Diário do Comércio
Em lugar de aproveitar a folga existente na planilha de custos da Petrobras para baixar os preços dos derivados, o governo vai aproveitar a brecha para aumentar diretamente sua receita, elevando a Cide (Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico).
José Márcio Mendonça - 22/4/2009 - 22h50
Há algumas semanas, a propósito da resistência da Petrobrás e de outros setores governamentais em diminuir o preço da gasolina e do óleo diesel – por conta da enorme queda internacional dos preços do petróleo –, escrevi neste mesmo espaço um artigo, Impostos Ocultos, sobre alguns subterfúgios utilizados pelo governo (todos) para tributar também, disfarçadamente, os cidadãos e as empresas. Como se não bastassem os impostos confessos. Falava ainda eu, no texto, do uso político da Petrobrás e de outras estatais.
Não precisamos esperar muito tempo para ver confirmadas, "ao vivo e em cores", como se dizia no Brasil na época em que surgiu a televisão colorida, nossas piores impressões. Primeiro, foi o presidente da Petrobras, José Sérgio Gabrielli, que, sem nenhum pejo, confessou que o preço dos combustíveis no Brasil têm um forte componente político. Ou seja, tanto pode ser reprimido, para colaborar (artificialmente) no combate à inflação, quanto mantido elevado, para garantir o caixa da empresa e do Tesouro Nacional. Boa parte das vezes, mais valendo a segunda opção do que a primeira, como é o caso de que trataremos agora.
Posteriormente, o próprio presidente Lula admitiu que, embora nesse momento o óleo diesel e a gasolina pudessem – na verdade, devessem – estar custando menos no País, era preciso cautela para mexer nos preços, de forma a não prejudicar as finanças dos Estados –, coitadinhos. Há ocorrência de ICMS também nos combustíveis e, assim, preços menores significam receitas mais baixas. E o consumidor-contribuinte que pague, porque cortar as despesas públicas, mesmo quando supérfluas, é quase uma heresia
E está vindo mais por esses dias. Em lugar de aproveitar a folga existente na planilha de custos da Petrobras para baixar os preços dos derivados, o governo, conforme confirmou ontem o ministro das Minas e Energia, Edison Lobão, vai aproveitar a brecha para aumentar diretamente sua receita, elevando a Cide (Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico).
O preço permanecerá o mesmo para o consumidor, caindo apenas na contabilidade da Petrobras. A estatal em si não sofrerá muito, pois foi recentemente liberada de contribuir para o superávit primário – aliás, uma providência saudável, mas que pode virar problema, uma vez que não será substituída por poupanças de outros lados. É possível que apenas o preço do óleo diesel caia um pouco, por causa da pressão dos transportadores de carga.
E já não se faz nem mesmo qualquer esforço para disfarçar o apetite fiscal de Brasília. O objetivo, dito por um dos homens do governo, é , realisticamente, compensar o que o governo está deixando de arrecadar com as renúncias fiscais concedidas nos últimos meses – carros, motos, linha branca, material de construção e outras que deverão vir por aí, num misto de política anticíclica e proeleitoral.
No caso, há que considerar, além do vício natural do setor público de querer arrecadar sempre mais (pois despesas para cobrir não faltam, e sempre se pode inventar novas), o fato de que está difícil manter o Orçamento deste ano equilibrado. A busca de mais dinheiro da sociedade – aumentou-se o IPI do cigarros, agora vem a CIDE, em seguida deve aumentar o IPI das bebidas – é a confissão de que as despesas estão de fato descalibradas. E isso num ano eleitoral...
Em tempo
A propósito do que vem ocorrendo em Brasília, na Câmara e no Senado, é bom – para não se perder a vontade de lutar – recordar uma frase de Machado de Assis, em O segredo de Augusta (retirado de Migalhas de Machado de Assis, de Miguel Matos):
"Política é uma cousa muito feia, mas muito necessária."
Ânimo.
José Márcio Mendonça é jornalista e analista político
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