08 de março de 2009 | N° 15901
Zero Hora
Divergência é pouco para definir os extremos de opiniões entre especialistas em educação e MST consultados por Zero Hora a respeito das cartilhas de ensino. Para uns, os ensinamentos das escolas itinerantes deseducam. Para outros, são instrumentos legítimos de aprendizado da realidade que cerca os acampados. Para um terceiro grupo, parte do que está nas cartilhas – como “valorizar a ocupação” e “temer a polícia” – é tolerável, desde que os alunos não aprendam apenas isso.
Um dos maiores críticos é o sociólogo Zander Navarro, do Departamento de Sociologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Colaborador do MST até o início dos anos 90, considera que as escolas itinerantes foram uma ideia generosa, evitando a exclusão educacional. Com o tempo, teriam se desvirtuado:
– Isso permitiu uma tendência cada vez mais visível e nefasta, a de transformar essas escolas em meros instrumentos de doutrinação. Aos poucos, educação deixou de ser a prioridade. O que o MST faz nem remotamente é educação, mas meramente treinamento de militantes. Não forma cidadãos, forma soldadinhos alienados.
Zander desafia o MST a abrir suas escolas para a população e considera tolice cogitar que se trata de uma pedagogia centrada no educador Paulo Freire. Se vivo fosse, diz o sociólogo, Freire desautorizaria completamente o que o MST tem feito.
Opinião oposta tem a professora Marlene Ribeiro, da pós-graduação em Educação da UFRGS, que invoca o mesmo autor para defender o método. Aos que criticam a ideologia explicitada nas cartilhas, responde que é preciso desconstruir o mito de que a educação é neutra.
– Toda ação e palavra trazem uma visão de mundo. O que a educação itinerante faz é inserir o educando na realidade dele, como preconizava Paulo Freire. A terra tem uma função social, por isso a luta por ela faz parte do cotidiano dos alunos que ainda não a possuem – diz.
Especialistas apontam erros e acertos do ensino
A adaptação dos conteúdos ao dia-a-dia dos alunos também é defendida pelo professor Nilton Bueno Fischer, da Faculdade de Educação da UFRGS. Ele não se escandaliza com o uso das palavras “ocupar” e o “temor às autoridades”, por entender que isso faz parte da realidade das crianças. Acredita, porém, que o ensino precisa contemplar outros temas.
– O que pode e deve ocorrer é a aprendizagem efetiva, não só pelo lado da reivindicação.
Outro a listar erros e acertos é o coordenador do mestrado em Educação nas Ciências da Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul (Unijuí), José Pedro Boufleuer. Embora entenda que o ensino não pode ser asséptico em relação à vida dos alunos, pondera que toda escola está inserida em um contexto maior, da sociedade republicana.
– Devemos ensinar saberes que contribuem para a qualificação do coletivo, numa perspectiva plural e jamais de cerceamento de percepções.
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