Mídia Sem Máscara
Klauber Cristofen Pires | 21 Maio 2011
Artigos - Direito
Controle social é controle "da" sociedade, não controle "pela" sociedade. Este futuro órgão, se vier a ter existência, arrostar-se-á a acabar de vez com qualquer resquício de autonomia estadual e municipal.
Prezados leitores,
Todos os dias questiono a mim mesmo sobre o meu tempo que estou sacrificando a escrever para um número de leitores que é muito valoroso, inteligente e até mesmo exigente, mas que no cronômetro do jogo, ainda é muito pequeno. Entretanto, quando olho para a minha filha e penso no horror dos que vivem em Cuba, e agora na Venezuela, Bolívia, e outros países sul-americanos, sinto lá dentro de mim que não há mais nada no mundo que valha a pena a fazer. Quem sabe eu consiga inspirar alguém - sim, que seja uma só pessoa - mais talentosa, esforçada ou "popular" que compre a idéia de que temos de retroceder neste caminho rumo a um estado totalitarista e faça a hélice da liberdade girar.
Poucas coisas ainda me surpreendem, dado o rumo que conheço estar tomando o nosso país, mas nem por isto deixam de me entristecer. A cada dia, brotam do solo muito mais órgãos, decretos e portarias do que grãos e frutos. A cada dia, vamos deixando de viver os nossos projetos e concepções de vida, para nos submetermos ao que o estado gigantesco nos impõe. Nós não estamos vivendo mais as nossas vidas, mas a vida do estado. E como há poucos que se dão conta disto!
A nova onda do imperador, sabem qual é? Chama-se "controle social do fisco"! Sim! E sabe de quem partiu esta idéia magnífica? Dos próprios servidores dos diversos órgãos fiscais do país, representados por seus respectivos sindicatos, desde o federal aos estaduais e quiçá, alguns municipais. Acredite se quiser, mas há quem diga - desde dentro destas instituições de arrecadação - que é necessário que exista uma instituição estatal que zele pelos interesses dos cidadãos e combata os excessos daqueles mesmos que propõem a sua criação. Bizarro? Sei lá...
O que sei é que nenhum conselho estatal do que quer que fosse eu vi dar certo e zelar com maior eficiência o patrimônio da sociedade do que ela mesma por seus próprios meios. Por exemplo, no Sistema FGTS, um Conselho Curador decide onde serão investidos os recursos deste fundo, que nos últimos 20 anos tem se provado como o mais do que pior investimento que um cidadão particular poderia fazer por conta própria. E isto acontece porque uns poucos sabichões passam a decidir sobre o dinheiro de cada uma de todas as outras pessoas. Caso elas pudessem por si mesmas fazer suas aplicações, elas poderiam se juntar em clubes de investimentos, e aplicar este dinheiro em necessidades da sociedade mais urgentes e rentáveis, de acordo com tendências reais do mercado, e não de acordo com políticas públicas pré-estipuladas á margem da realidade e da razão. Além disso, mesmo quando não fossem tão felizes, poderiam ao menos trocar de agentes e de bancos, o que não é possível fazer com um grupo cujos participantes elas não escolheram e sobre cujas decisões elas não podem dar nenhum voto ou veto.
No meio jornalístico, o governo passado - cujo partido ainda está no poder - tentou várias vezes emplacar o que denomina de "controle social da mídia", termo pomposo e até à primeira vista democrático mas que encerra em sua novilíngua (leiam Orwel, 1984) tão somente a vontade tirânica de manipular de um órgão que represente (e substitua) a verdadeira liberdade de expressão - esta que eu mesmo faço uso neste momento para vos dirigir estas palavras -, para em seu lugar impor uma censura mais severa até do que se viu nos regimes totalitários do Século XX.
E quanto aos tais "orçamentos participativos"? Por acaso, alguém algum dia recebeu uma convocação do TRE para comparecer às urnas munido de sua cédula eleitoral para votar em algum projeto municipal de forma amplamente participativa? A verdade é que sempre estas assembléias já traziam as coisas decididas para serem tão somente chanceladas por um público militante emocionalmente excitado a aprová-las.
Em uma sociedade madura, o controle social, e vejam bem, de qualquer coisa e não somente para efeitos tributários, dispensa órgãos de tutela e ainda mais, arrepia-se só de ouvir falar de tais instituições.
Em uma sociedade livre e responsável, o "controle social" é exercido pela vigilância difusa dos homens e mulheres egrégios, pelos grandes formadores de opinião, pelos institutos de pesquisa, pelos "think-tanks", pelas organizações não-governamentais voltadas para a transparência e gasto públicos, pelo jornalismo livre a ativo, e por que não dizer, pelos partidos políticos. Até mesmo por um ilustre qualquer um, como um Francenildo!
Iludem-se os que defendem um órgão de controle externo do fisco por visualizarem aí uma composição paritária e legitimamente representativa da sociedade: mesmo que nascesse com as suas cadeiras preenchidas pelos anjos mais celestiais da Bíblia, em pouco tempo o governo já os teria todos em suas mãos. Na melhor e mais esperável das hipóteses, um tal "conselho" seria formado por representantes de empresários, do governo, de algumas ong's de contribuintes e por servidores de carreira dos órgãos fiscais. A presidência, claro, ficaria com o governo, como são todas as composições semelhantes. Os representantes dos empresários seriam os que já vivem e convivem nas comitivas do Air Force 51; composto de uma gente que não se importa com o alto índice da carga tributária nem com a prolixa burocracia pelo só fato de que justamente se beneficia delas, sob um processo que já denominei há tempo de "dumping tributário-administrativo". ONG's? São os maiores chupa-cabras de tão ilustre elenco. Como se vê, sobram apenas os servidores fiscais a defender a nação por seu indubitável patriotismo e senso de dever.
O significado do termo "controle social" não é o de exercer um controle pelo povo, mas sobre o povo. Controle social é controle "da" sociedade, não controle "pela" sociedade. Este futuro órgão, se vier a ter existência, arrostar-se-á a acabar de vez com qualquer resquício de autonomia estadual e municipal, bem como marginalizará toda e qualquer opinião alheia da sociedade, ao avocar para si a legitimidade para substituí-la a pretexto de "representá-la".
Sei que no momento em que faço esta crítica estou a contrariar as estratégias do sindicato do qual faço parte como associado, e que visam conquistas de outras naturezas, mas não tenho como aceitar fazer parte desta empreitada por entender que nem todos os meios são válidos para alcançar-se um objetivo qualquer. Toda ação que deseje ser permanentemente bem-sucedida e gozar de boa reputação deve buscar o bem nos princípios, nos meios e nos fins. Eu não pretendo delegar mais poder ao estado sob nenhum pretexto, nem retirá-lo da geração seguinte. Prefiro ser um frentista de um posto de gasolina num país livre e próspero do que mais um burocrata com uma estrela no peito para dizer sim a tudo o que o estado total me dita.
Se a vida vale a pena ser vivida, devo vivê-la eu, e não o estado.
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