), nas regiões oeste de Roraima e no norte do Amazonas, na chamada Cabeça do Cachorro. A dimensão da operação pode ser percebida pelos efetivos mobilizados, com 3.500 homens, 45 aeronaves e a participação de unidades de elite, como a Brigada Pára-quedista e a Brigada de Operações Especiais do Exército, além de esquadrões de caças Mirage F-2000C e F-5M, os quais irão operar na Amazônia pela primeira vez.
Por sua vez, o posicionamento público das F.As. contra a debilitação progressiva da soberania territorial, induzida pela política ambiental-indigenista alinhada com interesses externos ao País, tem provocado reações torpes dentro do Governo Federal. Uma delas foi a audiência pública promovida na semana passada pelo ministro da Justiça, Tarso Genro, e o secretário nacional de Direitos Humanos, Paulo Vannuchi, para propor uma revisão ad hoc da Lei da Anistia, de modo a permitir eventuais punições a "agentes do Estado" que tenham cometido violações de direitos humanos durante o regime militar – que, como seria previsível, causou um enorme mal-estar na caserna. Mais do que uma mera atitude revanchista, a iniciativa do ministro deve ser vista como uma temerária tentativa de "revidar" as F.As. no tocante ao caso da Raposa Serra do Sol e minimizar os efeitos da posição pública dos militares sobre o a assunto.
Vale recordar que, em agosto de 2007, diante da recusa do comando militar em cooperar com a desocupação da área, uma manobra semelhante foi efetuada por Vannuchi, com a publicação do livro Direito à memória e à verdade, em um ato no Palácio do Planalto que se converteu num grande convescote para manifestações antimilitares.
Igualmente, em abril último, após a suspensão das operações da Polícia Federal na área da reserva pelo STF (iniciadas pela PF sem apoio militar), a Comissão de Anistia do Ministério da Justiça anunciou que o Governo Federal pediria desculpas formais à população da região do Araguaia, pelos atos cometidos pelos militares durante a repressão à Guerrilha do Araguaia, além de estender as indenizações da chamada Bolsa-Ditadura a residentes da região alegadamente maltratados pelos militares na época.
Na esfera civil, o Governo de Roraima e a Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) promoveram o I Seminário Nacional de Produtores Rurais e Desenvolvimento Sustentável em Áreas Fronteiriças, realizado em Boa Vista, em 4 de agosto. No evento, do qual também participaram lideranças indígenas roraimenses contrárias à demarcação contínua, foi divulgada a Carta de Roraima, que critica a demarcação de terras indígenas em áreas de fronteira e conclama uma política de desenvolvimento sustentável para a Amazônia.
Ademais, refletindo o entendimento da Procuradoria-Geral do Estado de Roraima, o documento afirma que o laudo antropológico que serviu de base para a Portaria 534/05 é "irreal, sem valor legal", com o que a demarcação contraria "direitos adquiridos sobre terras tradicionalmente ocupadas por não-índios".
Outro trecho da Carta afirma: "A soberania sobre a Amazônia brasileira deve ser exercida de forma efetiva, materializada num projeto de desenvolvimento sustentável que atenda aos interesses do Brasil e dos 25 milhões de brasileiros que habitam a região e a justificam como território pátrio, apesar da evidente ausência de poder e do vazio demográfico."
Outra iniciativa da sociedade é a "Marcha a Roraima", caravana que partirá de várias capitais e cidades amazônicas com destino a Pacaraima, onde deverá chegar em 15 de agosto. O município é um dos dois situados na área da Raposa Serra do Sol, cuja existência está ameaçada pela demarcação contínua. A caravana está sendo organizada pela Associação dos Proprietários Rurais do Rio Preto (APRUR), Sindicato Rural de Juína (MT), Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de Mato Grosso (FAMATO) e o Movimento de Solidariedade Ibero-americana (MSIa), esperando-se que seja recebida com uma grande manifestação cívica pela população de Roraima.
De forma sintomática, o aparato indigenista não poderia deixar de reagir a tal mobilização. Em 30 de julho, a Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (COIAB) divulgou uma agressiva nota contra a realização da "Marcha", utilizando termos que deixam implícita uma ameaça física contra os participantes da caravana (ver nota abaixo). O texto é auto-evidente:
Alertamos às autoridades do país sobre os riscos para segurança pública que representa uma manifestação de tal natureza, em data próxima à decisão do Supremo Tribunal Federal sobre a situação da Terra Indígena Raposa Serra do Sol. A COIAB estará ao lado dos povos indígenas de Roraima em mais esta luta para garantia e manutenção dos direitos estabelecidos pela Constituição Brasileira. "Lutaremos até o último índio se for preciso!"
Como a "Marcha" é uma iniciativa pacífica de cidadãos brasileiros ordeiros, respeitadores da lei e no pleno gozo do seu direito constitucional de ir e vir em todo o território nacional, a histérica agressividade da COIAB evidencia a inquietação dos círculos indigenistas com a crescente oposição à sua agenda antinacional e o iminente desfecho da "Batalha de Roraima".
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