domingo, 11 de maio de 2008

Soberania como farsa

por Heitor De Paola em 10 de maio de 2008

Resumo:

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“A mídia está de tal forma sob preconceitos (antiamericanos) que nem chega a perceber os próprios preconceitos. (…) Um simples fator é decisivo para sua tomada de posição: o regime proscreveu o Partido Comunista? Então é ruim!”

RONALD REAGAN

A soberania e a integridade territorial são conquistas importantes da constituição dos Estados modernos. Sem o respeito a elas seria impossível sequer ter uma administração conseqüente. Enquanto a primeira é um conceito jurídico universal, o último é uma conseqüência variável dela. Embora movimentos separatistas sejam freqüentemente vistos com desconfiança, a história mostra que partes de territórios podem se separar sem que o princípio da soberania seja desrespeitado, como ocorreu após a ditadura comunista na antiga Tchecoslováquia – hoje dividida entre República Tcheca e Eslováquia. Cada uma mantém absoluta autonomia sobre a parte do antigo território que lhe coube por livre e pacífica decisão plebiscitária. Por sua vez, a antiga Iugoslávia constituía um aglomerado artificial de nações, etnias, culturas, idiomas e religiões. Sobre um território como este, prenhe de conflitos centenários, a soberania só poderia ser imposta pela força, como de fato ocorreu, seja no Reino da Iugoslávia (1918-1941) sob a dinastia sérvia dos Karadjordjevic, seja pela submissão às tropas nazistas (1941-1945), seja na brutal ditadura comunista, também sérvia (1945-1992). Ao tentarem respirar um pouco de liberdade e independência seus povos ficam atônitos e os conflitos se multiplicam.

Relembro estes fatos a propósito de duas situações que afligem o nosso continente nos últimos tempos: a recente, e ainda não resolvida, é a crise entre Colômbia e Equador envolvendo outros países, e, muito mais grave, as ameaças à soberania brasileira sobre porções do território nacional. Os dois casos apresentam aspectos antagônicos se forem analisados pelos métodos tradicionais.

No primeiro caso a reunião do Grupo do Rio que examinou a contenda contou com um intróito do Presidente mexicano que disse que deveriam ser abandonados os adjetivos e passar ao estudo dos fatos. No que foi secundado rapidamente pela Señora Kirchner. Ora, houve apenas um único fato: o ataque por parte da Colômbia de um acampamento guerrilheiro das FARC em território equatoriano. Portanto, uma violação da soberania do último. Os países do Foro de São Paulo, ao qual pertencem também as FARC, foram rápidos no gatilho ao condenar “a agressão do governo de Uribe” e à “latino-americanização” da doutrina Bush pelo seu governo. Na reunião do FSP realizada no México dias depois, resolveu-se exigir que o pedido de perdão de Uribe tivesse caráter obrigatório como resolução da OEA e foi manifestada a solidariedade com o Pólo Democrático Alternativo, partido colombiano de esquerda, como legítimo representante do povo da Colômbia.

Nega-se o fato óbvio de que o território equatoriano foi invadido antes pelas FARC, provavelmente com a aquiescência do governo “progressista” de Correa, também aliado das FARC no FSP. Esta invasão não é considerada um delito à soberania, nem o apoio a um partido minoritário que é a extensão política da narco-guerrilha. Espera-se para breve um reconhecimento da mesma como “força beligerante”: um Estado soberano sem extensão territorial determinada, dentro do Estado soberano, mas ilegítimo, pelos padrões ideológicos do FSP que perde também definição territorial.

No caso da iminente separação de partes imensas do território do Brasil, presidido por uma dos fundadores do FSP, transformando-se as reservas indígenas em “territórios indígenas autônomos”, nenhum pio foi ouvido dos mesmos governos tão ciosos em defender a soberania do outro aliado do FSP. À declaração cínica e hipócrita do governo brasileiro de que não podem condenar as FARC para não perder “capacidade de diálogo pacífico com todas as partes em conflito”, soma-se a óbvia violação oficial da Constituição para instituir os novos “quilombos”, lesando os princípios de propriedade – de onde nasceu o de soberania. Pois não existe soberania verdadeira onde esta não seja garantida às propriedades dos indivíduos. A soberania nacional sobre os territórios indígenas já está efetivamente abolida no momento mesmo em que se proíbe a entrada de autoridades militares brasileiras e se as substitui por ONG’s.

Para entender o elo que liga todos estes acontecimentos – incluindo certas interpretações do que ocorre na Iugoslávia contrárias à independência dos povos subjugados - é preciso apelar para outro método de análise que não o tradicional e recuar até 1864 quando Marx e Engels fundam a Associação Internacional dos Trabalhadores. Pela primeira vez na história, se reuniram trabalhadores de diferentes países para dar forma ao lema “Proletários de todo o mundo: uni-vos!” do Manifesto Comunista de 1848. Daí a fundação do Komintern e imposição dos partidos comunistas abandonarem o patriotismo, às falsas modificações introduzidas em 58 (todos os PC’s abandonaram de uma só vez o internacionalismo, o que denunciava que tudo não passava de uma farsa), à fundação do Movimento dos Não-Alinhados pelo falso dissidente Tito, até a OLAS e o Foro de São Paulo, o movimento revolucionário jamais deixou de ser unido e internacionalista, usando os partidos e frentes “nacionais” para atacar por dentro o inimigo. Ora, o princípio da não intervenção não se aplica a eles, já que são forças nacionais! As suas alegações de soberania nacional não passam de farsa da pior espécie, pois o que comanda as ações são os interesses revolucionários. Assim, a perda de soberania territorial do Brasil serve à revolução? É boa. O delito de soberania do Equador não serve à revolução? É má! Para os democratas e patriotas o conceito é uno, absoluto e sagrado. Para os revolucionários depende de outro tipo de avaliação. Ora, a Colômbia representa o último baluarte contra o domínio total do Foro de São Paulo na América do Sul? Pau nela, mesmo que pela definição esteja certa em se defender! É imprescindível mudar a perspectiva democrática de enfrentamento, pois já estamos em plena guerra da quarta geração, que abordarei futuramente.

Publicado no Jornal Inconfidência, Belo Horizonte, MG (www.grupoinconfidencia.com.br), Ano XIII, nº. 125, em 12/04/2008

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