terça-feira, 12 de fevereiro de 2008

Sofismas em torno de uma tal “transparência”

por João Luiz Mauad em 12 de fevereiro de 2008

Resumo: Não bastasse a imoralidade sem limite envolvendo o governo petista, pois não há lei, instituição ou autoridade que a faça cessar, ainda temos que conviver com o cinismo debochado dessa gente, como demonstrado no episódio dos cartões corporativos.

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Eu não pretendia comentar essa indecência (mais uma) dos ditos “cartões corporativos”. Confesso que fui nocauteado pela sem-vergonhice altaneira do governo Lula, e ando completamente sem vontade – até mesmo para desabafar – já que qualquer crítica acaba transformando-se na mais pura inutilidade.

Gente muito melhor e mais gabaritada do que eu tem feito das tripas coração para desmascarar a corte petista, infelizmente sem sucesso. A ignorância da maioria, manipulada pelo oportunismo inescrupuloso de uma gente sem o menor caráter, impede qualquer reação minimamente eficaz. A banalização do mal transformou alguns poucos bem informados e corretos em nada mais do que reféns inermes, cuja única reação possível, em prol da própria sanidade, talvez seja o vômito.

Não bastasse a imoralidade sem limite, pois não há lei, instituição ou autoridade que a faça cessar, ainda temos que conviver com o cinismo debochado dessa gente. Quem assistiu, ao vivo e em cores, à entrevista coletiva dos ministros Jorge Félix, Dilma Roussef e Franklin Martins sobre o imbróglio dos cartões, percebeu isso.

Para o primeiro, que responde pela pasta da Segurança Institucional (antigo SNI), o “vazamento” de dados sobre os gastos dos seguranças que servem à Presidência da República afeta todo o sistema de segurança em torno de “Sua Majestade – o Imperador Lula I”. Traduzindo: graves não são os absurdos gastos efetuados por sua assessoria, que a imprensa, inadvertidamente, trouxe ao conhecimento do distinto público, e cujo conteúdo certamente faria morrer de inveja um Nero, um Calígula ou um Luis XIV. Grave mesmo é o “vazamento” da informação, motivo pelo qual o governo passaria a tratar essas informações como assunto sigiloso. Faltou explicar por que a notícia da compra de uma esteira ergométrica ou de R$ 55.000 em autopeças seria prejudicial à segurança de Sua Majestade, mas aí já seria pedir demais.

Ato contínuo, vem a Ministra Dilma Roussef, com seu característico tom solene e empolado, discorrer sobre o óbvio. Nada contra a prepotência da referida senhora, desde que ela não se comportasse como se estivesse me passando um sermão. Cheguei a comentar com minha mulher que aquele discurso ululante parecia uma reprimenda a nós, cidadãos, cujo único crime é pagar a conta sem chiar. Dizia a preclara, dedo em riste e olhando direto nos meus olhos, como a advertir-me: “como ministra, eu não posso utilizar o cartão para adquirir nada que seja para meu uso pessoal”. (Quase caí da cadeira com tamanha demonstração de ética. Agora posso dormir tranqüilo, pois ninguém mais vai usar o meu suado dinheirinho em proveito próprio).

Perceberam o truque? No lugar do que seria natural nessas circunstâncias (ou seja: assumir que houve crime, que os responsáveis serão punidos com severidade e que o governo vai envidar todos os esforços para que isso não volte a ocorrer), a ministra nos dá uma solene, despropositada e intempestiva aula de direito administrativo. Só esqueceu que quem errou não foram os jornalistas ali presentes e, muito menos, os telespectadores, mas o próprio pessoal do governo do qual faz parte, não por acaso subordinados seus. Providências objetivas, só a certeza de que os cartões corporativos continuarão a ser utilizados, “pois eles tornam os gastos mais transparentes”. (Transparentes? Como assim, ministra? Até onde eu sei, esse bafafá também gira em torno de certos gastos – na verdade, 75% deles – em dinheiro vivo, devidamente sacados na boca dos caixas automáticos.)

Para encerrar a pantomima, o ministro Franklin Martin: justificando o injustificável. Com a arrogância contumaz, informa a todos a firme disposição do governo de (adivinhe?) continuar com a farra corporativa. A única diferença é que, de agora em diante, em nome da segurança nacional, “acabou essa tal transparência”. Ninguém mais ficará sabendo (no site da Transparência) em que o cerimonial de Sua Majestade gasta o nosso dinheiro.

Como se pode ver, aproveitando a Quarta-feira de Cinzas, os ministros entoam um verdadeiro “Samba do Crioulo Doido”. Enquanto um defende o uso dos cartões em nome da “transparência”, o outro informa que “acabou a transparência”. E o folião bobão, coçando a cabeça, mais uma vez se conforma: “É! Pensando bem, vai ver eles têm razão. Afinal, o que os olhos não vêem, o coração não sente...”

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