por Carlos I.S. Azambuja em 19 de abril de 2008
Resumo: Em vez de escravo de um senhor, no socialismo o trabalhador – e é aqui que está a grande diferença – é transformado em escravo da sociedade.
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A prática do socialismo demonstrou o quanto Bakunin estava certo em sua crítica. A burocracia soviética jamais pôde ser contestada por ninguém, pois era um fato. Esta foi a realidade do socialismo real e, para um materialista, o alfa e o ômega da teoria são o axioma de que é na prática que se deve comprovar a veracidade das idéias. Parece que Marx jamais existiu, pois o socialismo real foi filantrópico, reformista, utópico, voluntarista, idealista, de mercado; a materialidade foi posta de lado para que se fixasse a atenção apenas nos valores morais. A realidade assustou os socialistas no mundo ocidental e eles foram capazes de tolerar tudo em termos conceituais, menos o socialismo real, e o mais grave é que sempre se disseram marxistas.
A prática demonstrou que ao se acabar com a propriedade privada dos fatores econômicos, o que se seguiu foi o mundo concentracionário do gulag, o Estado totalitário, a burocracia como nova classe dirigente. Diante dessa realidade, os marxistas ficaram namorando as idéias-força do anarquismo e do liberalismo, mas mantiveram as premissas das quais resultou o que eles próprios, um dia, passaram a rejeitar. É uma verdadeira salada mista composta de marxismo, liberalismo e anarquismo.
O socialismo real nada mais foi do que uma economia industrializada, planificada, centralizada e gerida por um órgão que dizia falar em nome da coisa pública.
A idéia fundamental de Marx era acabar de uma vez por todas com a economia de mercado e, para isso, era necessário tornar de propriedade pública todos os fatores econômicos para que eles pudessem ser articulados de uma forma puramente racional, e diretamente, sem nenhuma fetichização. Para ele, o ponto máximo do socialismo seria atingido precisamente quando a política fosse substituída pela administração das coisas e pela direção do processo produtivo. Mas, para atingir esse ponto, todos os fatores da produção deveriam estar inteiramente à disposição da comissão planificadora. Não só os fatores materiais como também os humanos: a força de trabalho.
Quando se fala em socialização dos fatores produtivos, trata-se de todos, incluindo a mão-de-obra. De que adianta a sociedade ser proprietária dos fatores materiais de produção se a força de trabalho continuar sendo propriedade privada? Aliás, lembra Trotsky: “o capitalismo se caracteriza especificamente pela existência do trabalho livre e da propriedade privada da força de trabalho”. No socialismo, ao contrário, o trabalho não é uma liberdade e nem um direito, mas um dever.
Quando um burguês é expropriado de seu capital ele perde coisas, mas quando a revolução socializa a força de trabalho, como esta não pode ser separada da pessoa do trabalhador, junto com a propriedade da força de trabalho vai também a pessoa do trabalhador. Alguém cuja força de trabalho não lhe pertence é o quê? Em vez de escravo de um senhor, no socialismo o trabalhador – e é aqui que está a grande diferença – é transformado em escravo da sociedade.
Na prática, o trabalhador continua sendo explorado, com a diferença de que num modo de produção seu trabalho excedente se transforma em mais riqueza para o burguês, e no outro modo em mais poder para o sistema administrativo. O povo que exerce o poder não é o mesmo sobre o qual ele é exercido.
No socialismo, podemos esperar que o proletariado em si (o governado) seja capaz de impedir o proletariado para si (o que governa) de abusar do poder, freando o mais poder no seu processo de acumulação e sua reprodução ampliada, bloqueando o domínio total da Comissão do Plano ao afirmar sua condição de proprietário privado.
Em toda a história do socialismo real, isso foi impossível de realizar.
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