sábado, 17 de maio de 2008

Quando o passado condena

por João Luiz Mauad em 16 de maio de 2008

Resumo: O contraste histórico entre os EUA e o Brasil é imenso. Enquanto por lá os compromissos assumidos pelo Estado ou por seus cidadãos e empresas têm garantia constitucional de que serão honrados, o calote por aqui tornou-se uma espécie de “meio de vida”.

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Semana passada, numa dessas indefectíveis “inaugurações” país afora, em meio a mais um festival de fanfarronices retóricas e cercado pelos sempre disponíveis holofotes das TV’s, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva comemorou, mais uma vez, a obtenção de grau de investimento, concedido pela agência internacional de classificação de risco de crédito Standard & Poor’s ao Brasil. No entanto, ele se disse "abismado" com as avaliações feitas por essas agências, especialmente em relação ao risco dos Estados Unidos.

"Eu fico abismado de ver que o risco americano é zero. Estão numa crise desgraçada e não têm risco. Aumenta o risco no Brasil, aumenta o risco na Rússia e os americanos estão entupidos de dívida até aqui - apontando para o pescoço - e o risco é zero. É uma inversão das empresas que medem esse risco, na minha opinião", disse o bufão, sem qualquer sinal de constrangimento pela estultice que acabara de pronunciar.

Antes de mais nada, seria bom que o presidente do Brasil soubesse que o risco americano não é zero, mas encontra-se bem próximo disso por uma razão histórica muito simples. Aquele país completa, este ano, 232 anos de existência, sem que jamais, repito, jamais tenha deixado de honrar os seus compromissos internos ou externos. Também não ficaram inadimplentes com seus credores por um só instante. Nunca aventaram, tampouco, a hipótese de pedir “auditoria” de suas dívidas ou convocar “plebiscitos” para saber se o povo concordava ou não em pagar os compromissos assumidos por seus mandatários.

Ao contrário, como muito bem lembrado pelo Ângelo Fasolo - do excelente blog “Duke of Hazard” -, desde a sua independência aquele país sempre fez questão de deixar clara a sua firme intenção de, em respeito ao sagrado direito de propriedade, honrar todos os compromissos do Estado e da Nação. Não por acaso, portanto, os fundadores do Estado norte americano estamparam no artigo sexto da sua constituição o seguinte:

All debts contracted and engagements entered into, before the adoption of this Constitution, shall be as valid against the United States under this Constitution, as under the Confederation”.

Ou seja:

Todas as dívidas contraídas e os compromissos firmados, antes da adoção desta constituição, serão válidos contra os Estados Unidos, por força desta constituição, bem como da confederação”.

Já naquele outro país, abaixo do Equador, as coisas funcionaram de maneira muito diferente. Para começar, nos últimos 180 anos Pindorama já deixou de honrar seus compromissos nada menos do que 7 (SETE) vezes.

O contraste histórico entre os dois países é imenso. Enquanto por lá os compromissos assumidos pelo Estado ou por seus cidadãos e empresas têm garantia constitucional de que serão honrados, o calote por aqui tornou-se uma espécie de “meio de vida”. No período de 1824 a 2002, por exemplo, a pátria de Macunaíma (nosso herói sem caráter) esteve inadimplente, ou em processo de renegociação de seus débitos, nada menos do que 25% do tempo – enquanto alguns de nossos vizinhos latino-americanos chegam a 50%.

Reparem no quadro abaixo que, além dos recorrentes episódios de “default”, há uma clara correlação positiva entre estes e a inflação (sem esquecer que a inflação é, ela também, um grande calote aplicado pelo governo em seus credores, operado através da emissão descontrolada e criminosa da moeda local).

Como se pode facilmente notar, não é à toa que o Brasil e muitos de seus vizinhos latino-americanos possuem um “rating” baixo, enquanto os países emergentes e desenvolvidos que nunca apresentaram episódios de “calote” ou “renegociação, têm notas bem superiores às nossas. Além de um histórico altamente desanimador em termos de zelo no pagamento de nossos compromissos, ainda somos campeões mundiais de inflação.

É evidente que o presidente Lula não sabe disso. Tampouco procurou informar-se antes de sair por aí dizendo bobagens. Porém, como a este homem tudo é permitido e nada lhe deixa sequer envergonhado, a vida segue, malgrado muitos continuem a perguntar-se por que somos o eterno país do futuro.

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