Reinaldo Azevedo
segunda-feira, 24 de agosto de 2009 | 3:51
Reportagens, quando cumprem o seu papel, não podem ser caracterizadas, na sua intenção, como contrárias ou favoráveis a quem quer que seja. Os fatos que elas relatam é que eventualmente contribuem para reforçar ou minar a credibilidade de um político — os fatos, eles sim, podem ser contrários ou favoráveis à reputação das personagens da notícia. A VEJA desta semana informa, com a confirmação do próprio Guido Mantega, que o ministro da Fazenda, ex-chefe imediato de Lina Vieira, pediu à então secretária da Receita informações sobre a investigação feita nas empresas da família Sarney. Desta feita, foi ela que negou ter conversado com Mantega a respeito — provavelmente, para protegê-lo. Consta que, à diferença do que teria feito Dilma Rousseff, o ministro nada pediu. Quis dados da investigação e saber por que alguns deles haviam vazado.
Bom pra Mantega? Digamos que seja melhor para ele do que está sendo para Dilma. O ocorrido, no entanto, reforça a informação de que a cúpula do governo estava especialmente interessada no caso da família Sarney. É evidente que, do ponto de vista político, complica um tantinho mais a situação da ministra porque torna a acusação de Lina ainda mais verossímil. Verossímil, mas também mais enrolada. Se a curiosidade de Mantega era absolutamente normal, corriqueira, não haveria razão para a ex-secretária negar o que o próprio ministro admite. Há coisas que não podem nunca se misturar. Um exemplo: polícia e política. Outro: fisco e política.
Há uma urgência óbvia do governo em desarmar esse caso. A resposta do Gabinete da Segurança Institucional ao pedido feito pelo DEM, por intermédio da Câmara Federal, para ter acesso às imagens do Palácio do Planalto e à ficha de registro de veículos prova uma de duas coisas: ou essa gente perdeu completamente o senso de ridículo, ou Lula deve transferir a sede do governo para o Complexo do Alemão, já que qualquer chefe da bandidagem deve estar mais seguro do que o presidente da República. Reitero: estamos falando daquele que deveria ser o prédio mais bem-guardado do país. Se é possível entrar ali sem que a placa seja nem sequer anotada — “carro de autoridade” — e se há sobreposição de imagens numa velocidade que não acontece nem em alguns prédios residenciais, a maior autoridade do país está correndo riscos. Um soldado do aparato de segurança dar um tiro no outro, como já aconteceu, é pinto perto do que seria o esquema de proteção ao chefe do Executivo.
O mecanismo para tentar desmoralizar Lina Vieira foi disparado. A conhecida máquina de sujar reputações espalhou, primeiro recorrendo aos que se prestam a fazer serviço sujo na Internet, que Lina é mulher do servidor Alexandre Firmino de Melo Filho, que foi ministro interino da Integração Nacional de 20 de agosto de
Lina não se casou com Melo Filho depois que foi nomeada secretária da Receita. Já era casada. Gente chamada para assumir um cargo como o dela tem a ficha analisada pela Abin — a considerar alguns nomes, convenham, suspeito que é preciso ter folha corrida em vez de biografia, mas vá lá… Todos sabiam com quem ela era casada. Mais: Mantega a chamou para o cargo, e o próprio governismo espalhou isto por aí, porque queria pôr a Receita sob controle do lulo-petismo. Procurem o noticiário da época. Lina contava com o apoio da corrente sindical da área. Kotscho ajuda a espalhar a versão vigarista de que Lina é suspeita de estar a serviço dos tucanos, quando a verdade é o exato oposto: ela só foi nomeada porque os petistas consideravam que a Receita era “tucana” demais.
Vejam que coisa espetacular: enquanto Lina não atrapalhava o PT, ter sido casada com ex-ministro interino era irrelevante; quando, ao que tudo indica, se negou a praticar uma ilegalidade, bem, aí ela se tornou suspeita.
COROLÁRIO - Se ela não fosse ligada aos tucanos, não faria a denúncia. Lido de outro modo: tivesse simpatia pelo PT, ela ficaria calada. É… O juízo que essa gente faz de si mesma é exato.
Kotscho, evidentemente, não se mede com a régua com que mede os outros. Se Lina, casada com um ex-ministro interino de FHC, era suspeita como secretária da Receita, por que ele próprio — ex-assessor de imprensa de Lula, seu amigo pessoal há décadas, com gente da família empregada na TV de Franklin Martins — é isento como jornalista? Em seu texto, ainda antevê o fim dos jornais porque, parece, ele suspeita dos seus (deles) critérios. Ah… Bons são os critérios de Ricardo Kotscho.
De volta à Receita
O que é que o governo queria na Receita? Um Cartaxo. E conseguiu. No sábado, informavam Leonardo Souza e Leandra Peres, na Folha:
“A pouco mais de um ano das eleições, o governo federal decidiu intervir na Receita e mudar o responsável por auditar o recolhimento de impostos das maiores empresas do país. Numa reunião tensa com a cúpula do órgão, o novo secretário da Receita Federal, Otacílio Cartaxo, avisou o subsecretário de Fiscalização “que não teria como segurá-lo” no cargo devido a pressões do ministro Guido Mantega (Fazenda).”
Eis aí o tipo de jornalismo que o “blogueiro” Kotscho não gosta e acha que está acabando. Talvez volte a ter utilidade se um dia o PT deixar o poder.
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PS — Ah, sim: um leitor me mandou o link de sujeito se dizendo grato a mim e a Diogo porque, disse, fomos nós que lhe arrumamos emprego no governo. Segundo entendi, como uma de suas taras é nos atacar, isso virou critério de contratação. Não tem de quê.
Mas ele é só um galo velho e irrelevante. A gente já arrumou emprego até pra dinossauro.
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