terça-feira, 17 de junho de 2008

AS FARC DO BRASIL

AS FARC DO BRASIL

Farol da Democracia Representativa

Paulo Brossard
Jurista, Ministro aposentado do STF, Consultor do FDR


A despeito da exaltação contínua e crescente do presidente da República em suas promoções diárias a respeito de seus próprios feitos, não me parece de bom augúrio o que vem acontecendo fronteiras adentro. Outro dia, o presidente falou do ódio de que era vítima, quando goza de invejável popularidade, deixando entrever que esta já não basta e a unanimidade começa a ser ambicionada. Isto não é bom e é perigoso. Em verdade, há vários sintomas de anomalias graves em setores importantes da vida nacional. Dou um exemplo. Até ontem, tudo era cor-de-rosa. Subitamente, é preciso aumentar o juro para coibir o consumo. A balança comercial dá sinais de que uma mudança já se operou e pode piorar. Outrossim, dias passados, por ocasião do "abril vermelho", um governo marginal desmandou-se em manifestações concretas. São dados de inegável significado. É preciso ver as coisas como elas são. Trata-se de um governo que não se pode chamar de clandestino, porque ele é público, mas é um governo autônomo que desafia o governo legalmente estabelecido, tenha ele méritos ou chagas.

Se os acontecimentos do "abril vermelho" foram frontais no confronto não só com o governo, mas com as instituições, simplesmente ignoradas, o que sucedeu agora na genérica condenação ao chamado agronegócio foi evidentemente mais grave e mais frontal quando a organização, de Norte a Sul, em 13 Estados, se pôs em campo aberto arrostando governo e instituições, mais instituições do que governo, que, leniente, não vê ou faz que lhe não diga respeito. A motivação aparente ou declarada é o agronegócio, pois é setor que vem mostrando grandes avanços, passando a um dos três setores mais importantes da economia nacional e assegurando alívio nas trocas externas. E como São Paulo é São Paulo, nada mais importante do que levar o ataque a ele, embora no grande Estado, hoje também voltado para a silvicultura, na indústria está sua maior fortaleza... A escolhida para a afronta foi a sede das empresas Votorantim, ao lado do Teatro Municipal, frente para a Praça Ramos de Azevedo. Tudo escolhido para dar ao ato ilícito o maior efeito nacional e internacional. Com 90 anos de existência e 60 mil empregados, o conglomerado pode ser tido como símbolo da indústria paulista. Nada melhor para a escolha, como mandam os manuais da técnica revolucionária. Para requinte da felonia, o presidente do grupo empresarial vem de completar 80 anos de vida sem embargo de suas responsabilidades empresariais e também é o presidente da Sociedade de Beneficência Portuguesa ou do hospital dessa entidade de alta benemerência. Em uma palavra, era o modelo ideal para que fosse escolhido pelos "sem-terra", hoje com vários codinomes, embora o elemento humano possa ser o mesmo. A organização nacional e condenada é a Farc brasileira.

Mas, como foi dito, a ação predatória se desdobrou em 13 Estados, do Pará ao Rio Grande do Sul, abrangendo ferrovias, portos, hidrelétricas, estação experimental, vias públicas. Quanto à Vale do Rio Doce, foi a segunda invasão e paralisação em uma semana e a 15ª invasão até agora. Invasão de empresas importantes como a Odebrecht, a Klabin, a Bunge. Se agora foram 13 os Estados atingidos, na próxima vez serão 26?

Este o fato, em sua nudez. Não há quem não veja que isto vai muito além dos desvalidos "sem terra". O confronto deixou de ser "pacífico", como se anunciava, para ser campal. Do desrespeito a decisões da Justiça, passou a arrostar a polícia, depois a violência inesperada ou provocada. Por ora, a indignação contra a violência policial! As violências cometidas em 13 Estados são atos benfazejos de "movimentos sociais". A última se chama "assembléia popular"! Por que não dizer-lhes o nome próprio - Farc do Brasil?


Publicado em Zero Hora, 16Jun08

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