AS HIENAS, O LEÃO E OS CONTRIBUINTES
Ubiratan Iorio
Farol da Democracia RepresentativaEconomista (UFRJ, 1969) Doutor em Economia (EPGE/Fundação Getulio Vargas, 1984), Presidente-Executivo do Centro Interdisciplinar de Ética e Economia Personalista (CIEEP), Fundador do FDR.
Estará no próximo evento do FDR no dia 13 de junho - A REALIDADE POLÍTICA BRASILEIRA: UMA PROPOSTA LIBERAL DEMOCRÁTICA PARA A REVERSÃO DA CRISE com a palestra "AMEAÇAS À LIBERDADE NO BRASIL: ECONÔMICA, CULTURAL, FILOSÓFICA, MORAL
Começo a redigir este artigo, por coincidência, no dia 28 de maio. Nós, brasileiros, trabalhamos até ontem para pagar os impostos, taxas e contribuições que integram nosso endoidante e escorchante sistema tributário – o manicômio fiscal brasileiro, a que se referia sempre o saudoso Roberto Campos. Para alguns, 28 de maio seria algo como o “Dia Nacional de Libertação do Contribuinte”, indicando que a partir de hoje é que começamos a trabalhar para nós e nossas famílias. Mas, infelizmente, não é bem assim, pois, além dos tributos, somos praticamente forçados a arcar com despesas que seriam dispensáveis caso o Estado nos fornecesse bons serviços públicos, tais como as que incorremos com saúde, educação, previdência e segurança privadas.
O contribuinte brasileiro – este pobre coitado, desamparado e humilhado, explorado e ultrajado, mas, mesmo assim, inteiramente sem brios – vive sem ter a mínima noção dos ataques traiçoeiros das hienas que formulam nossas leis tributárias, criadoras de um verdadeiro manicômio com cerca de uma centena de tributos, e das investidas, não menos pérfidas, do leão, como é conhecida a nossa Secretaria da Receita Federal.
A hiena é um animal de nefanda reputação, a ponto de os antigos suporem que suas gargalhadas noturnas eram as de homens armando arapucas mortais para os passantes; que se sua sombra se projetasse sobre um cachorro, este ficaria mudo e paralisado; e que representava a encarnação de espíritos de feiticeiros. Um bicho sem qualquer atrativo, horrendo, furtivo, de pêlo castanho-sujo, andar manquejante, grito áspero, cheiro insuportável e devorador de todos os corpos que encontra no caminho. Um eficiente caçador, especialmente de contribuintes...
E o leão, desde tempos imemoriais, sempre faz questão da sua parte. A expressão “parte do leão” - a maior de todas -, tem origem na fábula de Esopo: “Um dia, o leão, o asno e o lobo decidiram sair juntos para caçar. Ficou combinado que qualquer coisa que eles obtivessem seria dividida entre os três. Depois de matar um cervo de bom tamanho, eles resolveram fazer uma grande refeição. O leão pediu ao asno que repartisse a carne. O asno dividiu a comida em três partes iguais e convidou os amigos a servirem-se. Mas o leão, indignado, atacou o asno, reduzindo-o a pedaços. Em seguida, voltando-se para o lobo, o rei dos animais pediu gentilmente que ele fizesse a divisão em duas partes. O lobo juntou todo o alimento em uma única grande pilha, deixando de lado apenas uma minúscula parcela para si mesmo”.
“Ah, meu amigo”, disse o leão, “como você aprendeu a dividir as coisas de maneira tão justa?”
“Foi fácil! Bastou que eu visse o destino do nosso amigo asno, explicou o lobo.”
Uma lição da fábula acima é que não se deve confiar demasiadamente no sentido de justiça dos poderosos. Essa história de Esopo, como observou em e-mail recente o meu amigo Prof. Francisco Lacombe, pode ter dado origem e inspiração à imagem do leão como símbolo da Receita Federal. Vem dela a expressão “a parte do leão”.
Nada contra os funcionários da Receita, pois, afinal, só fazem o seu trabalho – e bem, diga-se de passagem. O que indigna é a cara-de-pau com que os políticos inventam motivos para extrair cada vez mais recursos de cidadãos e empresas – como na atual tentativa do governo lulista de ressuscitar a CPMF -, sem a menor preocupação quanto à qualidade dos serviços públicos.
A carga tributária, de acordo com o Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário, pela nova metodologia de cálculo do nosso produto, está em 35,1 % do PIB, mas, pela anterior, já atingiria 39,9 %! Entra governo e sai governo, desse ou daquele partido, a situação não muda: ainda de acordo com o IBPT, no governo Collor a referida carga subiu 3,2 pontos percentuais; no de Itamar, também 3,2; nos oito anos de Fernando Henrique, 4,0 e no governo Lula, até o final de 2007, aumentou 3,4. Desde a promulgação da Constituição dos Miseráveis de 1988, cresceu 16,0 pontos percentuais, o que corresponde a um aumento de 80%, somente comparável aos da miséria e da pobreza... Sempre de acordo com os especialistas do IBPT, um brasileiro que nasce em 2008, com expectativa de vida de 72,3 anos, está condenado a 29,3 anos de trabalhos forçados apenas para pagar tributos. Os ônus incidentes sobre a renda, o patrimônio e o consumo já requerem, em média, 148 dias de esforço por ano do cidadão, o que significa que trabalharemos até amanhã – 27 de maio – apenas para alimentar, mesmo vivos, o hienídeo devorador de orçamentos. Se somarmos a isto, como escrevemos acima, o que gastamos com saúde, educação, previdência e segurança privadas por não confiarmos, com justa razão, nos serviços públicos e mais os custos decorrentes da corrupção e da burocracia, veremos que trabalhamos anualmente até meados de agosto para sustentar o carnívoro fissípede e digitígrado! Portanto, o “Dia Nacional de Libertação do Contribuinte”, a rigor, acontece por volta de 20 de agosto de cada ano...
Nos estados e municípios a tragédia é semelhante: em 2007, em valores e taxas nominais, os tributos federais cresceram R$ 80,2 bilhões (14,1%), os estaduais R$ 21,5 bilhões (10,1%) e os municipais R$ 3,6 bilhões (10,3%).
Se estas formulam as leis que nos asfixiam, o leão cobra a conta, e com uma eficiência extraordinária. Temos uma carga tributária superior à do primeiro mundo, um órgão arrecadador de primeiro mundo e serviços públicos abaixo do terceiro mundo.
Sugiro que visitem sempre o site do Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário (www.ibpt.com.br). É ótimo para despertar a consciência cívica de quem tem, pelo menos, um pingo de vergonha na cara e pretende exercitar sua condição de dignidade humana. Reúno abaixo algumas informações que busquei no referido website, pedindo a todos que as divulguem à exaustão, para o bem dos cidadãos explorados dêfti paîf...
1. DIA DAS MÃES - Na hora de escolher o presente para as mães, os brasileiros chegam a pagar de imposto até 70% pelos os perfumes e 37% por roupas e sapatos. Se você presentear sua mãe ou esposa com flores, pagará mais de 20% de seu valor em tributos. É o Estado-mãezinha...
2. PÁSCOA - o ovo de Páscoa tem uma carga de 40% do preço e os bombons ela atinge 39%. É o Estado-pascal...
3. DIA DAS CRIANÇAS - os impostos embutidos nos brinquedos chegam a mais da metade de seu valor. É o Estado-brincalhão...
4. FÉRIAS - nas passagens aéreas, há 23,5% de impostos incorporados na tarifa; nas diárias de hotéis, o peso ultrapassa 30%e, nas refeições, é de 33,5%. É o Estado-relaxante...
5. DIA DOS PAIS – se meus filhos me presenteiam com um CD, por exemplo, os impostos chegam a 47%; com um celular, 41%; com uma pasta de couro, 42,7%; e, com um perfume importado, 71%. É o Estado-“paizão”...
6. CAFÉ DA MANHÃ - O brasileiro, quando acorda, já está, sem saber, pagando tributos: 20% de impostos; no pãozinho; 37% na manteiga; 27% no cafezinho; 40% no açúcar; e, no leite, perto de 33%. É o Estado-madrugador...
7. DIA DOS NAMORADOS – você pode nem desconfiar, mas o Estado é seu namorado (a): roupas, 37%; perfumes, 71% (importado) e 60% (nacional); eletroeletrônicos, de 38% a 57%. É o Estado-apaixonado...
8.BEBIDAS - cerveja: 56% de impostos; refrigerante: 47%; copo de suco: 37,8%; cachaça: 83%. É o Estado-saúde!...
9. FAXINA - Para limpar a casa, você paga 38% de impostos nos desinfetantes; quase 38% na água sanitária; mais de 42% no sabão em pó; mais de 43% no álcool; 40% nos detergentes, saponáceos e sabões em barras; e 43% nos amaciantes. É o Estado-faxineiro...
10. ELETRODOMÉSTICOS - Os impostos representam 44% do preço de cada eletrodoméstico e 57% do preço de um forno microondas. É o Estado-hy tech...
11. MACARRONADA – quando a mamma compra massas para fazer uma bela macarronada, paga mais de 30% de tributos; no molho de tomate, 36% e, se usar azeite, mais 37%.
12. CARRO POPULAR - Nos carros ditos populares, o peso dos impostos é de 39,3% do preço final (para um veículo que custe, digamos, 30 mil reais, você paga quase de 12 mil reais de tributos); nos veículos acima de mil cilindradas, a tributação chega a 43,6% do preço. É o Estado-motorizado...
13. TOMANDO BANHO – ao entrar no box de seu banheiro para tomar banho,o Estado entra com você: os impostos passam de 52% no xampu, 42% no sabonete, 47% no desodorante e 29% na água. É o Estado-higiênico...
14. CASA POPULAR - o peso dos impostos corresponde a quase 50% do preço final de uma casa dita “popular”. Até o material básico tem tributos pesados: 35% nas telhas, 34% nos tijolos, 44% nos vasos sanitários; 45% nas tintas. É o Estado-puxadinho...
15. CONTA DE LUZ - de cada R$ 100 da sua conta de luz, 35% correspondem a impostos. Com os tributos indiretos cobrados das empresas ao setor, a carga chega a 45,8%. É o Estado-aceso...
16. EDUCAÇÃO - Os impostos representam quase metade dos preços dos materiais escolares. No caderno universitário, representam mais de 36% do preço; na agenda, na régua, na cola, na caneta e no apontador os tributos correspondem a quase 45% do custo final. É o Estado-CDF...
Estes revoltantes e aterrorizantes exemplos, extraídos - como vimos - diretamente do site do IBPT, são mais do que suficientes para caracterizar um crime: nós, contribuintes, somos explorados vilmente pelo Estado. E, infelizmente, também, para configurar a nossa omissão e passividade.
Por isto e muito mais, a proposta de volta da CPMF é - para usarmos um termo leve - imoral! A remição de sua dignidade ultrajada impõe aos cidadãos que pressionem os congressistas a não aprovarem mais uma dentre tantas indecências! E exige também um movimento cívico pela redução da carga tributária, pelo enxugamento do Estado e por políticas de gestão de recursos públicos absolutamente transparentes.
Xô, hienas! Fora, Leão! Acordai, contribuintes adormecidos!
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