quinta-feira, 6 de agosto de 2009

O crime de fumar

Mídia Sem Máscara

Juntando a babaquice de apelo "cidadão" à força persuasiva da lei, acender um cigarro no bar poderá, em breve, ser uma imagem tão ou mais assustadora do que chamar a atenção do garçom dando um tiro de escopeta.

Você aceitaria ter o comportamento na privacidade do lar regulado pelo Estado? Presumo que não. Se a resposta for sim, você não é humano, é gado.

Os donos de estabelecimentos comerciais em São Paulo serão forçados a renunciar aos direitos sobre a propriedade privada a partir de sexta (7), quando começa a caça aos fumantes liderada por José Serra. Em defesa da autoritária lei anti-cigarro, a boiada bem-intencionada, com aquele reflexo de campanha publicitária, alega automaticamente: "Mas isso protege os não-fumantes dos males do fumo passivo". É verdade. Então vou seguir o raciocínio. Conseguiríamos o mesmo resultado se proibíssemos a produção de cigarros. Também faríamos um grande bem aos brasileiros proibindo o consumo de carne vermelha. Adeus, gordura e colesterol. Outra medida bacana seria proibir o uso de automóveis em todo o território nacional. Não haveria mais um só brasileiro morto por atropelamento. E quem negaria as vantagens da proibição da internet? Eliminaríamos todos os crimes virtuais de uma só vez. Aproveitando que acordei cheio de sugestões, lanço uma mais ousada: proibamos logo o sexo. Não pegar doença venérea é um direito de todos e o Estado tem que garantir isso pra gente.

Construir um mundo melhor não é tarefa reservada apenas a políticos conscientes. O povo tem que participar. Trechos de matéria do Estadão (grifos meus):

"(...) o governo de José Serra (PSDB), autor do texto da lei, sustentou que a eficácia das blitze será garantida por meio da participação e das delações populares. A pesquisa InformEstado, entretanto, apontou certa fragilidade na participação efetiva da população - resistência muito maior entre o público fumante. Do universo estudado, 22,6% têm o hábito de fumar e, dessa parcela, 86,7% afirmaram que não vão fazer denúncias - ainda que 48,8% sejam totalmente a favor da lei. A não adesão às denúncias também ocorre entre não fumantes: 58,4%"

Atenção agora:

"O uso do cigarro em ambiente interno é culturalmente aceito há anos. Começamos a mudar isso só agora", avalia o secretário de Estado da Saúde, Luiz Roberto Barradas Barata, um dos responsáveis pela fiscalização. "Por isso, nesse primeiro momento, a intenção de denunciar não aparece. Acredito que, com a aplicação da lei e os donos de bares se engajando em preservar os estabelecimentos, as denúncias vão surgir", afirma. "Fumar dentro do local será exceção. Vai chatear." O secretário de Estado da Justiça, Luiz Antônio Marrey, diz que a "metade de fumantes que vai denunciar é suficiente para colaborar com a fiscalização".

A intenção é desfazer um hábito inofensivo e culturalmente aceito há anos, tido pela burocracia iluminada como uma grave ameaça ao nosso bem-estar, e instaurar um novo, transformando os fumantes em párias. Juntando a babaquice de apelo "cidadão" à força persuasiva da lei, acender um cigarro no bar poderá, em breve, ser uma imagem tão ou mais assustadora do que chamar a atenção do garçom dando um tiro de escopeta.

Serra pretende que seu objetivo seja alcançado à velha moda socialista: investindo os cidadãos da função de delatores a serviço do governo. Nos sonhos do tucano, o desgraçado que insistir em fumar, além do vexame de "chatear" e prejudicar a coletividade asséptica, se verá acuado por uma multidão de acusadores que até ontem estavam cuidando de suas próprias vidas.

A pesquisa do Estadão diz que a maioria não pensa em dedurar os fumantes. Menos mal.

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