quinta-feira, 30 de abril de 2009

Autoridade vs. poder, e a democracia de massas

Mídia Sem Máscara

A democracia de massas é uma democracia de grupos, grupos esses que almejam ganhar espaço político mediante a formação de maiorias. A quantidade é mais relevante que a qualidade.

A maior parte da filosofia política na história do cristianismo sempre procurou conceber a relação entre autoridade espiritual e autoridade política como sendo de complementaridade. Tanto no final do Império Romano quanto nos reinos medievais já existia uma relação de primazia da autoridade espiritual sobre a temporal, a saber, da Igreja sobre as unidades políticas. Porém, como o próprio nome indica, a primazia é uma questão de “autoridade” e não de “poder”. Os medievais sempre diferenciaram auctoritas de potestas, querendo com a primeira indicar a confiança da comunidade com relação aos seus representantes, ao passo que a segunda se sucede mediante uma relação de imposição entre representantes e representados. No primeiro caso, legitimidade. No segundo, mando e obediência. Acontece, na maior parte dos exemplos históricos, que tanto a autoridade quanto o poder estão presentes na maior parte dos sistemas políticos ocidentais, pois ambas as relações são indispensáveis para a estabilidade e o consensus, a saber, para a legitimidade e a ordem das formas políticas ocidentais.

Certamente, a busca da ordem exige que, em nome do bem comum, determinadas medidas sejam tomadas para que o telos de uma comunidade se atualize. Assim, na comunidade política medieval tanto a ordem quanto a legitimidade eram dois postulados concretos no cumprimento das funções reais. Ocorre, assim, que os medievais nos legaram muito do que hoje entendemos por legitimidade e consensus.

As instituições políticas medievais eram baseadas na moderação e no equilíbrio de poder, existindo ali uma autêntica representação política, pois o rei era limitado pelas assembléias locais, sendo ambos representantes concretos da comunidade. Não havia nessa época uma democracia, mas uma verdadeira representação cujo vínculo não era com a vontade popular, mas com o bem comum da sociedade, isto é, a partir de uma concepção objetiva de verdade radicada no Direito Natural. Há uma diferença substancial entre a vontade e o bem comum. A primeira conduz a conjunção ente elementos instintivos, racionais e contingenciais, de modo que na vontade política não há limites. Em nome da vontade, qualquer ato é aceitável, pois o que é realmente determinante nesse aspecto é o desejo do momento. No bem comum, há um símbolo constitutivo da verdade existencial, o que não se aborda a partir de meros desejos e particularidades, mas se aufere mediante uma deliberação silogística que, através da experiência e da inteligibilidade, vai alcançando os graus constitutivos da realidade e, assim, extraindo os aspectos comuns partilhados pela experiência humana universal. O bem comum, diante disso, é um bem do ser humano como tal.

Em nossa atual sociedade de massas, a democracia é comumente entendida como “único” caminho possível para a legitimidade. Porém, a democracia tão aclamada nos circuitos “progressistas” atuais, como a mídia e a universidade, não se configura como uma democracia entendida em sentido teleológico, o que a vincularia ao bem comum e à indispensável representação política da verdade e do direito natural, mas uma democracia cujo critério é a majoração das vontades individuais. Uma perspectiva relativista para um sistema de maiorias. As maiorias ganham o jogo e estabelecem suas vontades por imposição. Um sistema baseado em desejos do momento, sem qualquer recurso a estabilidade e a permanência.

Assim, as democracias atuais definem a legitimidade a partir de critérios volitivos, segundo a vontade e a atuação decisiva dos grupos sociais que arregimentam tais vontades através da pressão e da participação por interesses coletivos. A democracia de massas é uma democracia de grupos, grupos esses que almejam ganhar espaço político mediante a formação de maiorias. A quantidade é mais relevante que a qualidade.

Dessa forma, estamos diante de um impasse: o que era legitimidade para homens como Tomás de Aquino ou Francisco Suarez é muito diferente do sistema atual de poder. Para a visão cristã da política a legitimidade é um vinculo da autoridade ao bem comum e, assim, à verdade, não podendo fugir do direito natural. Os valores vinculam. A representação política, dessa forma, é uma representação do que é “verdadeiro”, de uma ordem concreta articulada para ser a imagem e semelhança da ordem celeste. A ordem política é, segundo a perspectiva realista cristã, um reflexo da ordem transcendente. Há um nexo necessário entre a ordem política e a ordem espiritual, em sentido de representação e de consensus.

Em Romanos, 13, a Palavra de Deus diz que não há autoridade que não proceda de Deus. Independentemente do que os representantes façam, como cristãos devemos respeito às autoridades. Porém, tal autoridade só é legitimamente autoridade quando se vincula ao bem comum. Assim, quando o representante não se vincula ao bem comum, isto é, usa o cargo para destruir o direito natural e a Palavra de Deus, devemos sinalizar nossa total discordância. Suarez, em seu De Legibus, nos trás a teoria da translatio, segundo o qual a origem do poder está em Deus, que o transfere ao corpo político, isto é, à comunidade e ao representante, sendo aquela a magistrada sobre este. A comunidade, enquanto corpo místico do Senhor Jesus, Igreja visível e invisível, existente em sentido espiritual e temporal, caminha peregrina no mundo rumo à Jerusalém celeste. Tal existência histórica da sociedade impõe um tipo de representação que se traduz em sentido espiritual e temporal: a Igreja e a ordem política. Segundo Suarez, a translatio propicia à comunidade um juízo sobre o exercício do poder, em necessária compatibilidade com a Palavra de Deus e com o Direito Natural. Assim, se o representante viola os valores através de seus atos políticos seu caminho será a inadequação com relação à comunidade e em última ratio à Palavra de Deus. Tal situação permite à comunidade reivindicar ou mesmo negar-se a cumprir os ditames estatais.

Ora, o que assistimos em marcha é o uso incondicionado do poder para descumprir os mandamentos do Senhor. Assim, devemos não só nos pronunciar de maneira contrária, como também negar-nos a realizar tais atos. O aborto, a ditadura gay, a destruição da propriedade e da liberdade em nome dos direitos sociais, a utilização alternativa do direito, assim como outros casos de total incompatibilidade entre os atos governamentais e a Lei do Senhor devem ser objetos de repúdio por nossa parte. Afinal de contas, somos a comunidade e em nome de Jesus devemos nos recusar a realizar aborto, a aceitar que o homossexualismo seja tratado como verdade absoluta e incontestável, ou até mesmo ficar calados enquanto o governo brasileiro atual invade nossas propriedades mediante a ação criminosa do MST.

Algumas semanas atrás fiquei chocado e ao mesmo tempo muito impressionado com a coragem e a fidelidade a Cristo por parte de nosso irmão Julio Severo, que abandonou o país por perseguição. Devemos nos preparar para esse tipo de situação, pois será cada vez mais comum entre nós. A perseguição velada, que não mostra o rosto, mas que astutamente opera calada contra os cristãos. A Palavra noz diz que no tempo do fim seriamos perseguidos pelo nome de Jesus.

O Espírito Santo nos guia, nos proporciona coragem e nos anima a continuar nossa caminhada de peregrinos pela terra. Nessa caminhada, devemos nos opor a todo ato satânico que almeja a violação do Direito Natural. Como Deus disse a Josué antes de entrar na Terra prometida, “tendes mui bom ânimo”.

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