sábado, 9 de maio de 2009

O liberalismo visto pelo imaginário universitário

Mídia Sem Máscara

A pergunta que poderia brotar nas cabeças de certas mentalidades universitárias quando exigem “regulamentação” é simples: quem controla os controladores? Quem controlará a burocracia, quando a sociedade der plenos poderes de gerência a ela?

É curioso observar que certos setores universitários usam, nas palavras do George Orwell, uma verdadeira “novilíngua”, tal como é descrita em seu famoso romance “1984”: a distorção do sentido das palavras, no intento de confundir ou mesmo destruir seu significado. Um desses conceitos vitimados pelo estigma mais odioso tem o nome de “liberalismo”, em particular, sua versão mais vulgar, “neoliberalismo”. É dado comum condenar o liberalismo como a causa de muitos males sociais. Inclusive, associá-lo indevidamente ao fascismo, ainda que a doutrina liberal seja anti-estatista e defenda a integridade do indivíduo contra a coletividade e arbitrariedade do governo, além da apologia ao livre mercado.

Todavia, se a massa de universitários adquire estigmas antiliberais, a grande maioria jamais leu um autor liberal. Seus conhecimentos provêm da mais rala propaganda marxista, disfarçada de conhecimento e disseminada nas universidades. Isso é particularmente grave, pois, além de induzir os alunos à ignorância completa, a resposta que essa propaganda nos oferece contra a solução liberal são os regimes totalitários de conotação comunista. De fato, quando se observa que a educação, atualmente, é pura formação de “ativistas sociais”, está se falando, em outras palavras, de uma disseminação em massa de militantes comunistas, ainda que estes nem observem a ideologia que estão absorvendo ou pregando.

De fato, mal se percebe o perigo dessa doutrinação ideológica massiva. Se alguém toma uma posição antiliberal e totalitária acaba se tornando inimigo de todas as instituições democráticas vigentes. Ou seja, o antiliberal universitário médio é contrário à divisão dos três poderes, ao Estado de Direito Democrático, às liberdades civis e políticas (e nisto, inclui-se, os direitos individuais, os direitos de propriedade e a pluralidade política) e à liberdade econômica, em particular, à economia de livre mercado. E o que ele prega? A concentração brutal do poder do Estado sobre a sociedade civil, a educação, a cultura e a vida em geral. E o projeto econômico apregoado por ele é o planejamento estatal centralizador, bem aos moldes soviéticos, com as mazelas e tiranias já bastante conhecidas. Ou seja, o que esses ativistas pregam é a sujeição de todas as decisões da economia a uma diminuta e iluminada burocracia estatal. Ou, na pior das hipóteses, eles mesmos sonham em ser esses burocratas.

Em épocas de crise mundial, o modismo político é falar de “regulamentação”, a história de que o mercado não funciona sozinho e que ele precisa de um Estado justiceiro para resolver todos os seus problemas e distorções. Porém, há um engodo nesta questão. Pois, de alguma forma, o mercado já é regulamentado. O problema mesmo a ser discutido é no que consiste essa “regulamentação”. Ninguém o especifica corretamente. Fala-se em termos genéricos, tal como o malvado “liberalismo”, culpado pelas mazelas mais extravagantes da humanidade. Entretanto, há uma crença perversa por trás disso, que revela um perigo fatal: a idéia sacralizada da autoridade moral do Estado e da burocracia para resolver todos os problemas econômicos e sociais. A pergunta que poderia brotar nas cabeças de certas mentalidades universitárias quando exigem “regulamentação” é simples: quem controla os controladores? Quem controlará a burocracia, quando a sociedade der plenos poderes de gerência a ela? Pelo jeito, quando os burocratas e os políticos falam em “regulamentação”, eles querem dizer “mais regulamentação”. O excesso de “políticas sociais”, de “políticas públicas” e a exigência cabal de mais leis, apregoadas por muitas universidades, disfarçam, através de uma linguagem rebuscada e vazia, tão somente a expansão e o gigantismo dessa burocracia. Até porque, quanto mais leis, mais regulamentações, mais burocratas. E mais Estado em nossas vidas. É, em suma, uma forma renovada e reciclada das velhas crenças do dirigismo estatal.

Essa pergunta já poderia ter sido respondida no século XX. As experiências do totalitarismo soviético, nazista e fascista mostram até aonde nos levam a destruição das liberdades civis e políticas. Isso implica dizer, obviamente, a destruição da liberdade econômica e dos direitos de propriedade, elementos substanciais de autonomia e independência da sociedade civil perante o Estado. Há certos indivíduos ingênuos ou mal intencionados que acreditam numa sociedade democrática sem a propriedade privada e o livre mercado. Contudo, se o Estado é detentor da propriedade e da liberdade econômica, quem será contra o Estado? O que está se propondo, basicamente, é o monopólio governamental sobre as propriedades e as atividades econômicas de milhões de pessoas. Tudo para o Estado, nada contra o Estado, já dizia Mussolini! E qual democracia sobreviveria se não há o equilíbrio dos poderes, o sistema de pesos e medidas clássico do liberalismo e de outras sociedades mais antigas?

E o capitalismo não possui suas mazelas? Não é causador de misérias, desigualdades e opressões? Isso é um grande mito disseminado por uma boa parte das universidades. Se há algo que as sociedades capitalistas conseguiram foi justamente reduzir a miséria. E quem pode falar em opressão dentro de nossas sociedades capitalistas, já que elas convivem perfeitamente com os sistemas democráticos e o Estado de Direito? Se o capitalismo, por regra, implica a liberdade econômica como um de seus princípios? Por outro lado, há a difusão do igualitarismo como um ideal a ser buscado nas sociedades democráticas. O problema mesmo é o realismo dessa teoria. A desigualdade sempre existiu em qualquer sociedade humana e sempre vai existir. As diferenças de renda, de conhecimento, de status social não são um fruto artificial das injustiças e sim um dado natural que é evidenciado mesmo no comportamento das pessoas. Em seus talentos, méritos, determinações, inteligências, vontades e perseveranças, as pessoas são desiguais. A única desigualdade que não pode ser aceitável, por ser injusta, é aquela determinada por condições legais diferenciadas entre as pessoas. É regra da boa justiça que todas as pessoas vivam sobre as mesmas leis e seus direitos sejam igualmente respeitados. Essa é a única igualdade possível. Do resto, o discurso da “desigualdade social” é artificial, um problema falacioso e inócuo. Ou, na prática, é tão somente a reprodução totalitária da utopia socialista, que precisa nivelar todo mundo por baixo, em nome da igualdade. As pessoas parecem se esquecer do sentido da palavra “justiça”. Justiça não é igualdade, é eqüilidade. É dar a quem é devido, dentro das mesmas regras comuns do direito.

É paradoxal que o capitalismo, com seus imensos sucessos no campo do bem estar das sociedades democráticas, seja criticado em favor dos mitológicos experimentos socialistas, com seu histórico de fracassos assombrosos. O problema mesmo está no desconhecimento da economia e da história, sem contar a desinformação em massa sobre essas questões. Em parte, essa desinformação revela o completo envolvimento da intelectualidade universitária com a crença auto-divinizadora da engenharia social, como se a sociedade fosse um mármore a ser esculpido. Se alguém fizer uma simples comparação entre países capitalistas e socialistas, no aspecto das liberdades e, mesmo, do padrão de vida, a situação é tão humilhante para a esquerda, que na falta de provar qualquer eficiência de seu regime, acabam estigmatizando aquilo que odeiam. A Coréia do Sul abunda em riqueza, conforto e liberdades, quando a Coréia do Norte é um grotão miserável, um Estado policial cheio de campos de concentração, cujo ditador todo-poderoso é cultuado como um deus encarnado, uma caricatura oriental de Stálin. A antiga Alemanha Ocidental capitalista, na época da guerra fria, tinha um padrão de vida altíssimo e plenas liberdades civis e políticas, enquanto sua irmã vizinha, a Alemanha Oriental, era uma verdadeira prisão cercada por um muro. Mesmo a União Soviética, que era, supostamente, o país mais rico dos Estados socialistas, não chegava nem a sonhar com os padrões de vida dos EUA. Mas o que diferencia esses dois tipos de modelos de vida, para que um tenha enormes sucessos e outro, enormes fracassos? É a liberdade e a defesa do individuo cultuadas pelas sociedades liberais contra as sociedades coletivistas que o oprimem. O igualitarismo socialista não divide a riqueza; concentra-a em favor do Estado; não socializa a riqueza, socializa a miséria. O que as pessoas precisam entender é qual a diferença básica entre a sociedade de mercado e a sociedade dirigista ou socialista. A primeira dá a liberdade a cada indivíduo de gerenciar suas riquezas e possuir propriedades como bem entender; a segunda confisca o direito de cada um gerenciar o que é seu e se dispõe gerenciar os bens alheios às custas de todo mundo. O capitalismo é a economia da liberdade individual; o socialismo é a economia da servidão estatal.

As deficiências do liberalismo não estão nas estruturas políticas da democracia constitucional, e, tampouco, na sociedade contratual e na economia de livre mercado. O mal se encontra no relativismo moral, que não é somente um vício das sociedades liberais, e sim, de toda uma época, o século XX. Entretanto, a rotulação esquerdista sobre o liberalismo, ou mais específico, sobre o “neoliberalismo”, partindo da boca de certos “ativistas sociais”, é pura fraude. Na prática, é a velha nostalgia dos totalitarismos. E isso se torna perigoso, porque influencia toda uma cultura e mentalidade comuns, no sentido de rejeitar a democracia ou mesmo destruí-la. O ódio antiliberal tem o mesmo sabor de ódio às liberdades. O preço da liberdade é a eterna vigilância.

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