Segunda-feira, 15 de Dezembro de 2008
Blog do Clausewitz
O calote de Itaipu
"O presidente Fernando Lugo, do Paraguai, não é, à diferença dos presidentes Evo Morales, da Bolívia, e Rafael Correa, do Equador, um títere do caudilho venezuelano Hugo Chávez. "A construção de nossa democracia não tem nem terá a supervisão ou a tutela de nenhum país do mundo", disse essa semana, em resposta a insinuações de que estaria atrelado a Chávez. Mas Fernando Lugo é um líder populista que se elegeu prometendo acabar com a corrupção sexagenária do Partido Colorado e unir a nação, dividida por profundas desigualdades econômicas e sociais. Diz e repete que, para alcançar esse último objetivo, não promoverá a luta de classes, como têm feito os seus vizinhos bolivarianos. Mas não hesita, desde que se candidatou, em promover a união nacional em torno da denúncia da dívida externa "espúria" e da renegociação do Tratado de Itaipu. E nisso se identifica amplamente com seus vizinhos bolivarianos.
Essa semana, o engenheiro Ricardo Canese, coordenador da comissão negociadora das reivindicações paraguaias, apresentou a sua versão da revisão do Tratado de Itaipu, baseada em seis pontos. Os dois pontos principais são inaceitáveis para o Brasil e provocaram a reação imediata do chanceler Celso Amorim, que classificou as reivindicações paraguaias como "demandas irrealistas".
O funcionário paraguaio propôs, em nome de seu governo, a extinção da dívida contraída pela Itaipu Binacional para financiar a construção da usina, hoje em torno de US$ 19,6 bilhões. Como o Paraguai não dispunha de recursos para o financiamento dos 50% do custo da obra que lhe competiam, o governo brasileiro arcou com todas as despesas. O ressarcimento se faz com parte do produto da venda compulsória para o Brasil da energia produzida por Itaipu que não é consumida pelo Paraguai. Entra aí o segundo ponto fundamental da proposta apresentada por Canese: acaba o mercado cativo e o Paraguai poderá vender o seu excedente de energia no mercado livre, para quem quiser. Para o Brasil, isso significaria que o financiamento de Itaipu não mais teria garantias reais e firmes.
Mas o mais ominoso é que a dívida da Itaipu Binacional, de US$ 19,6 bilhões, seria transferida para os Tesouros do Brasil e do Paraguai, segundo uma fórmula extremamente criativa. Por ela, o Tesouro brasileiro arcaria com US$ 19 bilhões e o paraguaio, com US$ 600 milhões, sendo esse cálculo baseado no consumo de energia dos dois países - 97% pelo Brasil e 3% pelo Paraguai.
Trata-se, como se vê, de uma versão guarani do calote que o presidente do Equador tenta aplicar no BNDES: o país devedor fica com uma usina hidrelétrica - no caso de Itaipu, com 50% - a leite de pato.
Quando o presidente Evo Morales expropriou as instalações da Petrobrás na Bolívia, advertimos que outros líderes populistas, pela leniência com que o governo Lula aceitou o esbulho, se sentiriam estimulados a repetir a dose. No caso do Equador, o Itamaraty reagiu à altura - mas não a tempo de evitar que a moda pegasse. O fato é que o Brasil está sendo tratado por esses líderes populistas - com quem o presidente Lula julgou ter afinidades políticas - como uma vítima fácil de calotes.
Não por outro motivo, o engenheiro Ricardo Canese citou, como argumento favorável para a aceitação por Brasília de sua proposta, "o fato de que o Brasil quer liderar a região em matéria de integração energética e para isso terá de optar por uma liderança que atenda aos interesses dos países menos desenvolvidos, a não ser que esteja disposto a pagar os custos políticos de uma liderança do tipo opressivo".
Escaldado pela experiência da Bolívia e do Equador, desta vez o chanceler Celso Amorim reagiu antes mesmo de tomar conhecimento oficial da proposta paraguaia. Ele foi taxativo: "Não, essa proposta não pode ser aceita. O Brasil não aceita o argumento do Paraguai de que a dívida de Itaipu é espúria nem concorda com a definição de que a venda da energia de Itaipu a terceiros países é uma questão de soberania do Paraguai." E completou, afirmando que "em primeiro lugar vem o interesse brasileiro e, em segundo lugar, o interesse brasileiro".
Na próxima terça-feira, na reunião de cúpula da Costa do Sauípe, o presidente Fernando Lugo deve apresentar a proposta ao presidente Lula. Esperamos que receba uma resposta negativa e peremptória."
Fonte: Estadão
Alguns comentários meus:
1º- Há que se entender que Lula não quer se indispor com os vizinhos protegidos e caloteiros, por vários motivos, sendo o principal a existência do foro de São Paulo, que é um organismo vivo e que tem por objetivo a agregação de toda a América Latina em torno do ideal esquerdóide-socialóide-comunistóide...
2º- Das seis cláusulas pedidas por Fernando Lugano, digo, Lugo, tenhamos nós, pobres pagadores de dízimos, taxas, tributos, tarifas e outros mimos estatais, que todos serão acolhidos, por mais que Celso Amorim tenha feito uma teatral cara de espanto e de insatisfação...
3º- O que Celso Amorim esqueceu de complementar em seu decálogo, melhor, em seu triálogo de agravo ao instrumento reivindicatório paraguaio, é que em primeiro lugar o interesse do Brasil, segundo o do Brasil e terceiro, o do Brasil... como o Brasil é fundador do foro, os três mandamentos da boa convivência brasiguaia se resumirão a um, que valha pelos interesses do Paraguai...
4º- Não estou sendo fatalista, muito menos leviano... é que já vimos essa história se repetir tantas vezes desde que os insurgentes protegidos declararam sua rebeldia, que não vejo outro destino para nós, do que assimilarmos outro calote... desta feita, energético...
5º- A chantagem do engenheiro representante do governo paraguaio só confirma que é dá ou desce, ou seja, em função de uma imposição de liderança externa, Lula ver-se-á obrigado a aceitar o trambique... obrigado nem tanto, visto que sua dinâmica é a de proteção do público externo, em desfavor do público interno que não aguenta pagar mais imposto e ver suas provisões se esvaírem pela porta dos fundos...
6º e último- Se tivéssemos oposição que exigisse explicações eu estaria menos intranquilo, mas não a temos, da mesma forma que não temos imprensa, salvo raras e honrosas exceções que discutem o problemas que são inerentes à nossa população... mas se não temos esses dois gerentes da insatisfação popular, não nos falta a indignação pelo promíscuo engendramento da política diplomática brasileira no meio desse ambiente tão hostil e tão desprezível quanto é o conchavo da tomada do poder pelas esquerdas continentais, nas quais o Brasil incontestavelmente exerce o papel de líder...
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