sexta-feira, 17 de outubro de 2008

O suicídio da Águia V - A vitória da Perestroika

Mídia Sem Máscara

16 outubro 2008
Editorias - Comunismo, Cultura, Economia, Estados Unidos, Livre iniciativa, Política

“A crise financeira transcende a economia e afeta diretamente a ideologia, e este é o maior perigo que a humanidade enfrenta hoje”.
ARMANDO RIBAS

“O povo americano jamais adotará, conscientemente, o socialismo. Mas sob o nome de ‘liberalismo’ aceitará todos os pontos do programa socialista até que, um dia, a América será uma nação socialista sem ter noção do que aconteceu”.
NORMAN THOMAS
(Candidato permanente a Presidente pelo Partido Socialista Americano de 1932 a 1948)

Como escrevi no Eixo do Mal Latino-Americano e a Nova Ordem Mundial, a Perestroika – do russo re-estruturação – elaborada a partir de 1958, não se aplica, como foi amplamente propagandeado, a nenhuma mudança verdadeira no mundo comunista, mas exclusivamente à re-estruturação da visão que o Ocidente tinha do mundo comunista e conseqüente aceitação por parte do primeiro da necessidade de convergência – sblizhenie – dos dois sistemas num sistema híbrido. A aparência de mudanças pró-ocidentais na burocracia soviética tinha o objetivo de influenciar o Congresso Americano a introduzir mudanças reais na política dos EUA, no sentido de aumento de poder do Estado e diminuição paulatina do tradicional direito individual, um dos principais fundamentos daquele País, e da transformação da democracia em democratismo, a versão comunista baseada no ‘centralismo democrático’. Estas mudanças deveriam ocorrer em todos os setores: militar, cultural, educacional, legal, jurídico, diplomático e econômico. As farsas da ‘queda’ do muro de Berlim, em 89, e do ‘fim’ da URSS em 92 serviram para implementar a descrença no anti-comunismo no Ocidente e para aprofundar políticas que já existiam desde 58, como a re-estruturação da educação americana segundo os moldes soviéticos elaborados pela Academia de Ciências da URSS, o braço ‘intelectual’ do KGB (Brave New Schools, de Berit Kjos, Harvest House Publs., 1995).

Limitar-me-ei aqui a comentar as mudanças econômicas ocorridas na economia capitalista nas últimas décadas até a atual crise financeira desencadeada pela falência das hipotecas sub-prime. Pouco entendo de economia, mas a advertência de Armando Ribas, em epígrafe, está ligada ao que pretendo tratar: as conseqüências da ideologia no Ocidente. Pacotes como o aprovado pelo Congresso Americano significam o fim ou salvação do capitalismo? Mesmo os economistas liberais que considero meus guias no assunto, divergem. É claro que, como aponta Ribas, as medidas são bastante diferentes das tomadas pelo governo nitidamente socialista de Roosevelt, na década de 30. Mas as mudanças introduzidas a partir de 58 não são nítidas, porém marcadas pela hipocrisia e dissimulação próprias da Perestroika (The Perestroika Deception, Anatoliy Golitsyn, Edward Harle, 1990).

Elas incluem as propostas de ‘responsabilidade social’ das empresas, a defesa dos ‘direitos do consumidor’ e, hoje em dia, as causas favoritas são ‘proteção ambiental, saúde dos empregados, modificações climáticas, desenvolvimento comunitário, estímulo (não apenas obediência à lei) à regulamentação estatal e apoio às políticas públicas sobre a medicina, a cultura e a educação’ (Henry G. Manne, Milton Friedman Was Right: “Corporate social responsibility” is bunk). Assim também ocorreu com a socialização da medicina (Medicare) disfarçada de ‘seguros-saúde’, cada vez mais controlados pelo Estado. Prossegue Manne: “negócios de larga escala bem sucedidos e que resultam de companhias (totalmente ou parcialmente) públicas, misteriosamente modificam a natureza de inúmeros investimentos privados em bens de interesse público. E quando estas enormes empresas são ‘afetadas pelo interesse público’ elas passam a ser regulamentadas pelo Estado ou a agir como se fossem propriedade pública, na verdade, passam a ser parte do Estado”. Aumentam exponencialmente as demandas de regulamentação estatal e “qualquer grande empresa, não interessando seu grau de competitividade e seu sucesso em satisfazer as verdadeiras demandas dos consumidores, passam a ter responsabilidade social – termo que significa uma zombaria da idéia de responsabilidade individual – e fica obrigada a usar parte de seus recursos para finalidades ‘públicas”’. Como disse Milton Friedman: “todos os esforços em usar recursos empresariais para propósitos altruístas equivalem a socialismo”.

É este o caso dos simulacros das empresas Fanny Mae e Freddie Mac. A primeira, apelido de Federal National Mortgage Association (FNMA), fundada em 1938 durante a Depressão, foi considerada como uma ‘government sponsored enterprise’ (GSE) por Decreto do Congresso de 1968. A função das GSEs é incrementar o fluxo de crédito para determinados setores da economia e reduzir os custos dos créditos para setores seleciomados pelo Estado, principalmente agricultura, financiamento de casa própria e educação. Fanny Mae atua no ‘mercado secundário de hipotecas’ facilitando a liquidez do mercado primário e garantindo as mesmas para instituições que emprestam diretamente aos consumidores. Freddie Mac é o apelido de Federal Home Loan Mortgage Corporation (FHLMC) e também é uma GSE fundada em 1970 com o mesmo objetivo. Em 7 de setembro de 2008, o Diretor da Agência Nacional de Financiamento Habitacional (FHFA), James B. Lockhart III anunciou, com pleno apoio do Secretário Tesouro Henry Paulson e do Diretor do FED Ben Bernanke, que ambas tinham sido colocadas sob a proteção do Tesouro Nacional, no que foi considerado uma das mais abrangentes intervenções governamentais no mercado nas últimas décadas. Paulson declarou explicitamente que “esta era a única forma pela qual ele usaria o dinheiro dos contribuintes (taxpayers) para as GSEs”, contrariando a opinião dos que defendem a medida e insistem em negar que os contribuintes é que vão pagar a conta.

Note-se a imensa hipocrisia dos apelidos, fazendo crer que qualquer americano comum, Fanny ou Freddie, poderá ter sua casa própria (a GSE da Educação, hoje totalmente privatizada, chama-se Sallie Mae). Se atentarmos para as datas acima (1938, Roosevelt; 1968, Johnson; e 1970, Nixon), veremos que elas se referem a dois governos Democratas e um Republicano, porém num período de grande turbulência econômica e inflação que acabou no abandono do padrão ouro um ano depois. No governo Carter (Democrata) em 1977 foi criado um decreto federal que obrigava os bancos a fazerem empréstimos aos cidadãos sem capacidade de honrar suas dívidas. Como disse Nivaldo Cordeiro “a origem da crise está na irresponsabilidade estatal dos EUA de obrigar o sistema bancário a emprestar para compra da casa própria, em nome do ‘social’, a pessoas que não teriam meios de honrar os pagamentos” e deve ser debitada aos dois Partidos, porém, mais aos programas ‘sociais’ do Democrata (‘grande sociedade’, casa para todos, sociedade ‘solidária’, ‘nenhuma criança fora da escola’, etc.). “O governo, ainda uma vez, tentou driblar a lei da escassez, querendo dar casa para todos, ainda que ao preço de se construir uma crise financeira sistêmica”. Como entender em termos simples o que aconteceu?

Ler Adam Smith é muito difícil. É uma leitura muito chata e detalhista. Duvido que 90% dos economistas tenham lido, inclusive os que se denominam liberais. E estou sendo otimista! Confesso que tentei e não consegui. Mas o pouco que li diretamente e o muito de comentários abalizados me deixaram a impressão de que Smith falava simples assim como Friedman e Ronald Reagan, até um analfabeto em economia consegue entender muito bem. Nada a ver com os tratados de economia modernos que, igual aos livros de direito e de psicanálise, são feitos para ninguém entender mesmo. Não sei nem especulo sobre o que eles diriam, mas baseado na simplicidade que percebi neles, o que aconteceu nos Estados Unidos foi o seguinte, baseado numa situação hipotética.

Um vizinho que troca de carro importado de luxo todos os anos e tem inúmeros empregados é um notório caloteiro que quer viver acima de suas posses. De tantos calotes perdeu o crédito. É um sub-prime. Pede dinheiro a mim que tenho uma vida mais simples, porém sem dívidas e nunca passei calote em ninguém. Certamente não seria do meu feitio emprestar mas imaginemos que eu enganasse a mim mesmo dizendo que devo emprestar porque seus filhos estão passando fome – ‘justiça social’ - mas na verdade se eu antevisse a chance de ganhar muita grana emprestando a juros muito acima do mercado. O cara troca de carro, reforma a casa, os filhos continuam com fome e me passa o previsível calote. Que faço eu? Ora, é claro, cobro do condomínio o prejuízo! Chantageio os síndico ameaçando não pagar mais as taxas e criar uma ‘crise sistêmica’.

É claro que numa reunião de condomínio ninguém seria idiota de aceitar pagar sem ter responsabilidade nenhuma. Mas o que fazer num país com 300 milhões de habitantes? Perguntar a cada um se quer despender $2,300.00 de seu bolso para pagar a safadeza dos outros? Como não dá, os representantes (sic) do povo decidem tungar cada americano daquela quantia porque sabem que isto lhes confere mais poder do que o enorme que já têm. Enquanto Big Business quer cada vez mais dinheiro, o Big Government quer cada vez mais poder. E o fazem alegando o tal argumento ‘justiça social’ – casa para os mais pobres, etc. - sabendo que com isto já estão preparando novas ‘bolhas de prosperidade’ (meu vizinho com carros importados e dando mais calotes) e que a história se repetirá ainda diversas vezes, como previu Hans Baden. Uma das óbvias diferenças da situação condominial é que os emprestadores são financeiras dirigidas por executivos com salários de cinco ou seis dígitos e que se aproveitaram da ‘bolha de prosperidade’ para se locupletarem.

E por que as bolhas se repetirão? Porque, como diz Ubiratan Iorio, a ajuda ‘equivale a dar cachaça para alcoólatras ou açúcar para diabéticos’, quer dizer, só estimula os impulsos suicidas do ‘paciente’. Os caloteiros ficam cada vez mais caloteiros, o Big Business cada vez mais rico, o Big Government cada vez mais forte e a população cada vez mais descrente no que Alain Peyrefitte chamou de sociedade de confiança (A Sociedade de Confiança – Ensaio sobre a Origem e a Natureza do Desenvolvimento, Topbooks, 1999). Deteriora-se a base mais sólida de um país livre e com economia liberal e forte, e a população passa a valorizar mais aquilo que aqui no Brasil conhecemos muito bem como malandragem, quer dizer, mau-caratismo explícito, pois nenhum dos especuladores vai para a cadeia; pelo contrário, locupletam-se mais ainda.

Embora a crise não signifique a falência do capitalismo mas a interferência socialista indevida no mercado financeiro, fabrica-se, a partir dela, uma das ‘contradições do capitalismo’ como Marx previra. Não há esta contradição interna do capitalismo; o que há é uma contradição entre capitalismo e socialismo, cujos defensores que a provocam se aproveitam dela para brindar ao ‘fim do capitalismo’. E aí surge Barack Obama, cuja conexão com a re-estruturação do pensamento ocidental e objetivos finais serão estudados a seguir.

Nenhum comentário: