Mídia sem Máscara
24 novembro 2008
Editorias - Cultura, Economia
O pânico que assolou os mercados mundiais nas últimas semanas veio trazer consolo às viúvas do comunismo. Foi como se o falecido tivesse ressurgido do mundo das trevas, novinho em folha, no pleno vigor de suas energias, pronto para ser usado.
Às afoitas viúvas recomendo menos entusiasmo. As coisas não são bem assim. O velho morreu mesmo, de falência geral dos órgãos. De todos os órgãos. O pânico que se assiste nos mercados mundiais é o que, em Direito Penal , poderia ser denominado prova circunstancial da autoria do crime. Foi apenas uma nova manifestação dos mesmos descontrolados. É como o sujeito que comete o crime e entra em depressão. A deprê é a prova do crime.
O que surpreende, em muitos, é a incapacidade de compreender a real natureza do problema, tema sobre o qual escrevi mais de 200 artigos nos últimos vinte anos. Trata-se de uma questão filosófica a respeito da liberdade. Não é preciso esquentar muito os neurônios para compreendê-la posto que a vida fornece a mesma lição a todos, indistintamente, com fartura de exemplos: a liberdade humana é limitada e na ausência de regras e controles tende a se perverter. Como escrevi num desses muitos textos, quem quiser ser absolutamente livre precisará mudar-se para o mato. Ali não haverá impostos, autoridade pública, normas de condomínio, sirene de polícia, nem campanhas eleitorais. Pardais serão de fato passarinhos. E o despertador será o ronco de algum bugio. Mas haverá a chuva, o sol, o frio, a fome, a enfermidade sem remédio ou atenção médica, os animais predadores, a perda da linguagem, a solidão enferma e a velhice sem proteção.
Ora, as mesmas perversões que a falta de controles e de sanções faz infestar a vida social, podem ocorrer e ocorrem, no mercado, através da ação individual ou conjugada de seus múltiplos agentes. É vasto o elenco dessas enfermidades, entre as quais os monopólios, os oligopólios, os cartéis e as muitas práticas daninhas proporcionadas pela desmedida ganância. Gosto de uma frase de Delfim Neto, a quem pessoa alguma poderá qualificar como esquerdista: “A irrestrita liberdade de mercado tende a acabar com a liberdade de mercado porque o sonho de todo ator da cena econômica é ficar sozinho no mercado”. Acrescento eu: todo aquele que realmente ama a liberdade pede regras que a preservem para todos.
Não estou, portanto, a recusar as imensas vantagens da economia livre sobre a economia planificada. Há, de fato, no mercado, uma sabedoria e uma tendência ao auto-ajuste, como está sendo evidenciado nos próprios episódios em curso. O pânico é uma evidência daninha dessa tendência. Sem intervenção alguma, haveria quebradeira quase generalizada, centenas de milhões de vítimas, correntistas perderiam seus haveres monetários, mas o mercado chegaria ao real valor das coisas. No entanto, o que se deseja é reduzir a dimensão do dano por um lado e, por outro, estabelecer mecanismos institucionais que evite a anarquia, os excessos, os descontroles, enfim, que levaram as economias mundiais a essa crise.
O que aconteceu foi uma loucura, uma perversão, mediante condutas que se estivessem devidamente reguladas seriam apontadas como práticas delituosas. Tais códigos de comportamento, se instituídos, tais instituições de controle, se criadas, não determinariam qualquer prejuízo à liberdade de mercado (antes, assegurariam maior proveito) porque uma correta regulação não fará mais do que assegurar o uso responsável da liberdade por todos os agentes econômicos.
Concluir-se, a partir do que está ocorrendo, que a globalização “is shit” e que o capitalismo “is dead” é loucura muito maior. O Brasil, deitado sobre seu colchão de US$ 200 bilhões é um bom exemplo do que afirmo. Foram a economia de mercado e a inserção brasileira no mercado mundial que inflaram o colchão sobre o qual Lula executa suas piruetas retóricas.
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