quinta-feira, 3 de julho de 2008

Bares têm queda de 20% no faturamento

por Maristela Orlowski em 02 de julho de 2008

Resumo: Resultado de uma lei demagógica, ilegal e absurda: prejuízo para o comércio.

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Descontentamento geral para donos de bares e restaurantes na cidade de São Paulo. A nova lei 11.705 – que pune mais severamente os motoristas que dirigem sob influência de qualquer quantidade de álcool – já surte efeito também no bolso dos empresários. A queda no faturamento chega a 20% em dez dias, segundo estimativa da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel), seção São Paulo.

O Diário do Comércio conversou ontem com Percival Maricato, diretor-jurídico da entidade. Segundo ele, bebidas alcoólicas são os itens que mais geram lucro aos estabelecimentos. Elas são responsáveis por 60% e 30% do faturamento de bares e restaurantes, respectivamente.

“À medida que a lei vai sendo divulgada, o prejuízo aumenta. Mas, muito além da queda na receita, a nova lei pode deflagrar a perda de empregos e a falência de empresários”, ressaltou o executivo, que defende a adoção do mesmo limite de álcool permitido em países como Estados Unidos, Inglaterra e Canadá, de 8 decigramas de álcool por litro de sangue.

Diário do Comércio - Qual sua opinião a respeito da nova Lei Seca?

Percival Maricato - É demagógica, anti-social, excessivamente draconiana e inconstitucional. Nós vamos enfrentá-la e mudá-la, como fizemos com a Medida Provisória 415, que proibia a venda de bebidas alcoólicas em estabelecimentos localizados em rodovias federais. Do país mais tolerante, passamos, repentinamente, ao mais intolerante. As autoridades brasileiras costumam ser omissas com problemas sociais e, quando resolvem intervir, o fazem sempre desequilibradamente.

DC – Como fica o setor de bares e restaurantes?

Maricato – É uma hecatombe, uma situação trágica. Temos cerca de 50 mil estabelecimentos na cidade de São Paulo, 100 mil pequenos empresários e 300 mil funcionários. Todos estão arriscados a perder seus negócios e empregos. Somam-se, ainda, distribuidores, adegas, fabricantes. Todos os negócios podem ser levados à falência. Cerca de 10% da população ativa do País pode ser atingida por essa nova lei.

DC – Já há estimativa de prejuízos?

Maricato – Todos os estabelecimentos já devem ter sido atingidos. A população está lendo nos jornais que tomar um chope pode dar cadeia ou, no mínimo, resultar em drásticas punições administrativas. É evidente que evitará o consumo. É um estado de terror. Estamos apurando o prejuízo com exatidão, mas, até agora, os menos prejudicados devem ter perdido 20% de receita. À medida que as punições e prisões vão sendo anunciadas, esse prejuízo aumenta. E não pára por aí. Supermercados, quitandas e padarias também serão atingidos, pois, da mesma forma, não se poderá mais beber em churrascos de fim de semana, casamentos, jantares com a família. No fim das contas, acredito que 95% do mercado de bebida será atingido.

DC – Que medidas serão tomadas pela Abrasel?

Maricato – Vamos ajuizar uma ação até amanhã (hoje). Demonstraremos que a lei é inconstitucional por vários motivos: fere os princípios da razoabilidade quando diz que qualquer quantidade de álcool é infração; prevê punições desproporcionais às infrações; e é iníqua e ilegal quando sustenta que quem não se submeter a testes como o do bafômetro será punido como se estivesse alcoolizado. A lei também atinge a livre iniciativa, a liberdade econômica, o direito de ir e vir. Vamos mobilizar o setor, fazer avaliações, obter números e informações e agir no plano político, abordando parlamentares para mudar a lei. Divulgaremos nossas razões à opinião pública e entraremos com ações judiciais. O setor deixou de ser passivo, criou lideranças. Está preparado para lutar.

DC – E quanto ao senhor?

Maricato – Eu considero essa exigência não só ilegal, como abusiva e uma invasão de privacidade. Entrei com mandado de segurança para poder circular na cidade sem ser molestado.

DC – Qual a atitude das pessoas nos bares e restaurantes?

Maricato – Muitas não bebem, outras pedem chá ou água, algumas pedem cerveja sem álcool. Estamos brincando de escoteiros e seminaristas nos bares. Estes, pelo menos, podem tomar um pouco de vinho nas missas. Mas, se a lei for aplicada, o padre que tomar vinho nas cerimônias também poderá acabar sendo preso na esquina.

DC - A lei vai pegar?

Maricato – Não passará. Faremos um movimento mais forte do que o que fizemos para enterrar a MP 415. Do lado do consumidor, é evidente que 80 milhões ou 90 milhões de brasileiros também não mudarão seus hábitos, não deixarão de lado seu direito ao lazer apenas porque o governo emitiu um decreto ou uma lei.

DC - Por que não daria certo no Brasil, assim como deu em países europeus?

Maricato – Na Europa, as pessoas têm uma cultura de sair mais cedo. Seria bom para nós que os brasileiros fizessem isso, mas eles gostam de sair mais tarde. Por outro lado, na Europa, você pode circular na rua sem correr risco de ser assaltado em cada esquina e existem transportes públicos durante a noite. Aliás, em muitos países, a lei é mais liberal que a nossa.

DC – Existe certo preconceito contra bares ou mesmo bebida no País?

Maricato – Existe, sim, um visível preconceito da sociedade, das autoridades e da mídia contra bares em geral e bebida em especial. São locais de lazer, descontração, divertimento, namoro, acesso democrático de jovens, e não merecem essa carga negativa. Aliás, bebida alcoólica é algo que faz parte da civilização há mais de dez mil anos. Na Antiguidade era tão cultuada que tinha até entidade divina – como Baco, o deus do vinho –, respeitada tanto como a fertilidade, o fogo e outras necessidades do homem. É preciso acabar com tanto preconceito.



Publicado pelo Diário do Comércio em 01/07/2008

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