por Alvaro Vargas Llosa em 07 de maio de 2008
Resumo: Muitos governos, especialistas, organismos multilaterais e organizações não-governamentais estão fracassando em responder a questão básica em relação ao déficit de alimentos. Em vez disso, postulam soluções que aumentariam o problema.
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Nos anos 1830, Richard Cobden e John Bright começaram uma campanha contra as leis protecionistas que estavam mantendo os preços dos alimentos em alta na Grã-Bretanha. Depois de suportarem o abuso por muitos anos, em 1846, eles convenceram o governo a revogar as infames Leis do Milho , uma mudança que ajudou o início de um longa período de prosperidade.
Recentemente, estive pensando bastante nesses heróis do século 19. O mundo precisa de uma nova Liga contra as Leis do Milho (o movimento fundado por eles) se deseja pôr um fim nessa loucura de escala dos preços dos alimentos e salvar milhões de pessoas, do Haiti a Bangladesh e de Camarões às Filipinas, da inanição.
Os preços têm subido com constância nos últimos três anos, mas a questão só estourou neste ano. Desde janeiro, o preço do arroz subiu 141%, enquanto o do trigo quase dobrou em um ano. Num mundo no qual os pobres gastam três quartos do orçamento em comida, isso significa uma potencial situação de vida ou morte para um bilhão de seres humanos que vivem com o equivalente a menos de US$ 1 por dia.
Quando o preço de algo dispara, pode-se inferir que o abastecimento não está acompanhando a demanda. Na seqüência do atual choque dos alimentos , muitas pessoas centraram o foco nas causas do aumento da procura por comida. Todas elas - do crescimento econômico da China e da Índia à explosão dos biocombustíveis derivados de grãos nos países ricos -parecem muito plausíveis. Menos atenção tem sido dada ao motivo pelo qual, na era da globalização, quando os produtos podem ir mais rápido dos produtores ao mercado, e com os avanços na biotecnologia, a produção não está encontrando a demanda.
Muitos governos, especialistas, organismos multilaterais e organizações não-governamentais estão fracassando em responder a questão básica. Em vez disso, postulam soluções que aumentariam o problema ou, no máximo, seriam um paliativo de curto prazo. A verdadeira solução seria a retiradas das causas do déficit de alimentos.
Essas causas têm pouco a ver com economia ou demografia e tudo a ver com políticas de governo e com quem usa os governos para servir seus interesses -- em detrimento daqueles do público geral. Poucas áreas da economia são mais atingidas por leis protecionistas do que a agricultura -- tanto nos países pobres quanto nos ricos. Uma panóplia de cotas, subsídios, tarifas e proibições destinados a conseguir votos e, basicamente, propinas, tem desencorajado o muito necessário aumento no produção de alimentos.
Em circunstâncias normais de livre mercado, o menor sinal de que os preços estavam subindo seria suficiente para garantir que um grande capital fosse investido na agricultura para a alimentação. Na atual confusão, não é surpresa que os investidores não estejam pondo dinheiro na produção de alimentos: fazendeiros na Europa são pagos para manter suas terras ociosas por causa de um sistema chamado Política Agrícola Comum; fazendeiros na Argentina estão sendo solicitados a abrir mão de 75% de seus ganhos por meio de vários tributos; fazendeiros nos Estados Unidos estão mais interessados em alimentar os veículos utilitários esportivos do que as pessoas porque o Congresso norte-americano determinou uma quintuplicação do uso dos biocombustíveis; e fazendeiros na África não estão fazendo testes como lavouras geneticamente modificadas porque elas são proibidas em muitos desses países que poderiam exportá-las.
O economista britânico e especialista em África Paul Collier escreveu recentemente que "a forma mais realística é copiar o modelo brasileiro de enormes agroempresas tecnologicamente sofisticadas que abastecem o mercado mundial. (...) Para conter a alta nos preços dos alimentos precisamos de mais globalização, não de menos".
Eu acrescentaria que os pequenos agricultores nos países em desenvolvimento também poderiam se unir e criar economias de escala se não estivessem limitados por leis domésticas destinadas a proteger os consumidores e por leis do comércio internacional destinadas a proteger os produtores - ou se os camponeses tivessem direito à própria terra.
De acordo com a The Economist , dos 58 países cujas reações à crise têm sido acompanhadas pelo Banco Mundial, 48 impuseram controle de preços, subsídios ao consumidor e restrições a exportação. Um problema criado pelo protecionismo levou a uma resposta protecionista da maioria dos países.
Um século e meio após Cobden e Bright derrotar o protecionismo na Grã-Bretanha, suas idéias são mais poderosamente importantes do que nunca.
Publicado pelo Diário do Comércio em 30/04/2008
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