Mídia Sem Máscara
| 09 Maio 2011
Artigos - Cultura
O que é a modernidade? Numa definição curta e exata a modernidade é a negação de Deus. Ela tenta, em tudo e por tudo, matar a Revelação, conspurcar as coisas tidas como sagradas e negar a verdade.
Eu vi Satã cair do céu como um relâmpago.
Lucas 10, 18
O que transforma a obra FAUSTO, de Goethe, em um monumento imorredouro não é apenas a grandiosidade de sua construção e a beleza de seus versos. Nem mesmo o seu tema. George Satayana o classificou como um poema filosófico, ao lado dos poemas de Dante e de Lucrécio. É esse caráter filosófico que lhe eleva acima do seu tempo, mas não apenas. A genialidade de Goethe lhe permitiu fazer a síntese de uma era - os tempos modernos ou a modernidade - e registrar para a posteridade de forma ornamental essa fotografia histórica. O poema é também uma crônica extraordinária. É preciso olhar a história da filosofia para se dar conta da grandiosidade de Goethe. O Ocidente sofreu uma inflexão filosófica no assim chamado Renascimento, que ocorreu no período que medeia o século XIII e o século XVII. Nesse intervalo a hegemonia do pensamento cristão na Europa ocidental sucumbiu. A filosofia que teve origem em Sócrates, Platão e Aristóteles é questionada e, depois, abandonada. A teologia, que colocava Deus no centro da Criação e o homem como coisa criada, Deus como ser e o homem como ser dele dependente, é jogada no lixo. Descartes, como bem ensinou João Paulo II no livro MEMÓRIA E IDENTIDADE, é o autor final desse processo, que se inicia com os nominalistas. Emerge triunfante o humanismo renascentista, que refaz tudo e recupera de novo o lema de Protágoras: o homem é a medida de todas as coisas.
A trinca de filósofos clássica e seus seguidores cristãos, especialmente São Tomás de Aquino, é abandonada, dando lugar à herança de Epicuro e Zenon e dos seguidores que lhe sucederam desde a antiguidade, como Cícero. Foi uma grande revolução no sentido exato da expressão. Os homens renascentistas talvez não tivessem a exata dimensão espiritual e filosófica do que faziam, mas fizeram. Tudo que era sagrado foi conspurcado, tudo que era sólido desmanchou no ar. No plano teológico o mal se introduziu como força motora da história, o mal derivado do pecado no sentido exato como entendido por Santo Agostinho: "Amor de si mesmo até o desprezo de Deus", como escreveu na Cidade de Deus.
O mal, como força personificada operante, a Igreja Católica sempre o chamou pelo nome bíblico: Satã e suas legiões. Os cristãos sempre souberam que o homem sozinho não tem como lutar contra essa força poderosa, que ousou confrontar o próprio Deus. A rejeição do auxílio divino contra essa força é o famoso pecado contra o Espírito Santo, ao qual não cabe redenção. Foi o que se deu no Renascimento. E o Ocidente cristão, cujas idéias depois se espalharam por todo o mundo, foi além. FAUSTO é o canto supremo desse momento, quando ainda a humanidade tinha ao menos consciência do seu mergulho na Negação. Goethe versificou sobre esse espírito que vagava sobre a terra e que encontrou em filósofos como Descartes, Rousseau, Kant, Hegel e Marx seus agentes criadores.
O "Penso, logo existo", a máxima de Descartes, deslocou o tema da filosofia do ser para o aspecto particular das habilidades humanas, o pensar; ao fazê-lo, rompeu com a necessidade de se refletir sobre o ser, ou seja, Deus ele mesmo. O pensamento humano tornou-se o lócus da criação e o homem como o autor dessa criação. Fausto e Mefistófeles narram nas suas aventuras esse momento crucial em que o intelectual - provavelmente modelado na figura do próprio Descartes ou alguém equivalente - entediado diante da criação, invoca o Espírito de Negação para transformar o mundo ao seu talante. A dialética hegeliana e, depois, a marxista, dá foro filosófico e teológico a esse princípio de que a negação é o motor da história e o homem é o elemento que permite a síntese criadora.
Essa filosofia dará origem a todas as ideologias - entendidas como substitutas do real e explicações fantásticas da realidade, ou a Segunda Realidade - que virão nos século subseqüentes. Nazismo, marxismo, abortismo e gayzismo são todas variações desse tema, e enquanto ideologias, foram colocadas no mesmo patamar destrutivo por João Paulo II.
Goethe levou sessenta anos para escrever o poema e é possível notar que, nos momentos iniciais, ele foi mais entusiasta com a suposta capacidade criativa do mal. O Urfaust e, depois, o Fausto I, são documentos de vigorosa adesão às teses de que o mal é capaz de criar e ajudar ao homem. Goethe ele mesmo aderiu a um naturalismo radical tomado da filosofia de Spinoza - uma forma panteísta que via na matéria a própria emanação da divindade - e, com ela, suportando essa visão dualista de cunho teológico. Goethe abraça o maniqueísmo. Seu poema inicial é um cântico a ele. Ao final, no Fausto II, o fecho do mesmo na véspera de sua morte revela que alguma coisa mudou no seu modo de pensar, vindo Goethe a colorir os versos derradeiros com ícones do catolicismo. Mesmo assim o poema continuou a ser uma peça maniqueísta.
A influência de Goethe na literatura foi profunda, pois deu voz às idéias dominantes do seu tempo, que são as idéias dominantes até os dias de hoje. Nenhum grande autor escapou à influência magnética de Goethe. Ao cantar o Microcosmo não pensou que seu símbolo estaria, tempos depois, inserido em todos os lugares, em todas as bandeiras, em todas as nações. O pentagrama é o estandarte do mal metafísico que se propôs substituir o próprio símbolo da cruz. Desde o Renascimento ele tem ganhado a batalha iconográfica. É uma maneira de as gerações sucessivas desde então reafirmarem sua rebelião contra Deus.
O que é a modernidade? Numa definição curta e exata a modernidade é a negação de Deus. Ela tenta, em tudo e por tudo, matar a Revelação, conspurcar as coisas tidas como sagradas e negar a verdade. A recente decisão do Supremo Tribunal Federal - STF sobre a união de pessoas do mesmo sexo é um dos triunfos maiúsculos da modernidade entre nós, brasileiros. O mesmo pode ser dito, no âmbito do Poder Judiciário, do banimento dos crucifixos das repartições públicas, gesto repetido na primeira hora por Dilma Rousseff, quando assumiu o poder. Não devemos esquecer que o Microcosmo está estampado no próprio Escudo da República e é símbolo do poder de Estado. Vê-se que as ondas de propagação da modernidade e de Goethe, seu grande cantor, continuam vigorosas. Não por acaso Lula mandou desenhar o símbolo do Microcosmo nos jardins do palácio presidencial.
É preciso lembrar que o FAUSTO antecipa o que viria a ser o nazismo e o comunismo. Goethe o apresenta como o Demônio do Norte. Fausto fará suas núpcias com Helena, a deusa Vênus ela mesma, a representação feminina do mal, ajudado por generais oriundos de cada uma das tribos germânicas. Nesse momento do poema afirma-se a superioridade do germanismo, tão em voga nos tempos de vida de Goethe, e a mentira nele embutida, a de que o germanismo é uma cultura superior a todas as outras. Goethe liga o glorioso passado grego ao presente germânico, ignorando Roma e o cristianismo. Esse foi o passo essencial para que no século XX o personagem Eufórion encarnasse na figura de Hitler. A alucinação mais delirante da mente doentia dos modernos entrou com força na história e deixou o seu rastro de morte. Hitler foi a sua representação.
As ideologias de morte mudam de forma, mas não desistem de seu intento. Por isso ler e compreender FAUSTO, de Goethe, é essencial para que se compreenda o que se passa. O mal opera no cotidiano e está à porta de cada um. Sem perceber o que se passa é impossível buscar o único refúgio capaz de fazer frente ao mal: a tradição. Nas Escrituras estão as profecias e o registro de tudo que se passou e que vai passar. A grande mentira do Maligno é fazer com que as pessoas pensem que ele não existe e que está inerte. Ler os jornais do dia sob a luz de Goethe vai mostrar o quanto essa mentira é grotesca, como o mal é grotesco.
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