por Percival Puggina em 30 de junho de 2008
Resumo: É desalentadora a possibilidade que algum coelho substitua as cobras e lagartos que saem do mato da política nacional.
© 2008 MidiaSemMascara.org
No ano de 2005, o governo Lula ardeu nas labaredas de seu inferno astral. Embora “nunca antes nesse país” se tenha presenciado algo parecido, a imagem do presidente, diga-se de passagem, saiu daquele forno com a dureza da mais cozida cerâmica. Mas foi um inferno, com tudo que lhe é de direito: espíritos malignos, risos satânicos, rangeres de dentes e lágrimas vertidas nos balcões das CPIs e nas tribunas do Congresso Nacional.
Foram tempos ruins para o Brasil, seja pelo desalento político que causou, seja pela ausência de medidas curativas tomadas em tempo capaz de estabelecer, no senso comum, a necessária relação entre causa e efeito. Ou haverá quem se aventure a dizer que o país foi passado a limpo?
Em contrapartida, recordo a alegria cívica que experimentei ao ouvir, em todos os programas de tevê e rádio a que compareci naquele ano, dirigentes petistas atribuírem justas responsabilidades do episódio ao “modelo político corrupto e corruptor” vigente no país. De tão ouvida, julgo impossível que qualquer pessoa com algum interesse nesses debates não tenha, naquele ano, decorado a expressão: modelo político corrupto e corruptor.
Ela soava em meus ouvidos como a Pastoral de Beethoven devia soar nos tímpanos de Herbert von Karajan. Música da melhor qualidade! Afinal, desde 1985 eu vinha afirmando exatamente isso: um sistema que obriga o chefe de governo eleito a compor e manter todos os dias a sua maioria parlamentar é um sistema corrompido e corruptor da conduta dos agentes políticos. A adesão dos petistas à tese da mudança desse modelo era tudo que eu queria escutar.
Não supus então que aquela posição frente ao pecado original da nossa política fosse mera tentativa de arranjar um casal de Adão e Eva institucional a quem atribuir as responsabilidades por tão constrangedora enrascada. Como se sabe, pecado original debilita a natureza humana, mas não induz culpas pessoais. Se o sistema impõe esse tipo de comportamento, as responsabilidades individuais se tornam menores. Já se passaram três anos daqueles fatos e daqueles debates, mas lembro perfeitamente de haver, repetidas vezes, louvado com entusiasmo a adesão de uma tropa de choque aguerrida, como é a do Partido dos Trabalhadores, a uma causa tão importante para nossa democracia.
E agora, prezados leitores da Voto? Parafraseando Drummond poderíamos perguntar: E agora, José? A pressão acabou/ a onda passou/ a voz silenciou/ o povão esqueceu/ o Lula relulou/ e o sistema ficou... corrupto e corruptor como sempre foi. E produzindo o mais nefasto de seus efeitos: a sólida convicção social de que a política é e só pode ser assim como a vemos.
Recebi, nestes dias em que escrevo, e-mails recomendando acessar dois vídeos. No primeiro, filmado em Pernambuco, no dia 26 de março deste ano, Lula se desfaz em elogios a Severino Cavalcanti (www.youtube.com/watch?v=MM7QYBRaw7o). Por quê? Porque o apoio do PP pernambucano serve ao governo muito melhor do que qualquer contribuição à boa conduta nacional. No segundo, Lula aparece num vídeo da campanha eleitoral de 2006, filmado no Maranhão, desancando Roseana Sarney e Edson Lobão (http://video.google.com/videosearch?q=%22edson+lob%C3%A3o+%22+Lula&sitesearch=). Hoje, Sarney e filha freqüentam a copa e a cozinha do governo e Lobão é ministro de Lula. Por quê? Pela mesma razão que induz Lula a elogiar Severino: o sistema corrupto e corruptor.
Confesso meu desalento para com as possibilidades de que algum coelho venha a substituir as cobras e lagartos que parecem ser as únicas coisas que saem desse mato.
Nenhum comentário:
Postar um comentário