por Paulo José de Morais e Maurício Januzzi Santos em 05 de julho de 2008
Resumo: O rigor da Lei Seca e suas flagrantes ilegalidades levarão ao seu questionamento e ela poderá deixar de ser aplicada em razão de suas próprias incongruências.
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Com certeza vivemos tempos difíceis em relação à aplicação efetiva do Direito Penal. O Estado brasileiro cria e aplica o Direito Penal para inimigos, e não mais para os seus cidadãos. Se, por um lado, assistimos atônitos às grandes operações da Polícia Federal, por outro percebemos a volta do Direito Penal do Terror contra o inimigo e, assim, eliminamos direitos fundamentais consagrados na Carga Magna.
A edição da Lei n° 11.705/08 , que reforma o Código de Trânsito Brasileiro, apelidada de Lei Seca , traz algumas aberrações jurídicas. Observamos flagrante ilegalidade, que poderá ser objeto de ação junto ao Supremo Tribunal Federal para reconhecimento da sua inconstitucionalidade.
Não queremos fazer aqui a apologia ao crime. Mas, se há um aumento significativo de acidentes de trânsito com vítimas fatais, logo alguém pensa em endurecer as leis que regem o tema, a fim de colocar um fim na barbárie.
Se esqueceu o legislador que antes da edição de leis é preciso se preocupar com a educação.
O novo artigo 165 do Código de Trânsito Brasileiro , que prevê multa administrativa para quem for pego dirigindo embriagado, seja qual for a quantidade de álcool por litro de sangue, parece-nos um contra-senso e um despropósito, já que para a consumação do crime previsto no artigo 306 do Código de Trânsito é necessário uma concentração de álcool por litro de sangue igual ou superior a 6 (seis) decigramos.
A multa pela infração administrativa do artigo 165 deveria estabelecer um índice de tolerância, que é exigido para a configuração do crime.
Já o crime, elencado no novo diploma legal, só deveria estar descrito se o condutor ostentasse tal nível de álcool no sangue e desde que também expusesse a dano potencial a incolumidade pública, já que é esta a objetividade jurídica que se quer defender.
A outra aberração vem exposta no § 3° do artigo 277, que indica que caso o condutor se recuse a se submeter a qualquer dos procedimentos previstos para a verificação da embriaguez, será multado e terá suspensa a sua habilitação por 12 meses. Tal disposição beira a ilegalidade e a inconstitucionalidade já que, por disposição da Constituição, ninguém em processo judicial ou administrativa está obrigado a produzir prova contra si mesmo.
Outra falácia construída nesse novo comando legislativo é o fato de que o motorista flagrado embriagado será preso. Ora, seja qual for a quantidade de álcool no sangue, o condutor será multado e se esta quantidade exceder a 6 decigramos será preso em flagrante pelo crime do artigo 306 do CTB, sendo liberado em seguida, posto que a pena mínima prevista é de 6 meses de detenção; portanto, apenamento que se enquadra dentro daqueles crimes em que o acusado é solto independentemente do pagamento de fiança.
O rigor da Lei Seca e suas flagrantes ilegalidades levarão ao seu questionamento e ela poderá deixar de ser aplicada em razão de suas próprias incongruências.
O que vemos hoje em dia é que aqueles que devem aplicar a lei pouco a conhecem, e quando conhecem verificam na prática que ela não funciona, tornando-a dentro no nosso arcabouço jurídico mais uma das leis do chamado Direito Penal do Terror .
Publicado pelo Diário do Comércio em 03/07/2008
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