Mídia Sem Máscara
20 outubro 2008
Editorias - Política
A boa política e a qualificação da democracia envolvem os membros das sociedades que a elas aderem num compromisso tácito com a busca sincera da verdade. Mentira e falsidade fazem mal a tudo, inclusive à democracia e à política. Quando os povos renunciam à violência como mecanismo de solução dos conflitos e se erguem sobre novos degraus na escada da civilização, passam a aceitar as regras de convivência que se vão estabelecendo pela via democrática. O modo segundo o qual isso ocorre deve muito à capacidade de falar. É através da fala que se processa o debate e a deliberação. E é através do debate que a humanidade, ao longo dos séculos, estabelece seus sensos e busca seus consensos.
Eis por que resulta impossível debater com pessoas mentirosas. Mentir é fácil e rápido. Desmascarar a mentira e restabelecer a verdade é difícil e demorado. É por isso que os mestres sofistas foram tão bem sucedidos. A eles apenas interessava vencer o debate, mesmo sem ter razão. E essa técnica – a erística – era valiosa, granjeando riqueza e poder àqueles que a dominavam.
Décadas de experiência em debates sobre temas políticos e ideológicos em jornal, rádio e tevê ensinaram-me a identificar as artes e manhas dos sofistas e dos mentirosos. Trata-se de um exercício mental divertido identificar a artimanha e constatar que se está perante um indivíduo despido de qualquer compromisso com a verdade. É uma espécie de striptease da feiúra, um encontro com a ridícula nudez de quem se oferece como padrão de beleza.
O Reinaldo Azevedo, por exemplo, fez esse exercício ao encontrar, no site da CUT, matéria sobre os entrechoques policiais em São Paulo e Porto Alegre. O jornalista observou que o site da CUT, ao abordar confrontos ocorridos em duas capitais onde o PT disputa eleições no segundo turno, acusava os governos “tucanos”. Feito o striptease da matéria, fica evidente não se tratar de conteúdo sindical, mas de texto com objetivos político-partidários. O sindicalista acusaria a instituição patronal “governo”, ou o patrão “governador”. Nunca o partido de um e de outro.
Eu faço meu próprio exercício, aqui, ao abordar o episódio ocorrido na frente do Palácio Piratini. Qualquer pessoa que tenha um mínimo registro de memória sobre os discursos dos dirigentes dos movimentos sociais e sindicais lembrará que: a) quando tratam de defender suas mobilizações contra quem reclama da ocupação dos espaços públicos, eles invocam o próprio “direito de ir e vir” b) quando bloqueiam uma rua contra o direito de ir e vir dos demais, eles invocam o seu “direito de manifestação” c) quando a autoridade pública interdita determinadas áreas ao seu direito de manifestação eles invocam o “direito de protestar” e e) quando afrontam a lei e a autoridade para invadir, destruir, apedrejar, eles invocam o seu direito de transgredir porque “sem transgressão, os reclamos populares não avançam”.
Ou seja, eles sempre encontram uma forma de justificar o que fazem contra a lei, a ordem e o direito dos demais. No entanto, quem não tem compromisso com a verdade, quem não reconhece os direitos alheios e quem mente para convencer, é, antes de tudo, mau caráter.
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