sábado, 2 de fevereiro de 2008

A Importância de Importar

Sexta-feira, 1 de Fevereiro de 2008

A Importância de Importar

por Rodrigo M. Pereira

O que você prefere, um Palio ou um Gol? O que você prefere, um Palio, um Gol, um 206, um Clio, um Uno, um Ka, um Celta, um Corsa, ou um Fusca? Independentemente das preferências automobilísticas, uma pessoa certamente gostaria mais do segundo conjunto de opções. É muito melhor ter muitas opções de escolha do que poucas.
É curioso como a variedade de opções de escolha é um bom indicador do grau de desenvolvimento de um país. Tomemos os Estados Unidos, a nação mais rica e desenvolvida do mundo. Entrar num supermercado qualquer nos Estados Unidos é uma experiência única. Todos os produtos têm um numero de opções, marcas e modelos diferentes que impressiona, e às vezes até dificulta a escolha do que comprar. Por exemplo, vá comprar um queijo e você terá 100 tipos diferentes pra escolher. Agora, façamos o exercício mental inverso. Entre num mercado, digamos, no Afeganistão, um dos países mais pobres e atrasados do planeta. Você vai talvez encontrar um único tipo de queijo, se encontrar.

Ande num estacionamento de carros nos Estados Unidos. Em duzentos carros, você não verá dois modelos repetidos. Em contrapartida, no Brasil, uma meia dúzia de modelos representa mais da metade das vendas de veículos. No Afeganistão, dê-se por satisfeito se você conseguir andar de carro. O Brasil é um país de renda média, que está no meio do caminho do fosso que separa um Estados Unidos dos Afeganistões da vida. Nossas opções de escolha das coisas não são o desastre que é um Afeganistão, mas também não chegam nem perto das escolhas dos nossos afortunados irmãos do hemisfério norte.

Mas será que o brasileiro poderia ter acesso a uma maior variedade de bens? E porque não tem? Em primeiro lugar, vale notar que o mundo desenvolvido jamais teria à sua disposição tamanha variabilidade de bens sem importações. A grosso modo, a qualidade de vida do cidadão comum aumenta com o aumento das importações. Tanto pelo efeito que o aumento na variedade de produtos tem sobre o bem-estar, quanto pelo efeito da maior concorrência entre os produtores domésticos, e conseqüente redução de preços.
Mas então como andam as importações brasileiras? Apesar de ter se aberto bastante ao comércio nos últimos 15 anos, o Brasil ainda é um país bastante fechado. Aqui, a proporção do valor do comércio (importações mais exportações) sobre o PIB é de apenas 29%. No Chile, por exemplo, ela é de 75%, no Canadá 73%, na França 53%, e em Cingapura impressionantes 456%. A média ponderada para o mundo é de 96,9%. Ou seja, o Brasil é um país que ainda vende e compra pouco do resto do mundo.
Essa característica é ainda um resquício do modelo de desenvolvimento econômico escolhido pelo Brasil ao longo do século XX, com o fechamento das fronteiras comerciais, e a substituição das importações por produtos domésticos. Mesmo com a falência desse modelo, ainda existe uma mentalidade arraigada no brasileiro de que importar é errado. Para quem importa algum produto, e tem que comparecer à Receita Federal, a cena é pitoresca: um velhinho de cabeça branca olha para você, desconfiado, e pergunta qual é o seu “envolvimento” naquilo. Para depois cobrar 60% de impostos sobre o valor do produto.

Parte da culpa pela neurose com os produtos importados vem da estrutura tributária, que no Brasil é típica de países subdesenvolvidos. Aqui, a renda e os valores das propriedades imobiliárias são relativamente baixos, limitando as possibilidades de arrecadação de tributos diretos. Então adota-se uma forte tributação indireta sobre o consumo. Some-se a isso o fato de que um Governo agigantado como o nosso custa caro, e tipicamente vem com uma enorme voracidade fiscal.

A alta carga de tributos indiretos faz com que a maioria dos bens transacionáveis seja muito mais cara no Brasil do que em outras partes do mundo, sobretudo os EUA.
Ah bom, então está tudo explicado. Eu pago um imposto de importação alto para proteger os produtores locais, que são expostos a uma tributação muito maior do que no resto do mundo. Com isso, a mensagem que sai do Brasil para potenciais investidores internacionais é a seguinte: venha construir seu negócio aqui. Nossos impostos vão lhe custar os olhos da cara. Em compensação, você não precisa se preocupar com a concorrência do resto do mundo. Nós nos encarregamos de aniquilá-la com impostos e proibições. Que se dane o cidadão comum, que vai ter que escolher entre 3 tipos de queijo, e 2 modelos de carro. Voilá! Eis o modelo de Capitalismo Tupiniquim para o século XXI.

Rodrigo M. Pereira: Economista do Ipea, PhD em Economia pela Cornell University, EUA.

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